O DIREITO À DESCONEXÃO DO TRABALHO E A OCORRÊNCIA DO DANO EXISTENCIAL NAS RELAÇÕES DE TRABALHO

 

 

 

POLIANA VANÚCIA DE PAULA ALBUQUERQUE

Mestranda em Direito Constitucional e Especialista em Direito do Trabalho e Processo do Trabalho pela Universidade de Fortaleza. Advogada e Professora.

 

 

 

Resumo: A dinâmica a qual é inserida o mundo do trabalho deixa, por muitas vezes, o empregado em posição vulnerável frente ao poder diretivo do empregador. Assim as relações cotidianas entre ambos são conduzidas pura e simplesmente pelo que determina a letra fria da CLT. Ocorre que a jurisprudência trabalhista coadunado com a evolução do constitucionalismo promovendo a interpretação das normas em conformidade com a Constituição avança no sentido de desenvolver e aplicar os direitos fundamentais do trabalhador na perspectiva da teoria da eficácia horizontal dos direitos fundamentais. A partir desse prisma é que atualmente a Justiça do Trabalho vem responsabilizando o empregador por danos morais, sendo analisada nesse ensaio, a decisão do TRT da 2ª Região a qual condenou uma empresa a pagar dano moral existencial ao seu empregado por violação ao direito fundamental ao lazer e à saúde.

 

Palavras-Chave: Eficácia Horizontal; Direitos Fundamentais; Dano Existencial; Direito do Trabalho.

 

 

SUMÁRIO: Introdução; 1. Análise do acordão proferido pelo TRT da 2ª Região nos autos do processo nº 00248500-18.2009.5.02.0062; 2. Direitos fundamentais e sua eficácia nas relações privadas; 3. Direito a desconexão do trabalho e o direito fundamental ao lazer e a saúde; 4. Dano existencial nas relações trabalhistas; Conclusão; Referências.

 

 

 

INTRODUÇÃO

 

A evolução das relações sociais, culminando com a valorização e intensificação da proteção do indivíduo na sociedade é um fenômeno interdisciplinar que perpassa o estudo aprofundado de diversas vertentes tais como a economia, a sociologia, a filosofia e o direito.

 

Nesse contexto as relações trabalhistas são terreno fértil para o estudo da aplicação e efetividade dos direitos fundamentais do trabalhador. A teoria da eficácia dos direitos fundamentais é indubitavelmente aplicável às relações de emprego, tendo em vista que o empregador no comando do seu poder diretivo deve respeitar os direitos sociais do trabalhador, sob pena de, não o fazendo, ser responsabilizado por danos morais.

 

No presente estudo afigura-se na jurisprudência trabalhista uma nova modalidade de dano moral, cunhado por uma sentença do TRT da 4ª Região em 2012, de dano existencial. Trata-se de dano que tem sua origem na doutrina italiana e que realça o projeto de vida do indivíduo e não apenas sua honra e dignidade como faz o dano moral.

 

Considerando, portanto a responsabilização do dano existencial nas relações trabalhistas, não basta que o empregador cumpra rigorosamente as normas, como por exemplo adimplir as horas extras realizadas pelo empregado, é necessário que a demanda dessas horas extras, não sejam reiteradas ao ponto de prejudicar a vida social do trabalhador, lhe tirando o convívio com sua família ou mesmo lhe tolhendo alguma atividade que promova seu crescimento humano e profissional. Esse cenário traduz as características do que a teoria cunhou de direito a desconexão do trabalho e que alguns autores já estão o erigindo como direito fundamental do trabalhador.

 

Diante dessa perspectiva é que o fenômeno da constitucionalização atinge o Direito do Trabalho e a ofensa dos direitos sociais do trabalhador é ato que não se restringe ao Estado, mas também os particulares que devem se comportar de forma que não violem o arcabouço constitucional de direitos prescritos na Constituição Federal. Inexiste qualquer dúvida que o trabalho torna o homem digno, entretanto o excesso desse trabalho também pode ferir sua dignidade e, para tanto, a importância de se desconectar do trabalho no mundo tecnológico que vivemos é necessário para promover a saúde mental e física do trabalhador, bem como lhe oportunizar a ter uma vida social.

 

Desta feita tratando-se de um tema bastante recente na doutrina justrabalhista, justifica-se esse ensaio na busca de realizar um estudo aprofundado sobre a eficácia horizontal dos direitos fundamentais nas relações de trabalho e a responsabilidade por danos existenciais, quais suas repercussões e sua aplicabilidade nas relações privadas, delineando sua principiologia, características e requisitos quanto ao tema.

 

Quanto à metodologia do trabalho utilizou-se da pesquisa bibliográfica por meio da análise e leitura de obras que tratam do tema de forma direta    ou indireta. Trata-se também, de pesquisa, quanto à utilização dos resultados, pura, e, quanto à abordagem, qualitativa, na medida em que busca a ampliação dos conhecimentos e melhor compreensão do problema apresentado. Caracteriza-se a pesquisa, ainda, quanto à finalidade, como descritiva, explicativa e exploratória, pois, objetiva-se analisar a eficácia dos direitos fundamentais do trabalhador e as consequências do dano existencial partindo-se de um pressuposto histórico e evolutivo do constitucionalismo contemporâneo.

 

Portanto, primeiramente, e promovendo uma compreensão mais complexa acerca do tema será realizada uma análise da decisão proferida pelo TRT da 2ª Região. Em seguida, far-se-á breves considerações acerca da Teoria  da Eficácia Horizontal dos direitos fundamentais nas relações privadas, em seguida uma abordagem conceitual da desconexão do trabalho, e, por fim, será realizado um aprofundamento acerca do dano existencial culminando com o delineamento de seu conceito, características, repercussão e posicionamento da jurisprudência brasileira.

