A INCONSTITUCIONALIDADE DO JUS POSTULANDI NA JUSTIÇA DO TRABALHO EM FACE AO PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DO CONTRADITÓRIO

 

 

 

FERNANDA MARDERS

Mestra em Direito pela Universidade de Santa Cruz do Sul – UNISC/Brasil, Mestra em Direitos Humanos pela Universidade do Minho – UMINHO/Portugal. Pós-graduada em Direito e Processo do Trabalho pelo Centro Universitário Univates de Lajeado/RS. Investigadora colaboradora do Centro de Investigação Interdisciplinar em Direitos Humanos da Escola de Direito da Universidade do Minho de Portugal.

 

FELIPE AUGUSTO SILVA CUSTÓDIO

Pós-graduado em Direito do Trabalho e Processo do Trabalho pelo Centro Universitário UNA de Sete Lagoas/MG. Pós-graduando em Direito Tributário pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais. Advogado.

 

 

 

Resumo: o presente artigo, realizado por meio de pesquisa bibliográfica e documental, tem como objetivo analisar, em apertada síntese, a inconstitucionalidade do jus postulandi na Justiça do Trabalho em face ao Princípio Constitucional do Contraditório visto a forma que atualmente este instituto é utilizado na seara trabalhista e quão importante é a presença do advogado perante os órgãos jurisdicionais trabalhistas. Para tanto, abordar-se-á o princípio do jus postulandi, que pode ser conceituado como capacidade postulatória da própria parte de poder agir em um processo sem a assistência de um advogado. Posteriormente, será analisado o princípio do contraditório para ao fim analisar a importância do advogado em uma demanda trabalhista, visto que, o jus postulandi da forma que é concebida atualmente consagra a desigualdade processual entre as partes no processo. Com base no estudo realizado, poderá se constatar que existe a inconstitucionalidade do jus postulandi, frente ao princípio constitucional do contraditório, que assegura a toda pessoa, uma vez demandada em juízo, ter o direito de ampla defesa da acusação, frente à determinada lide.

 

Palavras-chave: Inconstitucionalidade. Jus Postulandi. Princípio do Contraditório.

 

 

SUMÁRIO: 1 Introdução. 2 O instituto do Jus postulandi e o advogado. 2.1 Jus postulandi na Justiça do Trabalho. 3 Princípio do contraditório e ampla defesa. 4 A inconstitucionalidade do jus postulandi frente a Constituição Federal. 5 Conclusão. Referências.

 

 

 

1. introdução

 

O presente artigo tem como base ou razão o estudo da inconstitucionalidade do jus postulandi na Justiça do Trabalho em face ao Princípio Constitucional do Contraditório, onde o presente estudo demonstra a necessidade da presença do advogado no processo, em concordância com o disposto no art. 133 da Constituição da República de 1988, e como forma de garantia do contraditório na atividade jurisdicional. O jus postulandi na Justiça do Trabalho sempre foi alvo de grandes discussões, assim como, no cenário jurídico brasileiro em geral, pois importantes doutrinadores versam sobre esta matéria.

 

Para alguns estudiosos, princípio, para outros um mero dispositivo de lei, entretanto o jus postulandi é um instituto previsto no texto de legislação infraconstitucional (Consolidação das Leis Trabalhistas – CLT), no qual consiste em uma técnica de especialização procedimental que confere à parte capacidade de postular diretamente em juízo, sem a obrigatoriedade da presença de advogado, sendo, portanto o jus postulandi na Justiça do Trabalho incompatível com o paradigma constitucional escolhido pelo Brasil, qual seja, o do Estado Democrático de Direito.

 

Com base em nossa doutrina atual, não há como falar em processo sem o efetivo exercício do contraditório, dado que este se torna fator primordial para a atividade jurisdicional justa e efetiva. Cada doutrinador dispõe de um tipo de linha metodológica, entretanto o entendimento de todos é unanime que o princípio do contraditório é de total importância para uma justiça efetiva, cumulado com a ampla defesa. É nítido que a presença do advogado no processo perante a Justiça do Trabalho traz para o seu cliente uma sensação de tranquilidade, pois a sua participação na lide é de total importância para o processo, sendo que com a técnica e o conhecimento fica mais certa a ampla defesa e o contraditório.

