TRABALHO ARTÍSTICO INFANTOJUVENIL NA MÍDIA BRASILEIRA

 

 

 

ANA LUIZA MENDES VALADARES

Pós-Graduação em Direito do Trabalho no Instituto de Educação Continuada (IEC); graduada em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC Minas)

 

GRACIANE SALIBA

Doutora em Direito do Trabalho (2017) e Mestre em Direito Público pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (2009). Especialista em Direito do Trabalho pela Fundação Getúlio Vargas (FGV) e em Direito do Trabalho e Crise Econômica pela Universidad Castilla la Mancha (UCLM Espanha). Graduada em Direito pela Universidade Federal de Minas Gerais. Advogada e sócia do escritório SCS Consultoria Jurídica, com experiência na área de Direito do Trabalho, Direito Econômico e Direito Internacional. Bolsista NUFFIC na Academia de Direito Internacional de Haia (Hague Academy of Internatinal Law), em Haia, Holanda (2005). É membro da Associação Mineira de Direitos Humanos, Segurança e Solução de Conflitos ? Humanitas. Coordenadora do Curso de Direito da Universidade Santa Úrsula da qual também é professora. Foi professora e orientadora da Pós-graduação da Escola de Saúde Pública de Minas Gerais e Professora da Pós Graduação do IEC PUC Minas, da Faculdade Arnaldo, da Faculdade de Pará de Minas, da Faculdade Pitágoras e da Faculdade de Ciências Econômicas de Divinópolis.  Professora dos cursos de graduação da Universidade de Itaúna, Faculdade de Pará de Minas e Faculdade Pitágoras – Divinópolis. Atuou como Procuradora-chefe Administrativa e Patrimonial, Procuradora Adjunta e Controladora do Município de Itaúna. Autora de diversos artigos jurídicos e do livro Convenções da OIT & Empresas Transnacionais: em busca da efetivação dos direitos trabalhistas.

 

 

 

Resumo: O presente artigo visa discutir o trabalho artístico infantojuvenil, na tentativa de esclarecer à sociedade que, ao contrário do que se imagina, os artistas mirins são trabalhadores e não apenas crianças e adolescentes se divertindo. O texto objetiva, também, mostrar que tal tipo de trabalho acarreta inúmeros prejuízos para a vida dos envolvidos, sendo que muitas deles só se darão conta de tudo que perderam, após anos de vida trabalhados e perdidos; percebem, então, que tais anos não voltam mais; não serão resgatados. O artigo ainda discute: a legislação que permeia esse trabalho, com a previsão na Constituição Brasileira de 1988 e na Consolidação das Leis Trabalhistas, além de leis esparsas que tratam o tema no que tange ao trabalho infantojuvenil artístico e a quem cabe a competência para deliberar sobre o assunto na esfera judicial. A metodologia utilizada inclui: o método dedutivo desenvolvido através da pesquisa bibliográfica de doutrinas pertinentes ao tema, em artigos de periódicos e informações em meio eletrônico, e a pesquisa documental sobre legislação e jurisprudências.

 

Palavras-chave: Trabalho artístico infantojuvenil. Ilegalidade. Violação da Constituição e dos Direitos Humanos.

 

Sumário: 1. INTRODUÇÃO - 2. TRABALHO ARTÍSTICO INFANTIL E SUAS CONSEQUÊNCIAS: em direção à conscientização. 3. VIOLAÇÃO DA PROTEÇÃO INTEGRAL E DO PRINCIPIO DO MELHOR INTERESSE DO MENOR: A NORMATIZAÇÃO DO TRABALHO DO MENOR- 4. LIMITES E LEGISLAÇÃO – 5. COMPETÊNCIA PARA CONTROVÉRSIAS SOBRE O TRABALHO DOS MENORES - 6. CONCLUSÃO REFERÊNCIAS

 

 

 

1. INTRODUÇÃO

 

O Direito do Trabalho vem lutando contra a exploração da mão de obra infantojuvenil, desde as revoluções industriais. A busca pelo reconhecimento dos direitos da criança e do adolescente foi incessante e árdua, mas alcançada e, em assim sendo, o trabalho infantil foi vedado, podendo ocorrer apenas quando permitido por Lei, em situações específicas. Esta é a matéria de discussão deste artigo.

 

Apesar de muitos não notarem, o trabalho infantojuvenil ainda ocorre mais frequentemente do que se imagina, sendo uma realidade no Brasil e em diversos países, e é trabalho ainda muito divulgado e enaltecido, sem que a sociedade tenha conhecimento real sobre o seu efeito nefasto e a sua afronta aos preceitos constitucionais e trabalhistas. O trabalho artístico infantojuvenil, vem, a cada dia, sendo mais estimulado e ocorrendo em escala imensurável.

           

O conceito de criança e de adolescente, neste trabalho, foi extraído do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) que considera criança os indivíduos com até 12 anos incompletos e adolescentes aqueles entre 12 anos completos e 18 anos de idade. O objetivo deste artigo é informar a uma sociedade hipnotizada pela mídia, o que esta forma de trabalho é, realmente, apontando as consequências advindas do obscuro mundo do glamour, buscando combatê-las com a mesma garra com que se batalha contra outras formas de exploração infantil, como as ocorridas em carvoeiros, canaviais e feiras. O texto mostra, ainda, como a proteção integral e o princípio do melhor interesse do menor e seus direitos fundamentais vêm sendo violados.

 

Será feito, para possibilitar uma melhor compreensão sobre o tema, um breve relato sobre as leis do ordenamento jurídico brasileiro que regem o trabalho infantojuvenil, comprovando sua ilegalidade, e apresentando as exceções, ou seja, as condições de quando e como ele é permitido e pode ser aplicado e, o mais importante, tecendo críticas sobre como essas formas de trabalho podem estar equivocadas, já que classificadas como arte e inseridas dentro do mundo artístico. Discute-se, também, sobre a competência da Justiça do Trabalho para aprovar as autorizações judiciais, que podem vir a ocorrer de forma excepcional, e fundamentadas caso a caso, observados todos os requisitos das normas e dos preceitos apresentados neste artigo. Por fim, apresentam-se as considerações finais que abrangem aspectos analisados, com base nos objetivos que orientaram este artigo.

 

2. TRABALHO ARTÍSTICO INFANTIL E SUAS CONSEQUÊNCIAS: em direção à conscientização.

           

Ao pensar em artistas, uma parcela considerável da sociedade é condescendente, enxerga aspectos vislumbrados, a priori, como positivos, pensa no glamour, na fama, no dinheiro, isto é, apenas nos pontos expostos pela mídia, não percebe a invasão de privacidade, a exposição e a vulnerabilidade, em um trabalho árduo e dedicado,cujo objetivo é imposto aos artistas mirins que trabalham com a arte da interpretação, quer seja contracenando, cantando, participando de shows e atuações cênicas nos diversos locais. Na verdade, trata-se de assunto camuflado sob dogmas culturais, simplesmente, não visualizam essa atividade como um labor na qual exige muita dedicação, tais artistas necessitam saber lidar diretamente com o público, separar a arte da realidade, mas a sociedade só vê os aspectos apontados como positivos.