 

1.  ANÁLISE DO ACORDÃO PROFERIDO PELO TRT DA 2ª REGIÃO NOS AUTOS DO PROCESSO Nº 00248500-18.2009.5.02.0062

 

Para melhor compreensão didática do tema, far-se-á uma análise acerca do Acordão que, na sua fundamentação aborda a desconexão do trabalho e a ocorrência do dano moral.

 

Da leitura do presente acordão proferido nos autos do processo de nº 00248500-18.2009.5.02.0062, o Recurso Ordinário versa sobre jornada extraordinária demandada de forma excessiva pelo empregador tolhendo o direito do empregado de usufruir do seu direito de lazer, trata a ementa:

 

DIREITO AO LAZER E À DESCONEXÃO DO TRABALHO. NÃO OBSERVÂNCIA POR PARTE DO EMPREGADOR. DANOS MORAIS. CABIMENTO. O direito ao lazer está expressamente previsto nos  artigos 6º, 7º, IV, 217, parágrafo 3º e 227 da Constituição Federal, estando alçado à categoria de direito fundamental. Também está previsto no art. 4º do Complemento da Declaração dos Direitos do Homem (elaborado pela Liga dos Direitos do Homem e do Cidadão em 1936), no art. XXIV da Declaração Universal dos Direitos Humanos, de 1948, no art. 7º doPacto Internacional Relativo aos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, de 1966, ratificado pelo Brasil, e no art. 7º, g e h do Protocolo de San Salvador (Protocolo Adicional à Convenção Interamericana Sobre Direitos Humanos em Matéria de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais), ratificado pelo Brasil (Decreto 3.321/99). Ao empregador incumbe organizar a jornada de trabalho de modo a assegurar ao trabalhador a preservação da sua vida privada, social e familiar, assegurando-lhe a desconexão do trabalho. Ao impedir o efetivo descanso do empregado, o empregador exerce o poder empregatício  de forma abusiva, e sua conduta caracteriza ato ilícito, nos termos do art. 187 do Código Civil. Cabível, nesse caso, indenização por danos morais, pois o trabalho invade a vida privada do trabalhador, atingindo sua esfera íntima e personalíssima, nos termos do art. 5º, V e X da Constituição Federal e dos artigos 186 e 927 do Código Civil. No caso em tela, ficou provado que ao autor era imposto o trabalho em horas extras habituais em finais de semana, sob pena de punição. Recurso não provido. (TRT-2, RO 0248500-18.2009.5.02.0067, Relator: IVANI CONTINI BRAMANTE, Data de Julgamento: 25.02.2014, 4ª TURMA, Data de Publicação: 14.03.2014)

 

De todas as matérias tratadas no julgado, apenas nos será limitado abordar a condenação do empregador pelo dano moral, uma vez que esse é o tema abordado nesse ensaio.

 

Primeiramente é possível observar que a decisão não abordou a teoria da eficácia horizontal dos direitos fundamentais nas relações privadas, embora, tenha consignado o abuso do poder diretivo do empregador quanto  a demanda de horas extraordinárias ao seu empregado. Nesse caso seria possível desenvolver essa tese, tendo em vista que o empregador usufrui do seu poder diretivo fundamentado na autonomia da vontade das partes.

 

Fundamenta o julgado que o direito de lazer está previsto na Constituição Federal como direito fundamental, e ainda cita a Declaração dos Direitos do Homem como parâmetro internacional de uma das vertentes do direito a vida, o trabalho com horas reduzidas para promover o direito ao lazer.

 

Da leitura do julgado, entretanto, não se vislumbra outro direito fundamental e que está atrelado ao direito de descanso do trabalhador, que é o direito a saúde. A omissão da citação desse direito na fundamentação do julgado é relevante, tendo em vista que o direito a desconexão não somente atinge a vida social do trabalhador, mas também sua higidez física e mental. A necessidade de desconectar-se do trabalho é primordial para o restabelecimento das energias do trabalhador, para o inicio de uma nova jornada.

 

Importa frisar a objetividade da fundamentação do Acordão quando se refere ao direito do empregado de desconecta-se do trabalho, não abordando pormenorizadamente as características e requisitos para a garantia desse direito.

 

No que pertine a responsabilidade civil da empresa por ato abusivo referente ao seu poder diretivo, essa foi fundamentada sobre o manto do dano moral, sendo abordado esse conceito na sua acepção mais ampla. Aqui não houve diferenciação entre o dano moral e o dano existencial.

 

Na verdade quando o empregador abusa do seu poder diretivo, solicitando ao seu empregado horas excessivas de trabalho lhe tolhendo o direito ao descanso e lazer, estamos diante da ocorrência do dano existencial. O bem jurídico aqui protegido é o projeto de vida do sujeito e não especificamente sua honra, como fundamentou o relator do Acordão.

 

De maneira geral a decisão acertadamente promoveu a discussão acerca do direito a desconexão do trabalho, e o respeito ao direito de lazer   do trabalhador, entretanto tendo em vista a relevância do tema, necessário debruçar-se pormenorizadamente acerca do dano existencial e dos direitos fundamentais nas relações privadas.

 

Tendo em vista, portanto, a importância dos institutos acima citados, será desenvolvido ao longo desse trabalho considerações acerca da desconexão do trabalho e a ocorrência do dano existencial nas relações de trabalho, iniciando o debate com a abordagem da teoria da eficácia horizontal dos direitos fundamentais nas relações privadas.