 

Cabe salientar que o presente ensaio foi realizado por meio de pesquisa qualitativa, pois não buscou responder o caso por meio de dados estatísticos, mas sim com análise e descrição do fenômeno assim como ele é posto na natureza. Ademais, utilizou-se material bibliográfico, como doutrinas, sites especializados e periódicos; e documental, como a legislação celetista e constitucional.

 

Dessa forma, pode-se chegar a conclusão neste artigo, evidenciando e demonstrado a inconstitucionalidade do jus postulandi na Justiça do Trabalho, tendo em vista a necessidade do efetivo contraditório no processo jurisdicional, que somente é conseguido com a presença dos advogados em ambas os polos da lide.

 

2. O Instituto do Jus Postulandi e o advogado

 

Entende-se que o jus postulandi é a capacidade postulatória das partes que na maioria das instâncias judiciais só pode ocorrer por meio da representação por advogado ou, como no caso da Justiça Penal representado pela Defensoria Pública (SARAIVA, 2007), ou seja, o ius postulandi é uma locução latina que indica o direito de falar, em nome das partes, no processo” (SCHIAVI, 2014, p. 317).

 

Nesse sentido, a Constituição Federal do Brasil dispõe em seu texto que o advogado é indispensável para a postulação em juízo. De acordo com o art. 133 do texto Maior “o advogado é indispensável à administração da Justiça, sendo inviolável por seus atos e manifestações no exercício da profissão, nos limites da lei”.

 

O Estatuto da Ordem dos Advogados Brasil, por sua vez, no artigo 1º, I, rege de forma taxativa que “são atividades privativas de advocacia: I – a postulação a órgão do Poder Judiciário e aos juizados especiais”.

 

Da legislação, pode-se extrair o mérito do advogado no processo judicial, de forma a garantir a máxima concretização do texto constitucional, ou seja, o advogado torna-se de total importância para o correto andamento jurisdicional de uma determinada lide. Ademais, considerando-se que todos têm direito ao patrocínio de um advogado, este entendido torna-se fundamental para que se garanta a justiça (SILVA, 2013).

 

Silva (2013, p. 71) destaca um conceito para advogado, do qual se extraí que

 

 num sentido amplo, advogado é toda pessoa que, patrocinando os interesses de outrem, aconselha, responde de direito, e lhe defende os ditos interesses, quando discutidos, judicial ou extrajudicialmente. Num sentido mais restrito, advogado é toda pessoa legalmente habilitada e autorizada a exercer a advocacia ou procuradoria judicial, para o que, precipuamente, deve achar-se devidamente inscrita na Ordem dos Advogados do Brasil.

 

Contemplando esse entendimento, Santos (2001, p. 31) expõe que se entende por advogado “pessoa habilitada legalmente para prestar assistência profissional a terceiros em assuntos jurídicos, defendendo-lhes os interesses, como consultor ou como procurador em juízo”, e complementa Sodré (1975) de modo taxativo, que o advogado, além de garantidor do contraditório e da ampla defesa dos cidadãos, ainda exerce outro papel fundamental, qual seja, a função social frente a toda população.

 

O advogado exerce função social, pois ele atende a uma exigência da sociedade. Basta que considere o seguinte: sem liberdade, não há advogado sem a intervenção não há ordenamento jurídico e sem este não há condições de vida para a pessoa humana. Logo, a atuação do advogado é condição imprescindível para que funcione a justiça. Não resta, pois, a menor dúvida de que o advogado exerce função social (SODRÉ, 1975, p. 81).

 

Nesse contexto, o advogado torna-se instrumento de realização da dignidade da pessoa humana, disposto no texto constitucional e ensejador de um Estado Democrático de Direito. No entanto, o problema aqui posto, diz respeito a possibilidade de a parte exercer ela própria o jus postulandi na Justiça do Trabalho, fato esse que gera muita discussão na doutrina trabalhista frente ao posicionamento defendido pelo Tribunal Superior do Trabalho e uma possível inconstitucionalidade do artigo celetista autorizador de tal situação, assunto esse que se passa a discorrer.