 

Nesta linha de raciocínio, deve-se destacar aqui a opinião de Suzéte da Silva Reis (2015, p.86), sobre os falsos atrativos da profissão:

 

O apelo comercial, com a utilização de crianças e adolescentes protagonizando a venda de inúmeros produtos ou serviços; o deslumbramento dos pais ao verem seus filhos na televisão; a concepção de que a atividade nos meios de comunicação é lúdica; a falsa ideia de que ao trabalhar em novelas, seriados e afins a criança ou adolescente leva ao aprendizado e que, com isso, no futuro, se tornarão artistas consagrados, são algumas das (falsas) premissas que sustentam e defendem o trabalho infantil nos meios de comunicação. (REIS, 2015, p. 86apudSOUZA; MARIA,2017, p. 6).

                       

Por esses motivos, a maioria da sociedade não consegue enxergar a vida cotidiana de um ator mirim, desconhece a exaustão que a criança-adolescentes ente por ficar inúmeras horas nas gravações, o tempo que ela gasta para decorar os textos, as horas de turnê que um cantor mirim deve cumprir, nos horários indiscriminados que irão ocorrer às gravações, tudo isso e mais o que vão perder de sua infância e sua adolescência, quanto tempo de vida aqueles profissionais mirins vão dedicar ao trabalho, como vão ter que saber diferenciar o trabalho artístico da vida real cotidiana, e, mais, suas reações, serão expostas a todo o Brasil. Além disso, o ambiente laboral pode confundir a(s) identidade(s) da criança, ou do adolescente, fazendo-os amadurecer precocemente, segundo André Viana Custódio e Josiane Rose Petry Veronese, em seu livro Trabalho Infantil: a negação do ser criança e adolescente no Brasil. Eles ensinam que

 

Uma das características mais visíveis da infância são as atividades lúdicas. A espontaneidade, a liberdade e a ausência de controle rígido estimulam o processo de desenvolvimento harmônico. A criança trabalhadora é compelida a bloquear esses impulsos naturais, que ao longo do tempo atenuam-se, até praticamente desaparecer. A criança passa a se auto-reconhecer como um trabalhador e, portanto, um adulto, prejudicando sua própria identidade infantil, visto que, neste contexto, o ser criança é anulado, pois é na atividade laboral submetida a regras, silenciada. (CUSTÓDIO; VERONESE, 2006, p.111).

           

Ao inserir uma criança ou um adolescente no mercado de trabalho, é necessário tomar todas as precauções possíveis, porque, não se consegue prever como seu trabalho afetará sua vida real, como será o efeito na educação e nem mesmo no aspecto psicológico.

 

Todo e qualquer trabalho artístico, como o laboral, é uma relação de trabalho e, como tal, está sujeito aos vínculos trabalhistas. É necessário que a sociedade, o estado e os familiares reflitam sobre certos pontos, como: uma criança, ou um adolescente, está preparado para encarar o ambiente laboral artístico? Seu lado psicológico, sua estrutura física suporta tal atividade? Eles possuem bagagem moral e ética imprescindíveis para a construção de seu caráter, para diferenciar o certo do errado? Possuiriam eles a maturidade necessária para saberem lidar com as consequências de estarem no ambiente artístico?

           

É sob essa linha de pensamento, que vale a pena citar uma reportagem escrita por Raquel Marques (2017) na qual ela também aborda o tema trabalho infantil artístico. Em seu texto, ela descreve uma cena do filme “Cidade de Deus”, em que atua Felipe Paulino, com 8 anos de idade, quando as cenas foram gravadas. A cena em questão foi eleita a mais violenta pelo site Pop Crunch, de acordo com sua reportagem. Marques ainda cita a fala de Felipe Paulino em que ele relata os traumas que as condições da construção da cena lhe causaram.

 

Filmar aquela cena foi um dos grandes traumas da minha vida. A preparadora de elenco fazia uns exercícios muito loucos para que eu tivesse medo do Leandro Firmino (ator que interpretou o personagem Zé Pequeno). A gente não podia almoçar junto, me deixavam em um quarto escuro, acendiam a luz de repente e o Leandro estava lá. Aquilo ficou na minha mente por muito tempo. (PAULINO apud MARQUES, 2017)

           

Raquel Marques (2017) ainda narra que, na época, o pai de Felipe Paulino recebera sete mil reais (R$7.000,00) de cachê pela participação do filho, mas administrou mal o dinheiro e Felipe não usufruiu do que ganhou. É o próprio ator que relata: “[...] meu pai foi seduzido pela ideia do dinheiro e não pensou nas consequências que isso me traria” (PAULINO apud MARQUES, 2017).

           

Assim,como se pode perceber, não há apenas diversão e glamorização por trás do que as mídias apresentam; há muita renúncia, pois, trabalho não é diversão, como o próprio nome já diz.

 

Nesse sentido, vale apena citar uma declaração feita pela atriz Carolina Dieckmann, no canal da youtuber Giovanna Ewbank (2018), em um quadro chamado Na cama com GioEwbank, no qual esta faz perguntas aos convidados. No quadro, Carolina Dieckmann relata que começou a trabalhar com 12 anos como modelo, que seu primeiro trabalho foi um comercial da Radio Cidade e, logo após, ingressou na carreira de artista, fazendo uma novela da Globo chamada Sex Appeal. Em seguida, ela narra a vida que está levando nos Estados Unidos, que está fazendo um curso de inglês para aprender a língua do país. Neste momento, surge o assunto mais esperado: a entrevistadora Giovanna comenta: “porque você começou muito cedo também a trabalhar, né Carol, então, acho que você não teve muito tempo pra viver isso que você está vivendo agora”. Carolina responde, assentindo que sim com a cabeça e, concordando com a fala, completa: “Pra estudar sério mesmo, sabe”. Logo em seguida, a apresentadora pergunta para Carol: “Você está gostando, assim, de ser a Carol, mulher do Tiago, mãe do Davi e do José, estudando, tendo o seu tempo pra você?” Carolina Dieckmann responde:

 

Eu me sinto muito, assim, tipo reabastecendo, sabe muito grata; eu agradeço muito tá podendo ter essa oportunidade agora, é, já com 39 anos, porque eu não tive quando eu tinha 15,16 e, tudo bem, mas poder, nesse momento, ficar um pouco mais com a minha família, né, estudar pô,eu tenho a vida assim, que parece que sonho, ando de bicicleta no sol, eu me sinto sem idade, como se eu tivesse, sei lá, me congelado em uma bolha fora da minha vida e vivendo, assim, em uma bolinha de sonho”. (DIECKMANN apud EWBANK, 2018).

 

Carolina também comentou, nesse bate papo, que ela, atualmente, se sente sem idade, e acha isso muito louco, que tem momentos da sua vida que se sente com 80 anos e tem horas que se sente com 8 anos de idade, como uma criança sendo simplesmente espontânea; ela ainda fala que não existe idade no momento presente, nem espaço, mas, apenas o fato de estar vivendo intensamente, de estar presente, de agradecer, de poder estar nos lugares e completa: “o presente não tem idade”.

 

A análise dos depoimentos dos dois atores mencionados, Felipe Paulino e Carolina Dieckmann, deixa nítidas as consequências que o trabalho trouxe às suas vidas. Diante das exigências da profissão, nota-se o quão prejudicial é para a formação dos envolvidos, como influencia sua atividade do dia-a-dia, quando são apenas crianças e adolescentes, como o trabalho é prejudicial aos seus estudos e ao gozo da infância.