 

2. DIREITOS FUNDAMENTAIS E SUA EFICÁCIA NAS RELAÇÕES PRIVADAS

 

A Constituição Brasileira como documento balizador de toda a  legislação infraconstitucional prescreve direitos e garantias fundamentais albergando várias situações. Entretanto, não se pode olvidar que as mutações fáticas ocorrem de forma acelerada, e, após o movimento chamado neoconstitucionalismo com a solidificação da força normativa da Constituição, os direitos fundamentais adquiriram posição de maior destaque e eficácia, ao lado ainda da normatização de princípios constitucionais, potencializando a efetividade da Carta Constitucional e disseminado a ideia de paz social e dignidade humana.

 

Para Ingo Sarlet (p. 64) “o Constituinte deixou transparecer de forma clara e inequívoca a sua intenção de outorgar aos princípios fundamentais a qualidade de normas embasadoras e informativas de toda a ordem constitucional, inclusive (e especialmente) das normas definidoras de direitos e garantias fundamentais, que igualmente integram (juntamente com os princípios fundamentais) aquilo que se pode – e nesse ponto parece haver consenso – denominar de núcleo essencial da nossa Constituição formal e material”.

 

A teoria da constitucionalização contemporânea ressignifica a Constituição e permeia não somente as relações entre Estado e particular como também as relações entre particulares. Nesse sentido Luiz Roberto Barroso:

 

A ideia de constitucionalização do Direito aqui explorada está associada a um efeito expansivo das normas constitucionais, cujo conteúdo material e axiológico se irradia, com força normativa, por todo o sistema jurídico. Os valores, os fins públicos e os comportamentos contemplados nos princípios e regras da Constituição passam a condicionar a validade e o sentido de todas as normas do direito infraconstitucional. Como intuitivo, a constitucionalização repercute sobre a atuação dos três Poderes, inclusive e notadamente nas suas relações com os particulares. Porém, mais original ainda: repercute, também, nas relações entre particulares.

 

Com esse movimento constitucional as desigualdades antes apontadas apenas com relação ao Estado e os particulares e objeto do estudo do   Direito Público por muitos anos, agora permeiam também as relações entre particulares e, é, nesse sentido, que os direitos fundamentais se tornam ferramentas para promover o princípio da dignidade da pessoa humana no âmbito do direito privado.

 

Dessa forma a ideia absenteísta, do Direito Privado, imbricado historicamente pelo Estado liberal com o expoente da plena autonomia da vontade na condução das relações privadas, acentuou para o Direito a divisão dicotômica clássica de Direito Público e Direito Privado e fundamentou o surgimento da primeira dimensão dos direitos fundamentais.

 

Nesse contexto é que historicamente o Direito Privado ganhou força e sua codificação chegou ao auge de ser considerada uma espécie de “norma superior”, uma verdadeira “Constituição”. Entretanto, essa ideia totalitária perdeu força com o constitucionalismo social e paulatinamente ao Direito Privado introduziu-se a perspectiva do respeito aos direitos fundamentais. Fazendo uma digressão histórica e nos situando quanto à cronologia desse movimento foi a partir da Constituição Mexicana de 1917, seguida da Constituição Alemã Weimar de 1919 que o constitucionalismo social ganhou força e os direitos sociais, denominados de segunda geração se consolidaram.

 

A constitucionalização do direito privado, portanto, é um movimento    que irradia o alcance das normas constitucionais, promovendo a sua força normativa e consolidando seus valores e regras em terreno o qual predominava o consenso entre indivíduos. O isolamento entre normas de interesse público e de interesse privado já não refletem a realidade do ordenamento jurídico brasileiro, que através do CC\16 e seguidamente do CC\02 propagou a ideia, já defasada, do liberalismo.

 

É nesse cenário de constitucionalização do direito privado que se analisa a eficácia e a normatividade dos direitos fundamentais do trabalhador, uma vez que notadamente a relação entre empregado e empregador é marcada pela desigualdade econômica e social, sendo terreno fértil para abusos e omissão de direitos e deveres.

 

Apresentando-se como direitos de segunda geração, os direitos sociais, já foram alvo de muitas indagações quanto à sua de normatividade e eficácia, tendo em vista que possuíam características programáticas. Argumentava-se que deveriam existir normas infraconstitucionais para que houvesse efetividade nos casos práticos.

 

Entretanto essa crítica à normatividade dos direitos sociais é superada pelo conteúdo do paragrafo 1º do artigo 5º que prescreve que os direitos fundamentais tem aplicação imediata. No que tange a sua característica programática, é sabido que com a evolução do constitucionalismo, conceitos indeterminados passaram a ser mais usados tendo em vista o maior alcance de sua normatividade e concordância prática.

 

Uma outra hipótese para crise da normatividade desses direitos se reporta à aplicação deles pelo Estado, ou seja, o Estado não teria condições orçamentárias de patrocinar todas as necessidades do cidadão, desenvolvendo a doutrina da tese da reserva do possível.

 

Quanto à reserva do possível o Supremo Tribunal Federal através do ministro Celso de Melo manifestou-se: “(...) a cláusula da reserva do possível – ressalvada a ocorrência de justo motivo objetivamente aferível – não pode ser invocada pelo Estado, com a finalidade de exonerar-se do cumprimento de suas obrigações constitucionais”.

 

Não paira dúvida, portanto, quanto a aplicabilidade e eficácia dos direitos sociais erigidos na Constituição, sobretudo aqueles direcionados ao trabalhador, que modernamente direcionam o Estado para promover sua aplicação, como também para proteger sua ofensa por terceiros.