 

2.1 Jus postulandi na Justiça do Trabalho

 

Em nosso ordenamento jurídico atual, no que se refere à Justiça do Trabalho, o advogado, para algumas tratativas, já não é mais indispensável, em virtude do jus postulandi que é garantido às partes, tanto empregado como empregador, conforme artigo celetista.

 

O legislador infraconstitucional conferiu as partes que estão envolvidas na lide o direito de postularem perante tal órgão, independentemente da presença do advogado, até o término das mesmas nas instâncias de primeiro e segundo grau. Estabelece o art. 791 da Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT):

 

Art. 791 Os empregados e os empregadores poderão reclamar pessoalmente perante a Justiça do Trabalho e acompanhar as suas reclamações até o final.

§ 1º - Nos dissídios individuais os empregados e empregadores poderão fazer-se representar por intermédio do sindicato, advogado, solicitador, ou provisionado, inscrito na Ordem dos Advogados do Brasil;

§ 2º - Nos dissídios coletivos é facultada aos interessados a assistência por advogado.

 

Claro está, que o artigo da lei trabalhista estabelece a possibilidade da parte, por si só, postular uma demanda perante a Justiça do Trabalho, tal condição, segundo a doutrina principal, fundamenta-se e mantém o jus postulandi em nome de uma possível celeridade processual, a diminuição dos custos para o empregado, que na grande maioria dos processos é a parte autora, e a simplificação da atividade jurisdicional.

 

Reiterando o disposto no art. 791, o art. 839, “a”, da CLT dá ênfase na possibilidade das partes, nesse caso, empregado e empregador, buscar pessoalmente a justiça do trabalho para propor uma reclamação.

 

No entanto, como disserta Nascimento (2002, p. 345), a presença de um advogado no processo jurisdicional é indispensável em qualquer contexto; “torna a comunicação com o juiz mais fácil, uma vez que a sua capacidade técnica de traduzir o litígio em padrões jurídicos promove a adequada composição da lide e, consequentemente, a melhor solução segundo o ordenamento jurídico”. Pode-se acrescentar ainda, a problemática em a parte conseguir dominar suas próprias emoções e se manter com o devido equilíbrio e razão que um processo judicial requer, para uma satisfatória conclusão da lide.

 

Ademais, Greco (2012, p. 35) diz que a imagem do advogado é indispensável para o Estado Democrático de Direito e para a efetiva democracia entre as partes em um determinado litígio.

 

Completando e explicitando, o art. 5º, inciso LV, da CF, assegura aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral, o contraditório e a ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes. Consideram-se meios inerentes à ampla defesa: ter conhecimento claro da imputação; poder apresentar alegações contra a acusação; poder acompanhar a prova produzida e fazer contraprova; ter defesa técnica por advogado, cuja função, aliás, agora, é essencial à Administração da Justiça (art. 133); e poder recorrer da decisão desfavorável (GRECO, 2012, p. 35).

 

Portanto, acrescenta Frediani (2011) que o jus postulandi não apenas prejudica a parte, como, também, a adequada solução da lide, pois as partes em questão não possuem técnica e conhecimento jurisdicional para pleitear aquilo que realmente é de seu direito. Ainda, faz-se necessário destacar que a autorização do jus postulandi enseja na falta de concretização de princípios constitucionais, tais como, o contraditório e a ampla defesa, abordados a seguir, sendo isso, fundamento suficiente para que o artigo celetista fosse decretado como inconstitucional.

 

3. PRINCÍPIO DO CONTRADITÓRIO E AMPLA DEFESA

 

Primeiramente cabe destacar que o princípio do contraditório consiste essencialmente no direito que todas as pessoas têm de poder expor seus argumentos e apresentar provas ao órgão encarregado de decidir antes que se alcance a resolução do caso concreto, em suma é o direito à manifestação. Ademais “o contraditório é um princípio constitucional que assegura a toda pessoa, uma vez demandada em juízo, o direito de ampla defesa da acusação ou parte para proteção do seu direito” (SILVA, 2013, p. 375).

 

A Constituição da República Federativa do Brasil é bem clara em seu texto constitucional sobre este princípio, que disserta:

 

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

LV - aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes.