 

As falas de Carolina Dieckmann mostram como ela deve ter amadurecido com o trabalho iniciado aos 12 anos, no começo da adolescência e como deve ter sido difícil sua entrada na fase adulta antecipada, e como hoje ela se alegra de estar podendo fazer o que não fizera quando mais nova, o que aponta para o saltar de etapas da vida, tanto na infância quanto na adolescência, tão essenciais ao crescimento e à maturidade. Os anos perdidos com o trabalho na adolescência, aqueles aos quais este texto se referiu anteriormente, se perderam. Vale ressaltar que a conscientização de Carolina, tudo isso que lhe está acontecendo, se deve ao fato de ela residir, hoje, nos Estados Unidos, onde é apenas mais uma pessoa e não a atriz famosa que é no Brasil.

 

Nesse sentido, para André Viana Custódio e Josiane Rose Petry Veronese (2007) a anulação da infância é uma das consequências do trabalho infantil. Eles explicam:

 

Crianças e adolescentes estão em processo especial de desenvolvimento. O trabalho precoce afeta diretamente o desenvolvimento físico e psicológico, ao sujeitá-los a esforços perigosos ou que vão além de suas possibilidades estruturais, resultando num pseudo-amadurecimento, pois anula a infância, a juventude e compromete as possibilidades de uma fase adulta saudável. (CUSTÓDIO; VERONESE, 2016, p. 105-106).

            

Todavia, o assunto abordado neste artigo, possui ainda um outro viés: o trabalho artístico infantojuvenil é vedado pela Constitucional, não se trata apenas de se abordar a mera participação, ou a dramatização cênica, pois, a arte é importante, por fazer parte da educação de toda criança e todo adolescente, porquanto ajuda a formar indivíduos, por estar lado a lado com a cultura, mas o limite legal exposto no instrumento constitucional tem o intuito de proteção ao desenvolvimento e cumprimento de normas internacionais. No entanto, tanto a participação quanto o trabalho artístico devem ser comedidos, tendo-se sempre em mente que se está lidando com pessoas em processo de crescimento, em fase de formação psicológica e biológica, e, portanto, cheias de fragilidades. Cabe citar o entendimento de Sandra Regina Cavalcante (2011) sobre esse tema:

 

O trabalho artístico realizado por crianças, embora exponha o indivíduo à formação cultural (o que é positivo para a sua educação), também requer muito esforço e dedicação para ser executado, o que pode trazer muitas consequências danosas como os outros trabalhos infantis. Geralmente, esta atividade é mais bem remunerada do que as outras formas de trabalho infantil, mas, igualmente, tende a restringir as possibilidades do futuro daquele ser em formação, porque os artistas mirins, assim como os trabalhadores mirins, ficam ocupados em sua arte/trabalho e não se dedicam, em regra, à escola e ao desenvolvimento pleno de suas potencialidades físicas, psicológicas, emocionais e sociais. (CAVALCANTE, 2011, p.44).

           

A esta altura, vale estabelecer a diferença entre participação artística e trabalho artístico.

 

O trabalho artístico se configura, quando a atividade está vinculada a um contrato, é realizada subordinadamente, sob o comando de um terceiro, na vigência de remuneração, que é a contraprestação da obrigação, sendo esta o trabalho artístico da criança ou do adolescente envolvidos. Por outro lado, na participação artística infantojuvenil, não há subordinação direta, nem contratos de trabalho; há apenas uma apresentação inocente que a criança ou o adolescente consideram diversão, brincadeira, recreação e que, por isso, não os sobrecarregará. São instantes em que surge a possibilidade de os indivíduos fazerem uma apresentação teatral em sua cidade natal, ou apenas participarem de um evento, apenas por diversão.

   

O trabalho infantil artístico, segundo Guérin (2011),

 

muda a essência e a natureza da atividade “ingênua”, lúdica ou recreativa. Em primeiro lugar está a atividade objeto de exploração e motivação econômica, com suas nuances e riscos, e numa segunda camada aparece à atividade livre e criativa do artista. (GUÉRIN, 2011 apud CAVALCANTE, 2013, p.141-142).

            

A Ministra do Tribunal Superior do Trabalho, Kátia Arruda (2012), em entrevista concedida a Lurdes Cortes, se pronunciou sobre as consequências do trabalho artístico infantojuvenildas quais é relevante citar:

 

[...] O estresse permanente que envolve a atividade artística, aliado às obrigações contratuais com horários, regras, além da possibilidade de exposição a diversos fatores de risco podem causar prejuízos psicológicos irreversíveis. Além disso, é comum o abandono ou descontinuidade escolar com defasagem na aprendizagem. (ARRUDA, 2012).

          

Assim, se tornam notórias as dificuldades que uma criança ou um adolescente enfrentam em seu cotidiano artístico, entre elas as muitas violações aos seus direitos. Como todos são responsáveis pela educação das crianças e dos adolescentes, é muito importante que a sociedade, o estado e os familiares se conscientizem, o mais rápido possível, e se lembrem de que “nem tudo que reluz é ouro”, que todo glamour tem um preço.

 

3. VIOLAÇÃO DA PROTEÇÃO INTEGRAL E DO PRINCIPIO DO MELHOR INTERESSE DO MENOR: A NORMATIZAÇÃO DO TRABALHO DO MENOR

            

Como mencionado na Introdução deste artigo, a luta contra a exploração da mão de obra infantojuvenil já se estende desde a Revolução Industrial, durante a qual ocorreu um grande crescimento da mão de obra infantil que enfrentou péssimas condições de trabalho, pequenas remunerações e trabalhos insalubres. Isso fez com que surgissem as primeiras leis para proteger os menores trabalhadores, e marcou o surgimento da Organização Internacional do Trabalho (OIT), durante a Conferência da Paz, no Palácio de Versalhes, através do Tratado de Versalhes, em 1919, a qual vem se dedicando, dentre outras questões, à formação profissional do adolescente, buscando a erradicação e pelo menos a universalização da idade mínima para seu ingresso no mercado de trabalho. Com a criação da Organização das Nações Unidas (ONU) e a aprovação da Declaração Universal dos Direitos Humanos (DUDH), em 1948,ocorreu um grande avanço na busca pela internacionalização da proteção dos direitos humanos. Após esse processo, a ONU proclamou a Declaração dos Direitos das Crianças, reconhecendo seu direito à proteção integral. (CAVALCANTE, 2011, p.31).

           

Com a Constituição Federal brasileira de 1988, o legislador trouxe alterações e inovações na norma especial de proteção contra o trabalho infantil, pensando na integridade, na segurança e no bem estar da criança e do adolescente e proibindo, em seu artigo 7°, XXXIII o trabalho noturno, o perigoso ou o insalubre a menores de dezoito e de qualquer trabalho a menores de dezesseis anos, salvo na condição de aprendiz, a partir de quatorze anos. Em 1990, surgiu o Estatuto da Criança e do Adolescente, conquista gigante para estabelecer e garantir os direitos das crianças e combater o trabalho infantil, atuando como um reforço constitucional, disciplinando a teoria da proteção integral em seus artigos 1° e 3°, como se pode ler, a seguir.