 

Para Daniel Sarmento (p. 236) “o Estado tem a obrigação não apenas de abster-se de violar os direitos fundamentais, mas também protege-los diante de lesões e ameaças provenientes de terceiros, inclusive de particulares”.

 

Nesse contexto, com a constitucionalização do direito, é que nas relações privadas a obediência aos direitos fundamentais galgou espaço, sobretudo nas relações trabalhistas onde o poderio econômico e hierárquico por vezes atinge a dignidade do indivíduo e ultrapassa os limites da razoabilidade, sob a alegativa frágil da condução econômica de um negócio e da autonomia das partes.

 

Ocorre que é necessário ponderar como essa aplicação dos direitos fundamentais nas relações privadas deve acontecer, ou seja, não se pode vislumbrar o simplismo de aplicar esses direitos ao caso concreto, pois nesse contexto estamos diante de dois particulares que igualmente possuem direitos fundamentais a serem respeitados. Ademais erigir o particular ao mesmo patamar do Estado no cumprimento de direitos fundamentais não seria justo e transmutaria o totalitarismo estatal, contraposto ao Estado democrático.

 

Nessa perspectiva de aplicação dos direitos fundamentais nas relações privadas existem três teorias que foram bem sintetizadas por Daniel Sarmento (2011): teoria da State Action (negação absoluta de aplicação) que defende a não aplicação dos direitos fundamentais nas relações privadas sob a justificativa do federalismo americano e pela literalidade da Constituição que direciona os direitos fundamentais apenas ao Poder Público, segundo o  autor, tal teoria está profundamente associada ao radical individualismo que caracteriza a Constituição e a cultura jurídica e social dos Estados Unidos.

 

A teoria dita como intermediária é a teoria da eficácia horizontal mediata ou indireta dos direitos fundamentais que tem origem na Alemanha, sendo seu expoente Günter Dürig. Essa teoria defende, segundo Sarmento (2011), que a força jurídica dos direitos fundamentais alcança os particulares de forma indireta e mediata, através da atuação do legislador e cabe ao Judiciário preencher as cláusulas indeterminadas do texto legal para aplicação ou rejeição dos direitos fundamentais ao caso concreto.

 

A teoria da eficácia direta e imediata dos direitos fundamentais, ainda citando, Sarmento (2011) foi defendida na Alemanha por Hans Carl Nipperdey, no início da década de 50 e advoga a tese de que, alguns direitos fundamentais previstos na Constituição alemã, pela sua natureza, podem ser invocados diretamente nas relações privadas, sem que para isso haja qualquer mediação pelo legislador, caracterizando como de imposição erga omnes.

 

Por fim outra tese desenvolvida na Alemanha trata dos deveres de proteção do Estado no que tange aos direitos fundamentais e para Sarmento (2011) constitui a forma mais completa para equacionar a questão a incidência destes direitos no âmbito das relações privadas.

 

Nesse sentido Cannaris (2009), defensor da última tese citada, entende que deve existir uma ponderação entre o direito fundamental e a autonomia privada trazida no caso concreto. Esse mesmo autor defende que a aplicação dos direitos fundamentais deve ocorrer em dois planos: o legislativo e o jurisdicional. Nesses dois planos existe a vinculação negativa e positiva aos direitos fundamentais, no sentido de que o legislador deve abster-se de legislar infraconstitucionalmente contrário aos direitos fundamentais, bem como, deve propiciar a proteção à esses direitos da ação danosa de terceiros. Já no caso do Poder Judiciário a análise também deve ser negativa e positiva, uma vez que o juiz deve abster-se de violar direito fundamentais, bem como, deve promover sua aplicação.

 

O cerne dessa questão está vinculado, como dito anteriormente, a ponderação de direitos (direito fundamental x autonomia da vontade), devendo ser observado a necessidade e a adequação, aplicando para a solução da contenda o princípio da proporcionalidade.

 

No que tange a relação empregatícia, mesmo sendo marcada pela autonomia das partes não pode ser conduzida contrariando normas e princípios fundamentais da Constituição Federal. Com efeito, às relações privadas não se desprendem pura e simplesmente de acordo entre as partes sob o manto da legislação específica, necessário coadunar essa relação com os princípios erigidos na Constituição Federal e respeitando os direitos fundamentais.

 

Nesse sentido Luis Otavio Linhares e Isabela Alcântara (p. 205, 2011):

 

Ocorre que o direito de propriedade e o princípio da autonomia da vontade apontados para justificar a ação empresária não são absolutos, tampouco bastantes para validar o exercício abusivo e ilícito do poder empregatício. O centro de poder privado não pode ser palco de desmandos e arbitrariedades contra os direitos fundamentais trabalhistas, nem motivo para retirar de (ex-)empregados direitos básicos e inerentes à afirmação de sua dignidade.

 

A grande questão não se limita a aplicação dos direitos trabalhistas pelo empregador, mas sim até que momento a autonomia das partes e o poder diretivo do empregador podem tomar caminhos exagerados e que violam os direitos fundamentais desse empregado.

