A PRÁTICA DO PROGRAMA DE COMPLIANCE NO ÂMBITO TRABALHISTA E SEU EFEITO NAS EMPRESAS SOB A PERSPECTIVA DA LEI Nº 12.846/2013

 

 

 

FLÁVIA FRANCISCA MORAES DA COSTA PINTO

Advogada, Bacharelado em Direito, Faculdade de Administração e Negócios de Sergipe, Aracaju – SE; Pós-Graduanda em Trabalho Previdenciário com Foco em Acidente de Trabalho, Master of Business Administration

 

ANA CLARA SANTOS BORGES DE BARROS

Graduanda do curso de Direito, Universidade Tiradentes, Aracaju – SE

 

 

 

Resumo: A corrupção tomou conta de grande parte das organizações empresariais no Brasil e no mundo, e a fim de resolver esse – e outros problemas existentes – entra em cena o Programa de Compliance. O objetivo do presente artigo é observar e expor de forma parcial os pontos positivos da implementação do Compliance nas empresas e que o motivo dessa adoção não é prejudicial para nenhuma das partes envolvidas. Foi realizada uma pesquisa bibliográfica, eletrônica e documental, e outras fontes como a Lei 12.846/2013. Verificou-se aqui a contribuição positiva do Compliance para uma relação harmoniosa e produtiva, além de fatores preventivos, ao evitar e/ou reduzir processos judiciais na esfera trabalhista.

 

 

Palavras-chave: Compliance; Corrupção; Prevenção de Riscos.

 

 

SUMÁRIO: 1. INTRODUÇÃO; 2. A PRÁTICA DA LEI 12.846/2013; 3. O PROGRAMA DE COMPLICANCE NAS EMPRESAS; 4. CONSIDERAÇÕES FINAIS; REFERÊNCIAS

 

 

 

1. INTRODUÇÃO:

           

Diante da nítida corrupção em diversos âmbitos que o brasileiro acompanha ao longo da história do país, entende-se a importância da aplicação de ferramentas que a amenizem, visto que se trata de um problema com grandes proporções, logo, de difícil extinção. Uma das ferramentas que pode ser citada, a qual é a principal referência do presente estudo, é a Lei 12.846/2013 (Lei Anticorrupção).

           

Este artigo tem como foco dissertar acerca da importância do exercício de um Programa de Compliance Trabalhista dentro das empresas - no âmbito laboral em geral - como medida eficaz no ato de compreender a natureza e a dinâmica da fraude e da corrupção nas organizações, como também assegurar o cumprimento de normas e procedimentos.

           

Nesse sentido, surge o Compliance - manter a empresa em conformidade com as leis - que serve como instrumento para a aplicação e efetividade das normas pré-estabelecidas. Além dessa finalidade, encontra-se presente também o fato do combate à corrupção, já que nos últimos anos as empresas no Brasil estiveram envolvidas em diversos escândalos, como pagamento de propina a servidores e órgãos públicos em troca de determinados benefícios.

           

Justifica-se o tema pelo fato de que a Lei Anticorrupção é relativamente nova, portanto acarreta na necessidade de discussão dentro do mundo jurídico, já que aborda a situação de pessoas jurídicas envolvidas em atos lesivos praticados contra a administração pública, regulação das relações de entidades públicas e privadas etc.

           

O tema aqui abordado está, ultimamente, sendo discutido de forma abrangente dentre grandes autores no ramo do Direito, como é o caso de Márcia Carla Pereira Ribeiro e Patrícia Dittrich Ferreira Diniz, com a obra "Compliance e Lei Anticorrupção nas Empresas", de 2015.                                             

           

Outrossim, a autora Luíza Naresi pode ser citada como uma grande referência para este artigo, cuja produção utilizada é a intitulada "A aplicabilidade do Compliance nas esferas contratuais: adequação dos programas de Compliance no cumprimento das normas legais", de 2019, justamente por ser uma obra recente e atualizada.

           

Anterior ao advento da Lei Anticorrupção existiam ferramentas que possibilitava a penalização a partir de infrações cometidas - sendo estas, de forma geral e genérica -, mas o que se discute é que a criação dessa lei forneceu uma tipificação mais específica das ações e as penalidades individuais com relação às multas que passaram a ocorrer.

           

A importância do presente estudo e sua discussão pode ser entendida pois a Lei 12.846/2013 trouxe autoridade ao governo, dá o poder de punir particularmente os delitos específicos, como também introduziu a responsabilização objetiva da pessoa jurídica pelos atos de corrupção. Ademais, é apreciável o fato de que essa lei especial é exclusivamente voltada para a prevenção, combate e repressão de atos corruptos, inclusive com a responsabilização da pessoa jurídica.