 

Art. 1º Esta Lei dispõe sobre a proteção integral à criança e ao adolescente.

Art. 3º A criança e o adolescente gozam de todos os direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, sem prejuízo da proteção integral de que trata esta Lei, assegurando-se lhes, por lei ou por outros meios, todas as oportunidades e facilidades, a fim de lhes facultar o desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social, em condições de liberdade e de dignidade. (BRASIL, 1990).

            

O legislador constituinte também reconheceu as crianças e os adolescentes como sujeitos de direitos no caput do artigo 227° da Constituição Federal (CF/1988), na qual também prevê o princípio da proteção integral:

 

Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão. (Redação dada Pela Emenda Constitucional nº 65, de 2010) (BRASIL, 1988).

           

Portanto, após analisar o ordenamento jurídico vigente, nota-se que, ao se ocorre o trabalho artístico infantojuvenil a menores de 14 anos, viola-se frontalmente o direito da proteção integral e o princípio do melhor interesse do menor. E o pior disso tudo é que quem promove estas violações são os mesmos que deveriam estar garantindo estes direitos fundamentais.

           

Quando os pais permitem que seus filhos trabalhem em um programa de televisão ou que abram um canal no YouTube, não têm consciência do mal que podem estar causando aos seus filhos, quando, na verdade, deveriam impor limites e estabelecer regras para essas atividades. Ao incentivar seu filho aquele pai estará promovendo a inversão dos papéis familiares. Está ajudando a prejudicar seu filho tanto nos aspectos psicológicos, físicos, mentais; estará abrindo caminho para que todas as consequências aludidas neste artigo advenham para a criança e o adolescente que se inserirem nesse meio. Sobre o poder familiar, o Código Civil, em seu artigo 1.634° determina:

 

Art. 1.634.  Compete a ambos os pais, qualquer que seja a sua situação conjugal, o pleno exercício do poder familiar, que consiste em, quanto aos filhos:  (Redação dada pela Lei nº 13.058, de 2014)

I - dirigir-lhes a criação e a educação;     (Redação dada pela Lei nº 13.058, de 2014).

IV-conceder-lhes ou negar-lhes consentimento para viajarem ao exterior; (Redação dada pela Lei nº 13.058, de 2014)

VII - representá-los judicial e extrajudicialmente até os 16 (dezesseis) anos, nos atos da vida civil, e assisti-los, após essa idade, nos atos em que forem partes, suprindo-lhes o consentimento;     (Redação dada pela Lei nº 13.058, de 2014)

VIII - reclamá-los de quem ilegalmente os detenha;     (Incluído pela Lei nº 13.058, de 2014)

IX -exigir que lhes prestem obediência, respeito e os serviços próprios de sua idade e condição(Incluído pela Lei nº 13.058, de 2014)

(BRASIL,2002b,grifo nosso)

           

É neste sentido que se faz de extrema importância que os pais pesquisem sobre o meio em que seus filhos estão se inserindo, tentem tomar conhecimento sobre o mundo do qual seus filhos participarão, saibam o que vai mudar na vida dos filhos, e que nunca admitam a inversão dos papéis de poder familiar, não se permitindo depender economicamente do trabalho do filho, ou perder sua autoridade de pais sobre eles; ao contrário, devem ensinar o respeito, não deixar que os filhos se percam em um mundo lúdico, supérfluo, frio, por acharem que têm tudo ou podem ter tudo devido à fama.

 

4. LIMITES E LEGISLAÇÃO

 

Em 15 de fevereiro de 2002, no decreto n°4.134, o Brasil promulgou a convenção n°138 e a recomendação n°146 da OIT, sobre a idade mínima de admissão ao emprego, mas, já em 15 de dezembro de 1998, a alteração ocorrida na Constituição Federal dada pela Emenda Constitucional n°20, no seu artigo 7, inciso XXXIII já havia legislado sobre tal assunto. Leia-se o referido artigo.

 

Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social:

XXXIII - proibição de trabalho noturno, perigoso ou insalubre a menores de dezoito e de qualquer trabalho a menores de dezesseis anos, salvo na condição de aprendiz, a partir de quatorze anos; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 20, de 1998) (BRASIL, 1988)

           

Assim, a CF/1988 brasileira proibiu o trabalho de crianças e adolescentes em todas as formas, não concedendo exceção alguma a nenhum tipo de trabalho envolvendo menores de 14 anos, especificando que adolescentes, com idade mínima de 14 anos, podem trabalhar de forma excepcional na condição de menor aprendiz, e explicitando que, se não for na condição de aprendiz, é vedado qualquer  trabalho a menores de 16 anos, e proibido o trabalho noturno, perigoso ou insalubre a menores de 18 anos. Isso significa que nenhuma criança ou adolescente pode trabalhar em horário noturno, em condições perigosas ou insalubres.

           

O legislador reforça essa proibição e impõe condições para a aplicação da exceção ao trabalho do menor, no artigo 227, §3, inciso I, II E III também da CF/1988, que prevê que o direito à proteção especial da criança e do adolescente compreende que o trabalho de menores só pode ser aplicado à idade mínima de quatorze anos para admissão ao trabalho, observado o disposto no art. 7º, XXXIII, garantindo-lhes direitos previdenciários e trabalhistas, e não se esquecendo do mais importante: a garantia de acesso do trabalhador adolescente e jovem à escola. (BRASIL, 1988).

           

À semelhança da CF/1988, também encontramos restrições ao trabalho infantojuvenil na Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT) nos artigos 402, 403, 404, 405.

 

Art. 402. Considera-se menor para os efeitos desta Consolidação o trabalhador de quatorze até dezoito anos (Redação dada pela Lei nº 10.097, de 2000)

Art. 403. É proibido qualquer trabalho a menores de dezesseis anos de idade, salvo na condição de aprendiz, a partir dos quatorze anos. (Redação dada pela Lei nº 10.097, de 2000)

Parágrafo único. O trabalho do menor não poderá ser realizado em locais prejudiciais à sua formação, ao seu desenvolvimento físico, psíquico, moral e social e em horários e locais que não permitam a freqüência à escola. (Redação dada pela Lei nº 10.097, de 2000)

Art. 404. ao menor de 18 (dezoito) anos é vedado o trabalho noturno, considerado este o que for executado no período compreendido entre as 22 (vinte e duas) e as 5 (cinco) horas.