 

Para Daniel Sarmento devem existir parâmetros de aplicação e requisitos a serem seguidos, para que o direito fundamental restringido em função do contrato de trabalho não ultrapasse o razoável. Segundo o autor:

 

Em outras palavras, a restrição a um direito do empregado, para ser considerada válida, deve pelo menos contribuir para a promoção de interesse legítimo do empregador (adequação); deve ser o meio mais suave para a promoção, com a mesma intensidade, daquele interesse (necessidade); e, numa relação de custos e benefícios, pautada não pela lógica econômica, mas por parâmetros extraídos da Constituição, a promoção do objetivo visado pelo empregador não pode implicar em sacrifício superior ao direito do empregado (proporcionalidade em sentido estrito). Enfim, toda e qualquer restrição a direito fundamental do trabalhador tem de ser compatível com o princípio da proporcionalidade, cabendo ao Poder Judiciário aferir, caso a caso, a conformidade da medida restritiva com os subprincípios da adequação, necessidade e proporcionalidade em sentido estrito, em que se decompõe dito princípio.

 

Dessa forma a análise do respeito aos direitos fundamentais na relação de trabalho, tendo como pano de fundo a tese eficácia horizontal dos direitos fundamentais, deve ser vista de acordo com a situação fática apresentada ao Judiciário. Ressaltando-se que com essa tese desnuda-se o absolutismo da autonomia da vontade nas relações trabalhistas e a vantagem obtida pelo poder diretivo do empregador.

 

A aplicação, portanto, dos direitos fundamentais no contrato de trabalho é primordial, tendo em vista a assimetria já existente entre os sujeitos dessa relação devendo, obrigações e direitos, coordenar a aplicação proporcional para a obtenção do respeito absoluto ao fundamento da dignidade humana fim máximo da aplicação dos direitos fundamentais.

 

Na decisão trazida à baila foi aplicada claramente a teoria da eficácia horizontal dos direitos fundamentais, que é a teoria abraçada pelos Tribunais e doutrina brasileiros.

 

3. DIREITO A DESCONEXÃO DO TRABALHO E O DIREITO FUNDAMENTAL AO LAZER E A SAÚDE

 

A tecnologia é uma grande aliada para o desenvolvimento humano e o progresso da sociedade, tendo como condão facilitar e agilizar muitas das relações sociais, sobretudo, as relações de trabalho promovendo a eficiência das ferramentas de produção dispostas no mercado de trabalho.

 

Com efeito, o uso das mídias tecnológicas no mundo atual é essencial para melhor destaque no mercado de trabalho. A ampla competição e a busca reiterada por qualificação profissional potencializam a demanda do uso dessas midias. É nesse sentido que as pessoas estão totalmente conectadas às suas atividades laborais, comportamento tido como habitual, normal, consequência natural das responsabilidades profissionais assumidas pelo indivíduo.

 

O enfrentamento do tema desconexão do trabalho é desafiador, sobretudo quando se está inserido em um mercado competitivo, e ainda quando se possui uma economia instável como a do Brasil, onde o desemprego é um grande vilão para muitas pessoas.

 

A tese, portanto, não deixa de ser contraditória, numa realidade em que muitos necessitam de trabalho e que a máxime “o trabalho dignifica o homem” era até pouco tempo atrás coluna inabalável dos costumes sociais, resignificar o direito ao trabalho é dificil. Importa frisar que a aceitação dessa tese permite um novo olhar acerca da cultura comportamental do mercado de trabalho, propondo que o direito ao não trabalho também deve ser respeitado.

 

Para Souto Maior “(...) impera, culturalmente, a ideia do trabalho como fator dignificante da pessoa humana e como elemento de socialização do indivíduo, tornando-se um grande desafio falar em direito ao não-trabalho, ainda mais sob o prisma da efetiva proteção jurídica deste bem”.

 

A desconexão do trabalho, esposa a tese de que o trabalhador deve ser preservado em sua integridade física e mental, bem como, deve ter sua vida social e familiar protegidas, amparando, assim, dois direitos fundamentais prescritos na Constituição Federal nos art. 6º, caput, direito ao lazer e direito à saúde.

 

O direito ao não trabalho revela a ideia de que o trabalhador deve exercer suas funções laborais de modo que sua intimidade e sua saúde sejam preservadas. O termo direito ao não trabalho, portanto, não traduz a falta de trabalho, mas apenas a sua minoração dentro de um contexto de demanda exaustivo e fundamentado no liberalismo econômico.

 

Nesse sentido Volia Bomfim Cassar (2012, p. 660), “O trabalhador tem direito à ‘desconexão’, isto é, a se afastar totalmente do ambiente de trabalho, preservando seus momentos de relaxamento, de lazer, seu ambiente domiciliar, contra as novas técnicas invasivas que penetram na vida íntima do empregado.”

 

De outro lado o direito ao não trabalho vincula o empregador a evitar a exploração de mão de obra de forma atentatória a ética e a dignidade de seus subordinados, promovendo a atuação da responsabilidade social da empresa em seu conceito mais amplo. Ademais não se vislumbra aqui o trabalhador como mero produto humano da empresa, maquinizado e objetado, mas sim como pessoa humana que necessita trabalhar para sua manutenção existencial, não se resumindo essa existência apenas no capital e no consumo, ela perpassa o convívio familiar e a realização sentimental e pessoal do empregado.

 

Desconectar-se do trabalho é direito fundamental do trabalhador, pois subsidia o direito ao lazer e a saúde, vitais para que o trabalhador possa usufruir plenamente das suas horas de descanso reestabelecendo suas energias para uma nova jornada.

 

Tomemos como exemplo a demanda exaustiva de horas extras ao logo do contrato de trabalho, que limita o trabalhador a dedicação à sua família, ou mesmo a dedicação a um projeto de vida relacionado ao seu crescimento pessoal e profissional.