            

A metodologia se baseia no método indutivo, ou seja, a partir de casos particulares (ou simplesmente, dados) chega-se a uma conclusão. Este método observa o fenômeno, em específico, utiliza-se aqui Relatório Global de Fraude & Risco 2016/2017 da consultoria Kroll, que entrevistou 545 executivos de grandes empresas em todo o mundo, sendo mais de 50 no Brasil. Outro recurso utilizado para uma absorção maior do tema é a pesquisa bibliográfica, consistente na busca em livros, doutrinas, legislações, internet e dados estatísticos.

           

Por fim, propõe-se aqui uma interpretação e apresentação das características principais da aplicabilidade da Lei 12.846/2013 nas relações laborais e como o Programa de Compliance Trabalhista nas empresas brasileiras incentiva essa efetivação legislativa, visto que as normas impostas pela lei viabilizam a proteção dentro do ambiente de trabalho.

 

2. A PRÁTICA DA LEI 12.846/2013

           

A Lei 12.846/2013 discute e abarca, principalmente, acerca da regularização das relações públicas e privadas, o que foi de extrema importância para a população brasileira, considerando os escândalos na mídia envolvendo corrupções e afins, já que a referida Lei trouxe uma possível solução para esses problemas.

           

No sentido jurídico desta análise, percebe-se que o foco do estudo se encontra no fato que a responsabilização administrativa e civil, instituída pela Lei, é objetiva. Sendo a responsabilidade objetiva, não há o que se falar em ônus da prova, ou seja, será responsável independentemente de culpa propriamente dita e arcará com os possíveis danos.  

           

Entende-se que a prática da Lei Anticorrupção começa a partir dos seus requisitos impostos, como por exemplo, deve ter sido praticado uma conduta ilícita por parte da pessoa jurídica e ter acontecido um prejuízo ao poder público, nacional ou estrangeiro. Dito isso, explica-se que esses requisitos devem ser provados existentes, e não necessariamente a culpa, isto é, a prova consiste no dano causado por parte de alguém.

           

Como principal conteúdo da Lei, podemos citar: responsabilidade objetiva da pessoa jurídica em geral (livre de comprovação); responsabilidade subjetiva para administradores (já que a Lei incide seus efeitos na perspectiva da pessoa jurídica em si, e não sob os funcionários); ampliação do rol de condutas lesivas à Administração Pública nacional; estabelecimento do rito do processo administrativo de apuração da responsabilidade das pessoas jurídicas; Inclusão da Administração Pública estrangeira; Possibilidade de desconsideração da personalidade jurídica para o ressarcimento dos danos causados e para evitar a criação de novas pessoas jurídicas com o propósito de frustrar a aplicação das sanções; Procedimento específico para a quantificação do dano causado à Administração Pública.

           

A Lei se aplica a todas as empresas, não somente aos entes públicos, já que qualquer empresa precisa manter relações com os órgãos públicos para obter licenças, cumprir as responsabilidades fiscais etc. Dito isso, conclui-se que todas as empresas brasileiras estão submetidas a essa lei e passíveis de punição. A principal mudança que percebemos após a promulgação da lei é que, antes do advento deste, segundo Ribeiro (2015) a responsabilidade era apenas de quem fosse autor ou mandante de práticas lesivas à administração pública e as pessoas jurídicas não eram envolvidas. Atualmente, mesmo com a falta de autorização ou com o desconhecimento da ocorrência de atos ilícitos, a empresa será responsabilizada.

           

De um ponto de vista efetivo da Lei, é importante destacar que em 2004, por meio de iniciativa da Controladoria-Geral da União, o Governo Federal lançou o Portal da Transparência, que tinha como objetivo uma gestão pública mais transparente e sendo mais uma ferramenta de fiscalização da correta aplicação dos recursos públicos disponível ao cidadão.

           

Nesse contexto, surge a importância do Compliance, como caminhos redutivos de sanções, e dentre os diversos motivos, existe o fato de que a própria Lei prevê o atenuamento da pena caso comprovada existência e efetividade de medidas internas de Compliance, como mecanismos e procedimentos internos de integridade, auditoria e incentivo à denúncia de irregularidade, com também a aplicação efetiva de códigos de ética e de conduta.

 

3. O PROGRAMA DE COMPLICANCE NAS EMPRESAS

           

A priori, é importante salientar que o termo Compliance tem origem no verbo em inglês “to comply”, que significa “agir de acordo com uma regra, uma instrução interna ou um pedido”, e quando relacionado ao mundo corporativo – cem conformidade com o tema aqui discutido – diz respeito à relação harmônica existente entre uma empresa e as leis ou seu regimento interno. Manter a empresa em conformidade significa estar de acordo com leis e regulamentos externos e internos, de acordo com as atividades desenvolvidas pela empresa (LIRA, 2014).

           

Diante das necessidades encontradas pelas empresas, como por exemplo, adotar ferramentas precisas para a resolução e prevenção de problemas, surge o programa de Compliance, que se busca a proteção das empresas e de seus empregados por meio da criação de um Código de Conduta a ser estabelecido. Portanto, com o uso desse instituto pretende-se atingir um patamar de justiça dentro da empresa, por meio de fiscalizações em busca do benefício da coletividade.