Art. 405 - Ao menor não será permitido o trabalho: (Redação dada pelo Decreto-lei nº 229, de 28.2.1967)

I - nos locais e serviços perigosos ou insalubres, constantes de quadro para êsse fim aprovado pelo Diretor Geral do Departamento de Segurança e Higiene do Trabalho;  (Incluído pelo Decreto-lei nº 229, de 28.2.1967)

II -em locais ou serviços prejudiciais à sua moralidade. (Incluído pelo Decreto-lei nº 229, de 28.2.1967)

§ 2º O trabalho exercido nas ruas, praças e outros logradouros dependerá de prévia autorização do Juiz de Menores, ao qual cabe verificar se a ocupação é indispensável à sua própria subsistência ou à de seus pais, avós ou irmãos e se dessa ocupação não poderá advir prejuízo à sua formação moral. (Redação dada pelo Decreto-lei nº 229, de 28.2.1967)

§ 3º Considera-se prejudicial à moralidade do menor o trabalho: (Redação dada pelo Decreto-lei nº 229, de 28.2.1967)

a) prestado de qualquer modo, em teatros de revista, cinemas, buates, cassinos, cabarés, dancings e estabelecimentos análogos; (Incluída pelo Decreto-lei nº 229, de 28.2.1967)

b) em emprêsas circenses, em funções de acróbata, saltimbanco, ginasta e outras semelhantes; (Incluída pelo Decreto-lei nº 229, de 28.2.1967)

c) de produção, composição, entrega ou venda de escritos, impressos, cartazes, desenhos, gravuras, pinturas, emblemas, imagens e quaisquer outros objetos que possam, a juízo da autoridade competente, prejudicar sua formação moral; (Incluída pelo Decreto-lei nº 229, de 28.2.1967)

d) consistente na venda, a varejo, de bebidas alcoólicas. (Incluída pelo Decreto-lei nº 229, de 28.2.1967)

§ 4º Nas localidades em que existirem, oficialmente reconhecidas, instituições destinadas ao amparo dos menores jornaleiros, só aos que se encontrem sob o patrocínio dessas entidades será outorgada a autorização do trabalho a que alude o § 2º. (Incluído pelo Decreto-lei nº 229, de 28.2.1967)

§ 5º Aplica-se ao menor o disposto no art. 390 e seu parágrafo único. (Incluído pelo Decreto-lei nº 229, de 28.2.1967)(BRASIL, 1943, grifo nosso).

            

Como podemos observar, mais uma vez, o trabalho artístico infantojuvenil ocorre contra normas expressas e claras do ordenamento jurídico brasileiro. O artigo 402 das leis trabalhistas (CLT) só cogita a possibilidade do trabalho do menor, quando o ele já tiver, no mínimo, 14 anos, mas, no Brasil, as leis são interpretadas distorcidamente, e, por isso, a lei muitas vezes é infringida e há menores que trabalham com qualquer idade. O artigo 403 citado anteriormente mostra que o não admite, de forma alguma, o trabalho do menor de 14 anos, e o dos maiores de 14 anos passa a ser proibido, quando ocorrerem em locais que prejudiquem sua formação, seu desenvolvimento físico, psíquico, moral e ou social, não podendo também acontecer nos horários escolares ou em lugares que não possibilitem a frequência do menor à escola. Mas, o problema é que esse tipo de labor traz conseqüências nefastas para os envolvidos, porque eles atuam em um ambiente, que sem perceberem, passam a se dedicar muito mais ao trabalho artístico, abandonando seu papel real e original de criança ou de adolescente.

           

Pode-se notar a interferência do trabalho no mundo escolar dos menores. Fica nítido que as crianças sofrem para conciliar os dois mundos, porque, é muita responsabilidade a ser administrada. A modelo Kyra Passos, por exemplo, em uma reportagem afirmou que, desde cedo, teve que tomar decisões importantes como, por exemplo, escolher entre a carreira ou os estudos. Conta que perdeu revisões de provas, explicou que manter os estudos em primeiro lugar ficara mais difícil, e que, por causa de trabalho, teve que estudar via Internet, por Skype, e os professores lhe enviavam os trabalhos; mas, isso o pior foi que a modelo, por estar sofrendo muita pressão, optou por interromper os estudos. Para resolver o problema dos estudos, ela fez um supletivo aos 18 anos. (PASSOS, apud PEREIRA; SANTARITA, 2017)

           

O papel da escola é promover a educação e a construção do caráter, e não ceder a essas soluções enganosas ou acobertar abusos aos direitos das crianças e dos adolescentes.

           

Após mencionar como é prejudicial este meio para crianças e adolescentes, o artigo 405 da CLT já citado, reafirma o que já foi legislado pela Constituição. No seu inciso II, ele veta o trabalho em locais ou serviços que prejudiquem a moral do menor. Em seu §3, traz um rol exemplificativo de quais seriam esses trabalhos presentes na alínea A, B, C e D do mesmo dispositivo legal, atestando, declaradamente, que considera prejudicial à moralidade do menor o trabalho prestado, qualquer que seja ele, em teatro de revista, cinemas, boates, cassinos, cabarés, dancings, estabelecimentos análogos, empresas circenses, em funções de acrobata, saltimbanco, ginastas, de produções, composição, entrega ou venda de escritos e outros semelhantes, como comprovam todos os depoimentos presentes no artigo.

           

No artigo 405, o §2, CLT, menciona uma exceção que possibilita o trabalho do menor, mas impõe condições através das quais um juiz de menores deve autorizar a participação, não o trabalho, ou a ocupação, não podendo ser ele definitivo, mas de curto prazo, e só permitido, se verificado que essa ocupação se torna indispensável para a sua própria subsistência ou para o sustento da família. No entanto, o referido artigo deixa claro que essa ocupação não poderá acarretar prejuízos à formação moral. Assim, já se exclui a possibilidade de ela ocorrer em ambiente artístico que, como já mostrado. E essa exceção concedida no artigo mencionado é para que o núcleo familiar possa se reestruturar, e não para que ocorra uma exploração da mão de obra do menor pelos próprios pais.

                       

O artigo 404 da CLT vem ratificar a constituição e delimitar o horário de trabalho noturno compreendido entre 22 e 5 horas da manhã. O artigo veta qualquer tipo de trabalho para menores de 18 anos, se ocorrerem após as 22 horas, mas, no ambiente artístico, sabe-se, é comum que esse trabalho ocorra em horários noturnos. As horas de gravações, shows e desfiles normalmente se estendem, não tendo, assim, horários exatos para acabarem.

           

A Consolidações das Leis Trabalhistas (CLT), no artigo 406, legisla sobre a possibilidade de ocorrer uma autorização para o menor trabalhar em locais que, segundo o artigo 405 §3, em suas alíneas A e B, são considerados prejudiciais à moralidade. Entretanto, ressalte-se que, para estes artigos, menor é o trabalhador na faixa etária entre14 e18 anos, e, sendo assim, já se desconsideram as crianças e os adolescentes que têm idade inferior a 14 anos, sendo, por isso, considerado trabalho ilegal.

 

Art. 406 - O Juiz de Menores poderá autorizar ao menor o trabalho a que se referem as letras "a" e "b" do § 3º do art. 405:(Redação dada pelo Decreto-lei nº 229, de 28.2.1967)

I - desde que a representação tenha fim educativo ou a peça de que participe não possa ser prejudicial à sua formação moral;(Redação dada pelo Decreto-lei nº 229, de 28.2.1967)

II - desde que se certifique ser a ocupação do menor indispensável à própria subsistência ou à de seus pais, avós ou irmãos e não advir nenhum prejuízo à sua formação moral.(Redação dada pelo Decreto-lei nº 229, de 28.2.1967)(BRASIL, 1943, grifo nosso)

           

Neste artigo, o legislador tentou aludir à importância que a cultura e as artes têm para a formação de uma menor. Ele tinha o objetivo de permitir participações das quais advêm apenas consequências positivas, que não tenham o ônus, já mencionado no artigo. Trata-se, portanto, de participações educacionais, totalmente diferentes das que se encontram no mercado criado pelo capitalismo, e em que crianças e adolescentes passam horas e horas trabalhando. Pode-se notar essa intenção no artigo, pois, ele vetou a possibilidade de ser aplicado, quando for prejudicial à formação moral dos sujeitos em questão.

