A ARBITRAGEM E A NEGOCIAÇÃO DIRETA: A VULNERABILIDADE É O FUNDAMENTO DO PRINCÍPIO DA PROTEÇÃO TRABALHISTA

 

 

 

MILTON FAGUNDES

Advogado Trabalhista

 

 

 

Seguindo a mesma lógica de aniquilar direitos trabalhistas, a Lei 13.467/2017 trouxe duas “novidades” para as trabalhadoras e trabalhadores que recebem salário mensal superior ao dobro do teto da previdência. Estes trabalhadores podem: (1) se também forem graduados em curso superior, negociar diretamente com o seu patrão cláusulas diversas das que foram pactuadas em Norma Coletiva – § único do art. 444; e, (2) ajustar com seu empregador que as divergências decorrentes do contrato de trabalho serão resolvidas por meio da arbitragem – art. 507A.

 

O conluio[1] de agentes políticos, que aprovou esta Lei, justifica grande parte das diminuições que impuseram a direitos trabalhistas, com a mesma alegação de que “todos são iguais perante a lei”. Sim, todas as pessoas iguais devem ser tratadas igualmente, porém, quando se trata de pessoas desiguais o tratamento também deve ser desigual.

   

Nos casos concretos da “prevalência do Acordo Individual sobre a Norma Coletiva” e o da “Arbitragem”, o que está subjacente é a falácia de que o maior salário e a maior escolaridade retiram do(a) empregado(a) a condição de vulnerável.

 

O fator nuclear da vulnerabilidade decorre dos EFEITOS DA SUBORDINAÇÃO no contrato de trabalho, e não na miserabilidade ou na   falta de escolaridade do(a) empregado(a).

 

A subordinação – no único sentido de determinar quem manda e quem obedece na relação contratual – não seria suficiente para colocar a empregada numa condição de vulnerabilidade.

 

O que é determinante para que a condição vulnerável seja identificada,  é o fato “daquele que manda” na relação contratual, também deter o poder de decretar o fim do contrato de trabalho, da mesma forma que a continuidade ou não de uma função de confiança – que em muitos casos significa 80% da remuneração mensal – sempre que a sua vontade não seja atendida.

 

A pessoa nesta condição não dispõe livremente de sua vontade!

 

Significa dizer: o que determina a presença da vulnerabilidade numa relação contratual não é a condição de pobre ou rico, escolarizado ou analfabeto, e sim a preponderância de uma parte (que tem poder de demitir ou de retirar a função gratificada, no exemplo referido) e o outro que está subordinado unicamente à vontade do patrão.

 

É exatamente isso que justifica a relevância das vulnerabilidades presentes no contrato consumerista em nosso país: A PREPONDERÂNCIA DO FORNECEDOR EM FACE DO CONSUMIDOR.

 

A propósito da vulnerabilidade nas relações de consumo, vale a lição do prof. Flavio Tartuce, segundo a qual “todo consumidor é vulnerável, mas nem todo consumidor é hipossuficiente[2].

 

Neste particular, resta especular se o mesmo reconhecimento do vulnerável é um direito capaz de subsistir com a entrada em vigor desta oportunista Lei, cuja marca preponderante é tratar desiguais de modo igual.

 

Com efeito, esta especulação tem a sua resposta em fundamento geral (que serve para grande parte desta lei): a “descaracterização da vulnerabilidade” dos empregados em relação ao patrão não visa melhoria na condição social da classe trabalhadora, previsto no caput art. 7º da Constituição Federal. Portanto, a Lei que retira o instituto jurídico da vulnerabilidade do cenário jurídico trabalhista é ineficaz.

 

A vulnerabilidade do(a) empregado(a) é o fundamento elementar para o Princípio da Proteção Trabalhista!

 

Assim, inexiste razão que justifique a retirada da condição vulnerável de empregados(as) que recebem salário mensal superior ao dobro do teto da previdência ou que sejam detentores de título de graduação em curso superior.

 

Outro aspecto relacionado especificamente com a arbitragem, é o fato dela, por sua natureza e característica, excluir da apreciação judicial eventual divergência quanto ao objeto que venha a ser levado para um árbitro. Portanto, este aspecto também padece da mesma ineficácia.

 

Uma das maneiras que se vislumbra de se buscar a não aplicabilidade destes dispositivos da Lei, é por meio de Ações Civis Públicas. O pedido seria no sentido de impor aos empregadores uma obrigação de não fazer, consistente em não submeter seus empregados à arbitragem do art. 507A nem à negociação direta do art. 444, § único.

 


[1] Houve uma combinação de esforços entre membros dos Poderes Executivo e Legislativo para retirar uma infinidade de direitos da classe trabalhadora, com o único objetivo de favorecer o patronato.

 

[2] TARTUCE, Flávio. NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Manual de Direito do Consumidor.     São Paulo: Gen/ Método, 2013, p. 34.

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2017