 

Dessa forma fica visível que o jus postulandi não é benéfico para nenhuma das partes visto a sua inconstitucionalidade frente ao princípio do contraditório, pois sem que ambas as partes estejam munidas de procuradores, não há de se falar em ampla defesa e contraditório.

 

Corrobora Frediani (2011, p. 85) discursando que o princípio do contraditório “[...] assegura a possibilidade de defesa recíproca das partes nos diversos tipos de processo: de conhecimento, cautelar e de execução, com suas respectivas peculiaridades”.

 

Greco (2012, p. 35), por sua vez, cumula o princípio do contraditório com o princípio da ampla defesa e estabelece que

 

{...} o contraditório é a técnica processual e procedimental que impõe a bilateralidade do processo. Todos os atos do processo devem ser realizados de modo que a parte contrária possa deles participar ou, pelo menos, possa impugná-los em contramanifestação. A Constituição não exige, nem jamais exigiu, que o contraditório fosse prévio ou concomitante ao ato. Há atos privativos de cada uma das partes, como há atos privativos do juiz, sem a participação das partes. Todavia, o que assegura o contraditório é a oportunidade de a eles se contrapor por meio de manifestação contrária que tenha eficácia prática. Assim, por exemplo, é válida a prova pericial realizada na fase de inquérito policial, por determinação da autoridade policial, desde que, em juízo, possa ser impugnada e, se estiver errada, possa ser refeita. O contraditório, que é o instrumento técnico da ampla defesa, deve estar presente em todo o processo e não somente na instrução criminal, conforme dava a entender a redação defeituosa do texto constitucional anterior.

 

Conforme expõe Carvalho (2011), o instituto do contraditório é de total importância para a democracia brasileira, pois sem o mesmo e sem o princípio da ampla defesa não há de se falar em democracia. Nesse contexto, pode-se afirmar que, assim como outros princípios constantes no texto constitucional, como o da dignidade da pessoa humana, os princípios aqui referidos, são fonte para que seja possível entender toda a dimensão e procedimento jurídico de um ordenamento sério e justo.

 

Rangel (2008) acrescenta que o princípio do contraditório é uma garantia fundamental, com isso devem-se permitir as partes a paridade de armas, ou seja, todo ato que é produzido por meio do processo caberá o mesmo direito a outra parte de se manifestar discordando, aceitando ou até mesmo modificando os fatos e o direito alegado pelo autor, de acordo com seu juízo de conveniência.

 

E ainda, o mesmo conclui:

 

O contraditório é inerente ao sistema acusatório, onde as partes possuem plena igualdade de condições, sofrendo o ônus de sua inércia no curso do processo, ou seja, no processo penal a efetiva contrariedade a acusação é imperativa, sendo as partes conferidas a paridade de armas, sendo assim manifestado outro princípio de fundamental importância, o princípio da ampla defesa que impõem uma direção dialética no processo (p. 17).

 

Nesse diapasão, para concretizar o princípio do contraditório e da ampla defesa, expressamente delineados na Constituição Federal brasileira, faz-se necessário que as partes estejam, em qualquer tipo de demanda e como principal para esse ensaio, nas lides trabalhistas, representadas por um advogado de modo a proporcionar o máximo de amplitude na realização dos princípios expostos na Carta Magna.

 

Rangel (2008, p. 17) ainda acrescenta que é de suma importância o respeito a esse princípio, pois o contraditório traz, como consequência lógica, a igualdade das partes, possibilitando a ambas a produção, em idênticas condições, das provas de suas pretensões.

 

Portanto não a contraditório, paridade de armas e a técnica jurisdicional no instituto do jus postulandi, pois o mesmo fere princípios constitucionais vitais e de grande importância para a democracia brasileira e para o devido processo legal.

 

Ademais, a falta de inobservância de preceitos constitucionais por outras normas, acaba por torna-las inconstitucionais, uma vez que, a Constituição Federal está no topo do ordenamento jurídico, devendo ser respeitada em todos os seus aspectos hierárquicos. Dessa forma, passa-se a expor justamente a inconstitucionalidade do texto celetista ao autorizar o jus postulandi, instituto que, como foi visto, é contrário a concretização dos princípios constitucionais do contraditório e da ampla defesa.