 

Outro exemplo pertinente é o gozo de férias muitas vezes interrompidas com as constastes intervenções do empregador, seja com telefonemas, ou com e-mails, fazendo com que aquele intervalo de atividades do empregado não aconteça de forma plena e eficiente.

 

A dificuldade de deixar os problemas profissionais no trabalho não é exceção, a grande maioria dos trabalhadores ocupa seu tempo livre e sua mente tentando resolver problemas do seu ambiente de trabalho ou mesmo tentando aperfeiçoar demandas que possam lhe garantir maior destaque profissional. O que circunda o homem é sua capacidade de ser produtivo, é da condição humana desempenhar aptidões que o tornem útil e, por vezes, rentável.

 

Michel Focoult (2008, p. 311), abordando o posicionamento do trabalho na economia neoliberal, define a criação do capital humano na formação de espécies de “competência-máquinas”. O indivíduo passa a ocupar um posicionamento determinante e auto rentável no mercado de trabalho. É com essa concepção que o indivíduo quanto mais se dedica ao trabalho, mais deve sua existência a realização do crescimento econômico, ou seja, pensar em direito ao não trabalho sob o prisma neoliberal econômico é quase impossível.

 

Como dito anteriormente o desafio de promover o direito ao não trabalho é cultural. O homem dedica quase toda sua vida em torno de uma ocupação profissional que lhe garanta sua sobrevivência material e satisfação pessoal. O trabalho é uma necessidade do ser humano.

 

Entretanto a evolução da teoria dos direitos fundamentais, sobretudo, nas relações privadas nos incentiva a pensar que nas relações trabalhistas o excesso de trabalho não é postura rotineira e natural. Necessário vislumbrar o papel do homem nessa relação eliminando o simplismo da venda de mão de obra e sua respectiva remuneração, na promoção da satisfação humana.

 

Da mesma forma que anteriormente citamos que o trabalho dignifica o homem, esse mesmo não pode escravizá-lo de forma a ofender sua dignidade. E a partir de decisões, como a trazida nesse ensaio, é que verificamos a nova postura dos Tribunais em aplicar os direitos fundamentais como promotores da dignidade da pessoa humana nas relações do trabalho.

 

O direito ao não trabalho, na proporção de toda a contradição que esse termo propõe é uma realidade a ser explorada nas relações empregatícias e que possui suas raízes fincadas na teoria da horizontalidade da eficácia dos direitos fundamentais, bem como, na responsabilidade social da empresa e ainda na promoção da boa fé entre os sujeitos dessa relação.

 

4. DANO EXISTENCIAL NAS RELAÇÕES TRABALHISTAS

 

O dano existencial tem sua origem em berço Italiano, foi na jurisprudência desse país que primeiramente esse instituto foi cunhado e em seguida desenvolvido pela doutrina. No Brasil, nossos Tribunais já se manifestaram sobre esse tipo de dano, sendo a Justiça do Trabalho sua percussora.

 

Mas o que é dano existencial? Quais suas semelhanças e diferenças dos danos morais? Dano existencial, sucintamente, é considerado aquele que atinge qualquer direito fundamental da pessoa, causando prejuízo a suas atividades, sua expectativa e planejamento de vida.

 

A Itália após alguns anos de desenvolvimento dessa teoria, sobretudo, em casos concretos, passou a considerar a existência de quatro tipos de danos, quais sejam: dano moral, dano biológico, dano material e dano existencial. Pela experiência Italiana existiam situações e consequências às quais não eram suficientes apenas a tipificação do dano, como dano moral, material ou biológico, pois sua repercussão transpassava as barreiras desses conceitos e alcançavam direitos fundamentais da pessoa.

 

Eugenio Facchini (p. 239), analisando a experiência Italiana sintetiza essa evolução:

 

Já a partir da metade da década de 90, a jurisprudência italiana começou a adotar tal nomenclatura, abandonando a classificação tripartida dos danos indenizáveis, usada pela Corte Constitucional italiana (...) para adotar uma classificação quádrupla, segundo a qual, ao lado dos danos patrimoniais, haveria um gênero de danos patrimoniais, que abrangeria as espécies de danos morais subjetivos, danos biológicos e danos existenciais.

 

Nesse sentido pode-se afirmar que a diferença de dano moral para dano existencial é que no primeiro a lesão alcançada pelo dano é momentânea, por mais que atinja a integridade psíquica do indivíduo, já o dano existencial é mais abrangente e tem repercussão permanente na vida da pessoa, ferindo sua dignidade e destruindo seu planejamento de vida.

 

O dano existencial, portanto é instituto mais amplo e que tem como característica a preservação e proteção da vivência do indivíduo, sua qualidade de vida e sua existência social.

 

Imperioso ressaltar também, a diferença do dano existencial e a perda da chance. Essa última seria a perda real de uma oportunidade com um prejuízo palpável, a partir da possibilidade da ocorrência do evento perdido ou do evento que deixou de acontecer pela atividade danosa.

 

Diante dos conceitos e diferenças aqui formulados é possível afirmar que o dano existencial possui além daqueles requisitos que, necessariamente devem existir para caracterizar-se responsabilidade civil, ainda devem cumular a repercussão real no projeto de vida do indivíduo, tendo reflexos permanentes no seu estado de existencialidade.