 

Para deixar claro que realmente, a intenção do legislador era proteger o menor e vetar o trabalho infantil que prejudica seu desenvolvimento e impor limes nas autorizações, vale a pena citar o artigo 407 e 410 da CLT.

 

Art. 407 - Verificado pela autoridade competente que o trabalho executado pelo menor é prejudicial à sua saúde, ao seu desenvolvimento físico ou a sua moralidade, poderá ela obrigá-lo a abandonar o serviço, devendo a respectiva empresa, quando for o caso, proporcionar ao menor todas as facilidades para mudar de funções.(Redação dada pelo Decreto-lei nº 229, de 28.2.1967)

Parágrafo único - Quando a empresa não tomar as medidas possíveis e recomendadas pela autoridade competente para que o menor mude de função, configurar-se-á a rescisão do contrato de trabalho, na forma do art. 483. (Incluído pelo Decreto-lei nº 229, de 28.2.1967)

Art. 410 - O Ministro do Trabalho, Industria e Comercio poderá derrogar qualquer proibição decorrente do quadro a que se refere a alínea "a" do art. 405 quando se certificar haver desaparecido, parcial ou totalmente, o caráter perigoso ou insalubre, que determinou a proibição. (BRASIL, 1943).

            

Os artigos deixam claro que, ao permitir certas participações de crianças e adolescentes de todas as idades, por meio de autorizações judiciais, ocorre uma séria deturpação da norma legal, fazendo o ato ilegal se travestir de legal e permitido, violando os direitos determinados pela norma maior, e sacrificando boa parte das vidas de crianças e adolescentes inocentes, como meio de ganhar dinheiro.

           

Como prova de tal deturpação, encontramos no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) total respaldo com o aludido anteriormente, dando mais embasamento legal para abolir o trabalho artístico infantojuvenil.

           

Portanto, os artigos que tratam do trabalho para menor no ECA são os de números 60 a 69 que tratam do direito à profissionalização e a proteção no trabalho,que possuem legislação especial e na qual o sujeito infantojuvenil é tratado como menor aprendiz na Constituição, que diz respeito a menores com no mínimo 14 anos e no máximo 18 anos, evidenciando, mais uma vez, a inviabilidade do trabalho para menores de 14 anos .

           

Nessa linha de raciocínio, vale a pena citar os artigos 60, 62, 63, 67, 68 e 69 do mesmo dispositivo legal.

 

Art. 60. É proibido qualquer trabalho a menores de quatorze anos de idade, salvo na condição de aprendiz. (Vide Constituição Federal)

Art. 62. Considera-se aprendizagem a formação técnico-profissional ministrada segundo as diretrizes e bases da legislação de educação em vigor.

Art. 63. A formação técnico-profissional obedecerá aos seguintes princípios:

I - garantia de acesso e freqüência obrigatória ao ensino regular;

II - atividade compatível com o desenvolvimento do adolescente;

III - horário especial para o exercício das atividades.

Art. 67. Ao adolescente empregado, aprendiz, em regime familiar de trabalho, aluno de escola técnica, assistido em entidade governamental ou não-governamental, é vedado trabalho:

I - noturno, realizado entre as vinte e duas horas de um dia e as cinco horas do dia seguinte;

II - perigoso, insalubre ou penoso;

III - realizado em locais prejudiciais à sua formação e ao seu desenvolvimento físico, psíquico, moral e social;

IV - realizado em horários e locais que não permitam a freqüência à escola.

Art. 68. O programa social que tenha por base o trabalho educativo, sob responsabilidade de entidade governamental ou não-governamental sem fins lucrativos, deverá assegurar ao adolescente que dele participe condições de capacitação para o exercício de atividade regular remunerada.

§ 1º Entende-se por trabalho educativo a atividade laboral em que as exigências pedagógicas relativas ao desenvolvimento pessoal e social do educando prevalecem sobre o aspecto produtivo.

§ 2º A remuneração que o adolescente recebe pelo trabalho efetuado ou a participação na venda dos produtos de seu trabalho não desfigura o caráter educativo.

Art. 69. O adolescente tem direito à profissionalização e à proteção no trabalho, observados os seguintes aspectos, entre outros:

I - respeito à condição peculiar de pessoa em desenvolvimento;

II - capacitação profissional adequada ao mercado de trabalho.(BRASIL, 1990)

           

Esses artigos apontam que o trabalho artístico infantil em nada se equivale ao direito à profissionalização a que o ECA alude; o trabalho infantojuvenil não se mostra educacional, pelo contrário, ajuda a deseducar os jovens, a distorcer a realidade e prejudicar seu crescimento. Trata-se de um dispositivo para ajudar adolescentes a ingressar no mercado de trabalho, a colocar em pratica a formação técnica que esteja adquirindo em uma escola profissionalizante. O caráter desses indivíduos já se encontra em processo deformação, e eles já possuem um certo conhecimento sobre o ambiente laboral em que vão ser inseridos, já possuem idade adequada para discernir o certo do errado e para diferenciar o real do irreal.

           

O que ocorre é a utilização distorcida do artigo 149 inciso II do ECA combinado com o artigo 8 da convenção 138 da Organização Internacional do Trabalho, para que se concedam as autorizações judiciais que permitem algumas participações em atividades artísticas, algumas sim, pois,em muitas, sequer existe a autorização para tal participação. Nesse sentido, cabe citar os dispositivos mencionados anteriormente:

 

Art. 149. Compete à autoridade judiciária disciplinar, através de portaria, ou autorizar, mediante alvará:

I -a entrada e permanência de criança ou adolescente, desacompanhado dos pais ou responsável, em:

a) estádio, ginásio e campo desportivo;

b) bailes ou promoções dançantes;

c) boate ou congêneres;

d) casa que explore comercialmente diversões eletrônicas;

e) estúdios cinematográficos, de teatro, rádio e televisão.

II -a participação de criança e adolescente em:

a) espetáculos públicos e seus ensaios;

b) certames de beleza.

§ 1º Para os fins do disposto neste artigo, a autoridade judiciária levará em conta, dentre outros fatores:

a) os princípios desta Lei;

b) as peculiaridades locais;

c) a existência de instalações adequadas;

d) o tipo de freqüência habitual ao local;

e) a adequação do ambiente a eventual participação ou freqüência de crianças e adolescentes;

f) a natureza do espetáculo

§ 2º As medidas adotadas na conformidade deste artigo deverão ser fundamentadas, caso a caso, vedadas as determinações de caráter geral.

(BRASIL, 1990).

 

Artigo 8º

1. A autoridade competente, após consulta às organizações de empregadores e de trabalhadores concernentes, se as houver, poderá, mediante licenças concedidas em casos individuais, permitir exceções para a proibição de emprego ou trabalho provida no Artigo 2º desta Convenção, para finalidades como a participação em representações artísticas.

2. Licenças dessa natureza limitarão o número de horas de duração do emprego ou trabalho e estabelecerão as condições em que é permitido. (BRASIL, 2002).