 

4. A INCONSTITUCIONALIDADE DO JUS POSTULANDI FRENTE A CONSTITUIÇÃO FEDERAL

 

Assim como em outras matérias, o instituto do jus postulante poderá ser utilizado em uma demanda na Justiça do Trabalho, no entanto, a possibilidade de as partes demandarem sem a presença de um advogado afronta, além dos princípios do contraditório e da ampla defesa, literalmente o artigo 133 da Constituição Federal, visto que além de não haver o real acesso à justiça com o uso do jus postulandi, aquele trabalhador que pleiteia um determinado direito líquido e certo no âmbito da justiça, não possui técnica jurisdicional e não conseguira proteger os seus direitos frente à outra parte que possui um advogado constituído.

 

Neste mesmo sentido entende Martins (2010, p. 61):

 

O empregado que exerce o jus postulandi pessoalmente acaba não tendo a mesma capacidade técnica que o empregador que comparece na audiência com advogado, levantando preliminares e questões processuais. No caso acaba ocorrendo desigualdade processual, daí a necessidade do advogado.

 

Para Almeida (2013), a efetividade da ordem jurídica é essencial ao verdadeiro Estado Democrático de Direito e exige a facilitação do acesso aos meios de realização concreta do Direito ameaçado ou lesado. Assim, não há que se falar em constitucionalidade do jus postulandi, pois o mesmo inobservou o texto constitucional, onde é explicito o contraditório e ampla defesa, sendo que com este instituto as partes não terão os princípios do contraditório e ampla defesa concretizados em seus processos.

 

Dissertando sobre a inconstitucionalidade deste instituto, Saraiva (2007) expõe as duas correntes que tratam sobre o assunto telado. Uma delas, minoritária, mas que ganhou maior notoriedade com o Estatuto da OAB, entende que com a Constituição e a sua redação de que o advogado é indispensável para a devida realização da justiça, o artigo celetista não mais estaria em vigor, passando no caso, a ocorrência de uma revogação tácita. Contudo, o segundo posicionamento, majoritário e entendido pelo Supremo Tribunal Federal (STF), por meio da ADIN 1.127-8, proposta pela Associação dos Magistrados do Brasil (AMB), visa que não é necessário e obrigatório a capacidade postulatória do advogado nos Juizados de Pequenas Causas, na Justiça de Paz (para algumas questões) e, também, para a Justiça do Trabalho, ensejando assim, que as partes possam exercer de forma direta o jus postulandi.

 

No entanto, contrariando o posicionamento da STF, com o que foi posto, torna-se nítido que o jus postulandi perante a Justiça do Trabalho é inconstitucional, visto que inobserva o princípio constitucional processual do contraditório, gerando desigualdade de oportunidades entre as partes em uma determinada lide.

 

Versando também sobre o assunto, Leite (2011) declara que o jus postulandi é de total importância para a jurisdição no Brasil, entretanto deveria ter sido melhor elaborado, sem ter lacunas no ordenamento jurídico pátrio.

 

Para Schiavi (2011) apesar de o princípio do jus postulandi se aplicar a outros ramos do direito, é no Direito Processual do Trabalho que atinge maior alcance e divergência doutrinária. Talvez esse fato se dê pela desproporcionalidade existente entre as partes componentes de uma lide trabalhista, uma vez que, temos envolvido na demanda judicial a figura do empregado, hipossuficiente na esfera econômica e jurídica, devendo ter do Estado o máximo de proteção e guarida (HAYASHI, 2014).

 

Sempre foi polêmica a questão do jus postulandi da parte na Justiça do Trabalho. Há quem o defenda, argumentando que é uma forma de viabilizar o acesso do trabalhador à Justiça, principalmente aquele que não tem condições de contratar um advogado. Outros defendem sua extinção, argumentando que, diante da complexidade do Direito Material do Trabalho e do Processo do Trabalho, já não é possível à parte postular sem advogado, havendo uma falsa impressão de acesso à justiça deferir à parte a capacidade postulatória (SCHIAVI, 2011, p. 288).