 

No Brasil a experiência ainda é mínima, sendo na seara trabalhista onde encontramos decisões mais recentes, manifestando-se favoravelmente o Tribunal Superior do Trabalho:

 

DANO MORAL. DANO EXISTENCIAL. SUPRESSÃO DE DIREITOS TRABALHISTAS. NÃO CONCESSÃO      DE FÉRIAS. DURANTE TODO O PERÍODO LABORAL. DEZ ANOS. DIREITO DA PERSONALIDADE. VIOLAÇÃO. 1. A teor do artigo 5º, X, da Constituição Federal, a lesão causada a direito da personalidade, intimidade, vida privada, honra e imagem das pessoas assegura ao titular do direito a indenização pelo dano decorrente de sua violação. 2. O dano existencial, ou o dano à existência da pessoa, -consiste na violação de qualquer um dos direitos fundamentais da pessoa, tutelados pela Constituição Federal, que causa uma alteração danosa no modo de ser do indivíduo ou nas atividades por ele executadas com vistas ao projeto de vida pessoal, prescindindo de qualquer repercussão financeira ou econômica que do fato da lesão possa decorrer.- (ALMEIDA NETO, Amaro Alves de. Dano existencial: a tutela da dignidade da pessoa humana. Revista dos Tribunais, São Paulo, v. 6, nº 24, mês out/dez, 2005, p. 68.). 3. Constituem elementos do dano existencial, além do ato ilício, o nexo de causalidade e o efetivo prejuízo, o dano à realização do projeto de vida e o prejuízo à vida de relações. Com efeito, a lesão decorrente da conduta patronal ilícita que impede o empregado de usufruir, ainda que parcialmente, das diversas formas de relações sociais fora do ambiente de trabalho (familiares, atividades recreativas e extralaborais), ou seja que obstrua a integração do trabalhador à sociedade, ao frustrar o projeto de vida do indivíduo, viola o direito da personalidade do trabalhador e constitui o chamado dano existencial. 4. Na hipótese dos autos, a reclamada deixou de conceder férias à reclamante por dez anos. A negligência por parte da reclamada, ante o reiterado descumprimento do dever contratual, ao não conceder férias por dez anos, violou o patrimônio jurídico personalíssimo, por atentar contra a saúde física, mental e a vida privada da reclamante. Assim, face à conclusão do Tribunal de origem de que é indevido o pagamento de indenização, resulta violado o art. 5º, X, da Carta Magna. Recurso de revista conhecido e provido, no tema. (Processo: RR-727-76. 2011.5.24.0002, Data de Julgamento: 19.06.2013, Relator Ministro: Hugo Carlos Scheuermann, 1ª Turma, Data de Publicação: DEJT 28.06.2013).

 

Observa-se, portanto, que a jurisprudência brasileira já enfrenta esse tema, sobretudo nas relações de trabalho, nas quais em sua grande maioria o trabalhador, tido como figura hipossuficiente, é submetido a rotinas laborais que o privam de desenvolver e vivenciar uma vida digna, sociável e familiar.

 

Portanto, na relação laboral a observância do dano existencial é mais clara, uma vez que, o empregado direcionado pelo seu empregador pode se privar de exercer cotidianamente atividades sociais e familiares que lhe prejudicam e interrompem seu ciclo de vida e, por conseguinte seu crescimento. Exemplo dessa situação é a impossibilidade de gozar férias, pois muitas vezes o empregador paga o período de férias, entretanto, o empregado continua a trabalhar na empresa. Outro exemplo seria a interrupção de frequência em curso superior ou outra especialização, pois o empregador demanda quase todos os dias ou mesmo todos os dias pelo menos duas horas extras do empregado, impossibilitando assim sua formação profissional completa.

 

No julgado objeto de nossa análise a nomenclatura utilizada foi de dano moral, sendo abordado de forma genérica a ofensa de direitos como lazer, privacidade, honra e imagem. Nota-se um claro equívoco do julgador, tendo em vista que a ofensa de horas extras excessivas impede o trabalhador de usufruir sua vida social e executar seu projeto de vida. O dano está adstrita à existencialidade do empregado, ou seja, a seu planejamento humano, ao seu convívio com familiares, de forma geral, a sua vida social.

 

O dano existencial como visto em julgado transcrito pelo TST já está difundido na jurisprudência brasileira, sendo sua autonomia já direcionada, com requisitos e características próprias.

 

Não se pode olvidar, no entanto, a necessidade da literatura jurídica desenvolver esse tema que, atrelado como direito a desconexão do trabalho se faz terreno fértil para a promoção de demandas e a ampliação do debate.

 

CONCLUSÃO

 

É fato que o crescente desenvolvimento da sociedade não nos permite olvidar o surgimento de novos danos, sendo necessário o estudo e aprofundamento do tema para melhor aplicação da solução ao caso concreto, promovendo a efetividade das normas e a pacificação de conflitos.

 

O direito ao não trabalho, ou a desconexão do trabalho é uma realidade que já está presente na jurisprudência trabalhista e que ampara o dever de obediência do empregador aos direitos fundamentais de lazer e saúde do empregado.

 

A visão imposta por esse instituto deve ser aplicada nas relações privadas em obediência aos direitos fundamentais, sendo o poder diretivo do empregador relativizado. Nesse cenário o empregador, não dispõe absolutamente da mão de obra do seu empregado sob o argumento de remunerar o trabalho prestado e obediência a letra fria da lei, é preciso respeitar a dignidade desse trabalhador.

 

A ponderação, portanto, da autonomia privada do empregador e seu poder diretivo e o direito fundamental do empregado de reestabelecer sua higidez física e mental é observância obrigatória no contrato de trabalho.

 

A desobediência a essa premissa e o comportamento abusivo do empregador pode gerar um dano ao trabalhador, que permeia sua existencialidade, trata-se do dano ao projeto de vida do indivíduo, diferente  do dano moral, como já exposto.