            

A interpretação equivocada destes artigos fez emergir a ideia absurda de que o trabalho artístico infantojuvenil é permitido, sem sequer considerar todas as condições impostas para esses trabalhos no ordenamento jurídico brasileiro. A diferença entre a regra e a exceção a ela é profunda. O artigo 149 do ECA deixa claro que cabe ao juiz competente autorizar as participações de crianças e adolescentes em espetáculos públicos, em seus ensaios e em certames de beleza. O mesmo modo de autorização está presente no artigo 8 da Convenção sobre Idade Mínima de Admissão ao Emprego da OIT o qual permite as participações com a autorização do juiz, estendendo-as às representações artísticas em geral, não estipulando, em nenhum dos dois artigos, uma idade mínima para a participação. No entanto, o problema é que o ordenamento jurídico vigente já delegou sobre o assunto, impondo a idade de 14 anos.

           

Contudo, mesmo que alguns juristas compreendam que existe a exceção e que ela pode ser aplicada para todas as idades, suas condições não se alteram, e ela deve seguir todas as exigências impostas nas normas presentes no artigo 149 §1 e §2 da CLT e artigo 8 da OIT, sendo que, para conceder a autorização, é necessário observar os princípios que regem o ECA, as peculiaridades dos locais, exigir instalações adequadas para o menor, e adequação do ambiente para que o menor possa participar, descrever o tipo de frequência habitual do local, relatar qual a frequência da criança ou do adolescente, descrever a natureza do espetáculo, que devem ser fundamentadas caso a caso, sendo personalíssima a cada criança e proibidas as autorizações de caráter geral, sem as referidas especificações, devendo conter as limitações de número de horas, além de prescreverem as condições em que o trabalho poderá ser realizado.

           

Uma crítica feita à reportagem escrita por Fernanda Sucupira (2012), por uma secretária executiva do Fórum Nacional de Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil (FNPETI) chamada Isa Maria Oliveira, aponta a realidade das autorizações judiciais no país:

 

No entanto, a maior parte das autorizações judiciais no Brasil atualmente é absolutamente vaga. “O que predomina não é uma excepcionalidade, já que crianças e adolescentes saem de uma telenovela e vão para outra e há crianças trabalhando em programas de auditório ano após ano. Há um equívoco inaceitável de quem dá as autorizações e não leva em consideração os prejuízos e comprometimentos dessa atividade para a criança. (OLIVEIRA, apud SUCUPIRA, 2012)

            

Vale citar, também, a ex-diretora de cidadania e direitos humanos da Anamatra, Sandra Bertelli, quando afirma que, atualmente,

 

boa parte dos alvarás é concedida sem um cuidado maior na apreciação do que esse trabalho pode gerar, que tipo de consequências, em que meio o adolescente vai ser inserido, quais os impactos psicológicos e de formação educacional e da própria vida. (BERTELLI, apud SADA, 2016).

   

Como já discutido neste artigo, a forma de trabalho artístico vai totalmente contra os princípios da Lei, é contrária à proteção integral da criança e do adolescente e fere seus direitos fundamentais e o princípio da proteção do menor, pois, o expõem de várias formas, privando-o de sua liberdade. Assim sendo, afetam-se, diretamente, os artigos 3 e 5 do ECA, sem mencionar a violação dos direitos fundamentais garantidos pela Constituição.

 

5. COMPETÊNCIA PARA CONTROVÉRSIAS SOBRE O TRABALHO DOS MENORES

 

As Autorizações Judiciais devem ocorrer por meio de portarias ou de alvarás. Precisam conter todos os requisitos apresentados, na qual a nossa realidade não se aplica normalmente as autorizações judiciais são de forma geral, e ter detalhamento de como deveriam ocorrer. Na verdade, nem sempre ele existe. Se os agentes responsáveis pelas aplicações e pelas fiscalizações das leis as aplicassem de forma eficiente, não existiria um mercado de trabalho ilegal operando livremente. Isso seria admirado pela sociedade, já que não se aventaria a idéia de que se está apoiando mais uma forma de exploração infantil. A consequência desse desconhecimento sobre como aplicar e fiscalizar as leis prejudica as fiscalizações, pois, a sociedade poderia ajudar a denunciá-las, quando equivocadas, ao Ministério Público que ficaria ciente das apresentações artísticas ilegais. Também, poderiam ocorrer manifestações contra as grandes empresas que apoiam e incentivam essa exploração dos menores. Assim, as crianças e os adolescentes poderiam se tornar adultos sem traumas, sem sequelas, sem prejuízos.

 

Porém, o que era para ser exceção é aplicado como regra em geral. Há abuso nas interpretações das normas e no preenchimento de lacunas, quando o assunto é trabalho artístico infantojuvenil.

 

Após a Emenda Constitucional 45/2004, a CF/1988 expandiu a competência da Justiça do Trabalho, em seu artigo 114, inciso I.

 

Art. 114. Compete à Justiça do Trabalho processar e julgar:

I -  as ações oriundas da relação de trabalho, abrangidos os entes de direito público externo e da administração pública direta e indireta da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios;

II -  as ações que envolvam exercício do direito de greve;

III -  as ações sobre representação sindical, entre sindicatos, entre sindicatos e trabalhadores, e entre sindicatos e empregadores;

IV -  os mandados de segurança, habeas corpus e habeas data, quando o ato questionado envolver matéria sujeita à sua jurisdição;

V -  os conflitos de competência entre órgãos com jurisdição trabalhista, ressalvado o disposto no art. 102, I, o;

VI -  as ações de indenização por dano moral ou patrimonial, decorrentes da relação de trabalho;

VII -  as ações relativas às penalidades administrativas impostas aos empregadores pelos órgãos de fiscalização das relações de trabalho;

VIII -  a execução, de ofício, das contribuições sociais previstas no art. 195, I, a, e II, e seus acréscimos legais, decorrentes das sentenças que proferir;

IX -  outras controvérsias decorrentes da relação de trabalho, na forma da lei. (BRASIL, 1988).

           

Sob o pálio desta ordem constitucional, desde 2005, defende-se que a autorização para o trabalho artístico infantojuvenil estaria sob a égide do Juiz do Trabalho, e não mais sob a do Juiz da Infância e Juventude (OLIVA, 2006, apud CORREA; ARRUDA; OLIVA, 2016, p.15). A Justiça do Trabalho está preparada e, definitivamente, integrou-se à luta, que é, e deve ser, de todos, contra o trabalho infantil. (CORREA; ARRUDA; OLIVA, 2016, p.16). Assim, é da competência absoluta da Justiça do Trabalho, hoje, tratar de todo tipo de relação de trabalho existente, mesmo que seja por um curto período de tempo.

 

De qualquer modo, o artigo 114, I, da CRFB, agora é de clareza solar: tratando-se de relações de trabalho (lato e não mais stricto sensu), compete à Justiça do Trabalho processar e julgar as ações que delas se originarem. A expressão relação de trabalho deve ser entendida como continente, do qual a relação de emprego é apenas conteúdo, ou seja, gênero que comporta múltiplas espécies, sendo a relação empregatícia só uma delas.