 

Reitera Almeida (2008) que para o exercício efetivo do jus postulandi as partes precisam ter capacidade jurídica e capacidade de estar em juízo, sendo que tem capacidade para ser parte toda pessoa, física ou jurídica, detentora da capacidade de direito, isto é, da aptidão para adquirir direitos e contrair obrigações, entretanto somente o advogado tem a técnica jurídica e o discernimento técnico da matéria versada.

 

Ainda, cabe ressaltar que o posicionamento dado pelo STF é alcançado pelo Tribunal Superior do Trabalho por meio da Súmula 425 que diz:

 

O jus postulandi das partes, estabelecido no art. 791 da CLT, limita-se às Varas do Trabalho e aos Tribunais Regionais do Trabalho, não alcançando a ação rescisória, a ação cautelar, o mandado de segurança e os recursos de competência do Tribunal Superior do Trabalho.

 

Tal redação do Tribunal Máximo do Trabalho, nos permite entender que esse também entende e se guia pela constitucionalidade do jus postulandi, mesmo determinando um certo limite jurisdicional para a falta de atuação de um advogado como representante das partes litigantes, ou seja, de que o jus postulandi é permitido somente para as ações iniciais em uma lide trabalhista, sendo limitada para que o processo siga tramitando no Tribunal do Trabalho.

 

5. CONCLUSÃO

 

Observou-se durante o desenvolvimento deste artigo, o quão complexo e polêmico é este tema, sobre a inconstitucionalidade do jus postulandi na justiça do trabalho em face ao princípio constitucional do contraditório, pois o jus postulandi das partes perante a Justiça do Trabalho é inconstitucional, visto que inobserva o princípio constitucional do contraditório, pois o mesmo não compartilha da premissa mais importante de um Estado Democrático de Direito que é a democracia e a paridade de armas em um processo jurisdicional.

 

O artigo 791 da Consolidação das Leis do Trabalho, ao negar a necessidade do advogado na tutela debatida perante a Justiça do Trabalho, está ferindo o paradigma do Estado Democrático de Direito, uma vez que o artigo 133 da Constituição Federal é taxativo a respeito do ingresso de um indivíduo a algum órgão jurisdicional, pois para que isso ocorra é necessário um advogado.

 

Não é aceitável que a dispensa do advogado em uma determinada lide permita um maior acesso à justiça, pois somente o mesmo tem técnica e conhecimento jurídico para pleitear os direitos de seus clientes. Ademais, a participação do advogado no processo trabalhista é fundamental para o efetivo acesso à justiça, com qualidade, e como elemento garantidor da democracia e defesa, visto a já prévia desigualdade existente entre as partes de uma lide trabalhista.

 

A presença do advogado em um processo jurisdicional se faz necessário para o efetivo contraditório, ampla defesa, princípios estes garantidores em qualquer procedimento jurisdicional.

 

Em um Estado Democrático de Direito, os princípios norteiam o ordenamento jurídico, são a fonte basilar para todo o ordenamento jurídico. Ainda, pode-se dizer que, os princípios elencados em nossa constituição não podem ser suprimidos por qualquer motivo que seja, sendo estes de total importância para a convivência em sociedade, para o devido processo legal e para democracia brasileira.

 

A partir do momento que é negado o acesso do advogado em algum procedimento jurisdicional é colocada em segundo plano a própria democracia, além da própria dignidade da pessoa humana e da Carta Magna do Estado brasileiro.

 

Portanto, conclui-se que a partir do momento que ambos os polos em uma pretensão jurisdicional estão devidamente constituídos por seus advogados, nesta lide se concretizará a democracia, contraditório, ampla defesa, paridade de armas, dentre outros. Entretanto se alguma das partes não possui um advogado, sendo que este não é elemento supérfluo, mas sim necessário, não há que se falar em uma lide que segue os parâmetros constitucionais dentro de um Estado Democrático de Direito, que reconhece o advogado como indispensável à administração da justiça.

 

Por fim, o presente ensaio enseja que, apesar do entendimento do STF e TST pela constitucionalidade do artigo celetista que trata do jus postulandi, pauta-se aqui em sentido contrário, qual seja, na inconstitucionalidade do texto por se entender que a vigência de tal redação fere nosso texto máximo.

 

REFERÊNCIAS

 

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Setembro/2017