 

Em suma, o estudo e a promoção do debate da teoria da eficácia dos direitos fundamentais nas relações privadas, está diretamente imbricado ao direito a desconexão do trabalho e enaltece o princípio da dignidade humana promovendo a evolução comportamental e cultural do mercado de trabalho.

 

E é nessa perspectiva que o Direito do Trabalho, tem como papel o aprofundamento do debate dessas questões, tendo em vista a promoção da observância dos direitos fundamentais do trabalhador e da justiça e paz social.

 

Ademais foi possível verificar que alguns Tribunais brasileiros, como a Justiça do Trabalho, já esposam essa tese com a finalidade de resguardar direitos dos trabalhadores, sempre promovendo a efetividade do princípio da dignidade humana, como o fez a decisão trazida a baila.

 

REFERÊNCIAS

 

BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. 7. ed., São Paulo: Malheiros, 2000.

 

BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF, Senado 1988.

 

______. Tribunal Superior do Trabalho. RR-727-76.2011.5.24.0002, Data de Julgamento: 19.06.2013. Relator Ministro: Hugo Carlos Scheuermann. Disponível em: http://www. tst.gov.br.//. Acesso em: 10 out. 2015.

 

______. Tribunal Regional do Trabalho 2 Região. Processo 0248500-18.2009.5.02.0062, 4ª Turma, Relator: Ivani Constini Bramante. Disponível em: http://www.trt2.jus.br.//. Acesso em: 03 nov. 2015.

 

CANARIS, Claus-Wilhelm. Direitos Fundamentais e Direito Privado. Trad. Ingo Wolfgang Sarlet e Paulo Mota Pinto. 2ª reimpressão. Coimbra: Almedina, 2009.

 

CASSAR, Volia Bonfim. Direito do Trabalho. 6. ed., Niterói: Impetus, 2012.

 

DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil - Responsabilidade Civil. V. 7, São Paulo: Saraiva, 2002.

 

FOUCAULT, Michel. A Verdade e as Formas Jurídicas. 3. ed., Tradução Roberto C. M. Machado e Eduardo J. Morais. Rio de Janeiro: NAU Editora, 2005.

 

______. Nascimento da Biopolítica: curso dado no Collège de France (1978-1979). Tradução Eduardo Brandão. São Paulo: Martins Fontes, 2008.

 

FROTA, Hidemberg Alves da. Noções Fundamentais sobre o Dano Existencial. Jus Navigandi, Teresina, ano 16, nº 3046, 3 nov. 2011. Disponível em: . Acesso em: 13 out. 2015.

 

MORAES, Maria Celina Bodin de. A Constitucionalização do Direito Civil e seus Efeitos sobre a Responsabilidade Civil. Revista Direito, Estado e Sociedade, v. 9, nº 29, p. 233 a 258, jul./dez. 2006. Disponível em: http://www.estig.ipbeja.pt/ac_direito/Bodin_n29.pdf. Acesso em: 13 nov. 2014.

 

NETO, Eugenio Facchini. Danos Existenciais: “Precificando Lágrimas?”. Revista de Direitos e Garantias Fundamentais, nº 12, p. 229-268, jul./dez. 2012. Disponível em: http://www.fdv.br/sisbib/index.php/direitosegarantias/article/view/408. Acesso em: 13 nov.2014.

 

PAROSKI, Mauro Vasni. Assédio Moral no Trabalho. Jus Navigandi, Teresina, ano 10, nº 1196, 10 out. 2006. Disponível em: . Acesso em: 02 nov. 2014.

 

PERLINGIERI, Pietro. Perfis do Direito Civil. Introdução ao Direito Civil Constitucional. Trad. M. C. de Cicco. Rio de Janeiro: Renovar, 1999.

 

RENAULT, Luis Otavio Linhares; FABIANO, Isabela Marcia de Alcantara. Eficácia Horizontal dos Direitos Fundamentais – Alguma Verdade. Rev. TST, Brasília, vol. 77, nº 4, out./dez. 2011. Disponível em: http://aplicacao.tst.jus.br\\. Acesso em: 10 out. 2015.

 

SARLET, Ingo Wolfgang. Dignidade da Pessoa Humana e Direitos Fundamentais na Constituição Federal de 1988. 9. ed., Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2011.

 

SARLET, Ingo Wolfgang. A Eficácia dos Direitos Fundamentais: uma teoria geral dos direitos fundamentais na perspectiva constitucional. 11. ed., Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2012.

 

SARMENTO, Daniel; GOMES, Fabio Rodrigues. A Eficácia dos Direitos Fundamentais nas Relações entre Particulares: O Caso das relações de trabalho. Rev. TST, Brasília, vol. 77, nº 4, out./dez. 2011, p. 60-101. Disponivel em: www.ufjf.br/.../Direitos-fundamentais-e-relações-entre-particulares.pdf. Acesso em: 10 out. 2015.

 

SARMENTO, Daniel. Direitos Fundamentais e Relações Privadas. 2. ed., Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2008.

 

SOUTO MAIOR, Jorge Luiz. Do Direito à Desconexão do Trabalho. Revista do Tribunal Regional do Trabalho da 15 Região, Campinas, nº 23, 2003. Disponível em: http://trt15.gov.br/escola_da_magistratura/Rev23Art17.pdf. Acesso em: 20 set. 2015.

 

TEPEDINO, Gustavo. “Direitos Humanos e Relações Jurídicas Privadas”. In: Temas de Direito Civil. Rio de Janeiro: Renovar, 1999, p. 55-71.

_____________________________

 

Julho/2016