A NECESSIDADE DA ERRADICAÇÃO DO ANALFABETISMO SOCIAL!

 

 

 

Álvaro Klein

Advogado Trabalhista. Segundo Secretário da AGETRA.

 

 

 

O Direito do Trabalho, ou melhor, o Direito Social do Trabalho, como destaca Brígido Roland Ramos, é alicerce da Justiça Social/Paz Social construída “sobre os escombros da Europa e a sepultura de 50 milhões de trabalhadores”[1] em momento de reflexão da humanidade após a 1ª Guerra Mundial, no nascimento da Organização Internacional do Trabalho, em 1919 com o Tratado de Versalhes.

 

Menos de um século depois, hoje no Brasil, são atacadas de morte as garantias sociais mínimas: da regulamentação da jornada de trabalho; das proteções às doenças ocupacionais e aos acidentes do trabalho; a proteção ao trabalho da mulher; a proibição do trabalho infantil e do trabalho escravo ou análogo; do acesso aos benefícios previdenciários de aposentadorias, pensões e auxílios; do Direito e das garantias Sindicais; do Direito de Greve; e de outros tantos que são intitulados como responsáveis diretos pela “crise econômica” que assola o “Deus” mercado, e vitima a Classe Trabalhadora.

 

A consequência da atribuição da responsabilidade pela crise às garantias sociais mínimas, representadas pelo Direito Social do Trabalho, é o ódio social que permeia as ações da sociedade contra a própria sociedade. Boaventura de Souza Santos, ao responder o próprio questionamento, “Poderá o direito ser emancipatório?[2]” refere que somente será possível identificar a realidade jurídica que está à frente de nossos olhos se forem “postas de lado essas concepções dominantes”, para que somente então não falte a “perspectiva de leitura ou código adequados”. Falta de perspectiva que advém do estudo convencional “desde a jurisprudência à filosofia do direito, passando pela sociologia do direito e pela antropologia do direito”. Boaventura reputa estas disciplinas como responsáveis pela formação de um “cânone jurídico modernista”, que é estreito, redutor, e que “arrogantemente desacredita, silencia ou nega as experiências jurídicas de grandes grupos populacionais”, aqui o dos excluídos trabalhadores destinatários das normas protetivas do Direito Social do Trabalho.

 

Definitivamente o Direito Social do Trabalho, estruturado e concebido como Ciência Social e Política será emancipatório e inclusivo, não suportando alterações que representem retrocessos sociais, sob pena de obstaculizar o progresso, bem referido por Daniela Muradas Reis: “... vedação do retrocesso social está de maneira indissolúvel vinculada à noção de progresso,...”[3].

 

A contextualização, em paralelos, das realidades brasileira e internacional, como por exemplo, a Espanhola, demonstra que as “Crises” Econômicas, Sociais e Políticas, são essencialmente iguais e cíclicas, diferenciando apenas os momentos históricos de seus enfretamentos, no caso sendo a Espanha “mais experiente” pela anterioridade no diagnóstico e enfretamento do analfabetismo, cegueira, e ódio sociais.

 

A sociedade brasileira assentada em um modelo educacional, que vai da educação infantil ao ensino superior, pautado nas necessidades econômicas do “Deus” mercado – orientando o empreendedorismo, por exemplo – não forma compreensão da imprescindibilidade da prevalência da inclusão     social como esteio da legislação e políticas públicas, tampouco para perceber diferenças sociais e seus efeitos na sua formação como sociedade. Disso resulta a formação do individualismo excludente, odioso, cego e socialmente analfabeto.

 

A participação multidisciplinar na formação e/ou adequação das legislações e políticas sociais, representada pelas necessidades da sociedade em seu momento sócio / econômico / político, acaba contaminada pelo analfabetismo, cegueira e ódio sociais. A manutenção e o avanço do manto protetivo da legislação social e do Direito Social do Trabalho é resultado do poder e da organização do ente político, social ou econômico, que melhor se mobiliza na atenção de seus anseios protetivos, o que faz a partir de sua capacidade dialética.

 

A ciclicidade dos movimentos pelos retrocessos nos direitos sociais e políticos, merece estudos e análises individualizadas em seus momentos históricos, o que se constitui em ferramenta indispensável para o combate do ódio, cegueira e analfabetismo sociais.

 

O entendimento das diferenças sócio / econômicas / culturais, como esteio na formação das legislações sociais e políticas inclusivas, deve  orientar as diretrizes curriculares da educação formal. A ciclicidade das crises econômicas e as identidades de suas pautas excludentes deve encontrar limite na impossibilidade do retrocesso social. Compreensão que somente será atingida com a erradicação do analfabetismo social.

 

O ódio social é alimentado pela incapacidade de compreender as diferenças e suas necessidades, o que hodiernamente transforma o trabalhador em seu próprio algoz, pois se sente incluído ao não se enxergar como diferente, então se autoriza a não lutar pela manutenção ou ampliação dos seus diretos.

 


[1] RAMOS, Brígido Roland. A diferença entre a civilização e a barbárie (p. 43-45). Em: A classe trabalhadora e a resistência ao golpe de 2016 / Gustavo Teixeira Ramos... [et al.] |(orgs). – Bauru: Canal 6, 2016. 445 p.; 23 cm. (Projeto Editorial Praxis).

 

[2] Boaventura de Sousa Santos, “Poderá o direito ser emancipatório?”, Revista Crítica de Ciências Sociais [Online], 65 / 2003, colocado online no dia 01 Outubro 2012, criado a 01 Novembro 2016. URL: http://rccs.revues.org/118; DOI: 10.400/rccs. 1180.

 

[3] REIS, Daniela Muradas. O principio da vedação do retrocesso no direito do trabalho / Daniela Muradas Reis. São Paulo: LTr, 2010.

_____________________________

 

Janeiro/2017