Portanto, qualquer regra infraconstitucional que outorgue ao juiz de direito a competência para permissões de trabalho não terá sido recepcionada pela nova redação do texto constitucional, até porque, se é o juiz do trabalho quem vai julgar as demandas decorrentes das relações de trabalho, não há o que justifique que as autorizações para o trabalho (que as precedem), sejam julgadas por juízes de direito (sem competência em matéria do trabalho). (CORREA; ARRUDA; OLIVA, 2016,

p.19)

           

O ordenamento jurídico brasileiro deve ser sempre interpretado conforme a Constituição Federal, a norma das normas, que possui força normativa e condiciona todas as legislações inferiores. Por isso, não se pode ir contra seus preceitos, porquanto existe uma hierarquia nas normas, no topo da qual a Carta Magna se encontra. Segundo Costa (2016, p.4), “a carta Maior funciona como parâmetro de validade para a legislação ordinária. Com a filtragem constitucional toda legislação deve ser lida conforme a Constituição Federal e não o contrário”.

           

Portanto, quando deparamos com os artigos 149 do ECA e o artigo 8 da convenção 138 da OIT, sua leitura deve ser feita à luz da Constituição, assim como a Justiça do trabalho deve ser entendida como a Justiça competente para julgar as autorizações judiciais que admitem o trabalho infantil, e não mais o Juízo Comum, o juiz da Vara da Infância e da Juventude. Além do mais, ao se lerem os demais artigos, não se encontra uma citação direta declinando a competência para o Juízo Comum. Os artigos, ao mencionarem o tema, apenas posicionam a autoridade judiciária em um e autoridade competente em outro.

           

É importante ressaltar que existe, atualmente, uma ação ajuizada pela Associação Nacional dos Magistrados do Trabalho (ANAMATRA), que tramita no Superior Tribunal Federal por meio Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) n° 361. A matéria tratada é justamente para discutir qual juízo é o competente para autorizar o trabalho artístico infantil. De acordo com a Anamatra, o ECA não atribuiu qualquer competência aos juízes da Infância e da Juventude, para darem autorização de trabalho, mas, apenas para dispor sobre participação em espetáculos públicos, ensaios e em concursos de beleza (BRASIL,2015). A Associação Nacional dos Magistrados do Trabalho sustenta que o artigo 149 do ECA não foi recepcionado pela Emenda Constitucional 45/2004, porque essa alteração constitucional torna a Justiça Trabalhista competente para julgar toda relação de trabalho existente, e não só a de emprego.(BRASIL,2015).

 

Segundo Feliciano, Oliva e Cavalcante, em sua obra Trabalho Infantil Artístico: compreensão pouca, proteção nada integral,

 

[...]diferenciar o trabalho infantil artístico das atuações artísticas diversas das de trabalho, a princípio, é fácil: basta imaginar situação idêntica substituindo-se o artista mirim por adulto na mesma atividade, e verificar se haveria ou não a configuração de trabalho. A diferenciação é importante porque determinará que, em se tratando de trabalho, competente para autorizar (ou não) tal participação será a Justiça do Trabalho, já que a EC 45/2004 ampliou a competência desse ramo especializado para decidir sobre qualquer ação oriunda de relação de trabalho, seja eventual, voluntário ou autônomo. Assim, sendo trabalho infantil artístico, cabe apresentar o pedido de alvará à Justiça do Trabalho, que solicitará o parecer do Ministério Público do Trabalho. (CAVALCANTE; FELICIANO; OLIVA,2017,p.11)

            

Assim sendo, não resta dúvida de que compete à Justiça do Trabalho julgar as referidas autorizações judiciais. Porém, ao aplicá-las, o juiz jamais deverá se esquecer detratá-las como exceção, devendo elas sempre conter, no mínimo, os requisitos presentes no ordenamento jurídico, conforme as normas discutidas neste trabalho. Devem sempre colocar os direitos fundamentas dos menores em primeiro lugar, garantindo a proteção integral e o princípio do melhor interesse do menor. E, sempre, há o juízo que se lembrar da regra de que é proibido o trabalho infantil artístico para menores.

 

6. CONCLUSÃO

            

Neste artigo, ao apresentar e discorrer o tema abordado, deixou-se patente a ilegalidade, do trabalho artístico infantojuvenil. Além disso, procurou-se conscientizar sobre a existência de abuso, tendo sido este aspecto abordado de forma consistente e extensiva, uma vez que a sociedade não reconhece o trabalho infantojuvenil como labor. Assim, justamente por essa razão, foram expostos os danos que essa forma de trabalho causou aos menores que tiveram uma parte de sua infância subtraída, passando a ter em seu lugar uma carga excessiva e pesada de responsabilidades, que gera estresse, amadurecimento precoce, perda de identidade, de valores, de saúde mental e tantos outros malefícios apontados.

           

Evidenciou-se que o trabalho em tela afeta diretamente os direitos resguardados aos menores pela Constituição, pelo estatuto da criança e do adolescente, além de abalar a concepção de poder familiar.

 

A criança e o adolescente devem ser protegidos e resguardados para poderem adquirir o discernimento necessário, ao serem encaminhados para o mercado de trabalho. As leis brasileiras são claras quanto ao direito ao ingresso do menor nas atividades laborais, quando legalmente aceito, o que não ocorre no ambiente artístico, que é considerado lesivo, em muitos aspectos, à individualidade, ao desenvolvimento e à identidade e à moralidade dos menores, segundo estudos desenvolvidos sobre a criança e o adolescente a Legislação citada e discutida neste artigo.

           

Concluindo, o trabalho artístico infantojuvenil só ocorre, porque a lei vem sendo interpretada de forma totalmente incongruente com a Constituição e com o ordenamento jurídico brasileiro. O que vem ocorrendo é a utilização de uma exceção à regra concedida em uma convenção da Organização Internacional do Trabalho, para interpretar, de forma inconstitucional, a aplicação, que deveria ser empregada, respeitando os dizeres das leis brasileiras, quanto à idade mínima permitida ao trabalho, e em se tratando apenas de pequenas participações, como a mesma lei e o ECA exigem: ser concedida a autorização apenas de forma excepcional para crianças menores de 14 anos, levando em conta que o meio artístico não condiz com o ambiente que uma criança deve frequentar.

           

Por isso, essas autorizações devem ser extremamente bem fundamentadas, devendo conter o horário em que devem acontecer, fixar limes de horas nas quais será permitido à criança frequentar esse ambiente, demonstrando todas as condições para que ocorra essa participação, devendo constar a descrição das instalações do ambiente laboral, resguardar que essa participação não interfira nos estudos, sendo esta uma condição de extrema importância, devendo constar todos os requisitos aludidos nas leis. Deveria ser oferecido um acompanhamento psicológico, para se ter o controle dos danos mentais e poder melhor fiscalizar a participação dos sujeitos, sanando-se, assim, qualquer indício de violação à integridade da criança e do adolescente.

           

Contudo, não se pode deixar de reiterar que a autoridade responsável pela relação de trabalho é a Justiça do Trabalho e não a Justiça Comum, para que, ao se interpretarem esses alvarás, que seja em conformidade com a CF/1988. Entende-se que os magistrados do trabalho são competentes para autorizar as autorizações judiciais para o trabalho dos menores, haja vista a necessidade de observância do sentido global e teleológico das normas tratadas na esfera trabalhista, das constitucionais às infraconstitucionais.

 

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2020