           

Na definição de Wilde Cunha Colares:

 

Na verdade, quando se fala em compliance, está-se referindo aos sistemas de controle internos que servem para proporcionar maior segurança à empresa quanto às suas análises econômicofinanceiras, possibilitar uma atuação correta e adequada no meio em que atua, proteger contra os riscos de corrupção e fraudes em processos licitatórios ou demais delações com entidades governamentais, elaborar e atualizar normas internas que estejam em harmonia com a filosofia da companhia e garantir que sejam conhecidas e cumpridas por todos.

            

Uma forma de demonstrar como o Compliance seria executado é por meio da comunicação, a qual estabelecerá um código de conduta juntamente com os valores e princípios da empresa, veiculando seus objetivos e suas finalidades de forma clara, para que possam ser devidamente cumpridos e atingirem o objetivo estipulado.

           

Como medida governamental positiva e de forma a incentivar o programa de Compliance, podemos citar o Decreto de 18 de março de 2015 veio regulamentar a Lei Anticorrupção, Decreto nº 8.420/15: “Art. 1º Este Decreto regulamenta a responsabilização objetiva administrativa de pessoas jurídicas pela prática de atos contra a administração pública, nacional ou estrangeira, de que trata a Lei nº 12.846, de 1º de agosto de 2013.” (BRASIL, 2015).

           

Esse Decreto estabelece que as empresas, ao implementarem um programa de Compliance, estabeleçam códigos de conduta ética e políticas de integridade, que devem ser aplicados a todos os integrantes da empresa independentemente do cargo exercido. Sendo assim, as organizações se tornaram as principais responsáveis por evitar, controlar e punir os atos antiéticos e de corrupção internamente, ressaltando a importância dos profissionais de Compliance, responsáveis por zelar o compromisso de conformidade às leis e à ética. Nesse contexto, faz-se necessário o conhecimento a fundo da Lei Anticorrupção e seu Decreto Regulador.

           

O Decreto nº 8.420/15 define os mecanismos e procedimentos de integridade, auditoria, aplicação de códigos de ética e conduta e incentivos de denúncia de irregularidades que devem ser adotados pela empresa e monitorados pela Controladoria-Geral da União. Este Decreto contribuiu para a visibilidade e notoriedade do programa de Compliance no mundo jurídico, visto que por muitas vezes é visto como dispensável, com o argumento de que as normas são facilmente aplicadas e exercidas, cuja justificativa é falha e as notícias e dados estatísticos mostram isso.

           

Segundo enfatiza Coimbra (2010, p.6):

 

O compliance constitui a base para o estabelecimento de uma cultura ética na empresa, cultura esta imprescindível à prevenção e redução de fraudes, que representam perdas financeiras para as organizações. Com efeito, uma organização 343 que seja ética e que faça a difusão de uma cultura pautada na ética, por meio de um programa de compliance, tem menos problemas com fraudes. A cultura organizacional ligada à ética exerce uma clara influência sobre a integralidade dos funcionários. Assim, quanto mais profunda a cultura de integridade organizacional, menor a incidência de fraudes e outros comportamentos que representam desvios de recursos.

            

O Compliance trabalhista, em específico, envolve a construção de medidas a serem tomadas no que tange ao controle interno da organização, bem como relacionadas a, segundo ANDRADE; FERREIRA (2017), “mão de obra (empregados, terceirizados e terceiros em geral), como fim de prevenção de descumprimentos de normas trabalhistas (civis e penais)”. Dito isso, entende-se que esse mecanismo pode ser utilizado para diminuir problemas recorrentes na esfera laboral, como por exemplo, prática de assédio moral e sexual (cujo problema se alastra em diversos ambientes da sociedade atualmente) ou questões relativas à segurança e saúde do trabalhador.

           

É importante frisar que o Compliance Trabalhista não tem um manual ou traçar um roteiro a ser aplicado, e sim o que existe é uma adaptação das normas da determinada empresa a ser aplicada o problema aos valores éticos que mais comportem suas particularidades.

           

Destarte, constata-se que o programa de Compliance trabalhista “modelo” deve criar dispositivos para a uniformização e o controle de condutas tanto por parte do empregador quanto dos trabalhadores, possibilitando um ambiente de trabalho dinâmico e aliado não só com a legislação trabalhista, mas com os princípios de Direito como um todo, para que não se perca a essência do Direito do Trabalho.

 

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS       

           

Diante do exposto, entendemos que o Compliance age a fim de atingir o autocontrole (da empresa), logo, a finalidade principal desse programa é fazer uma gestão dos riscos da atividade desenvolvida pelas companhias, que são drasticamente diminuídos quando se aplica efetivamente a legislação do país, além de preceitos éticos e as regras internas da empresa.

           

Apostando nesse programa de Compliance a ser adotado, este estudo apresentou como objetivo, além de expor a importância de uma política ética a ser adquirida, o fato de que este Programa tem relação direta com a esfera empresarial, e por isso, deve ser implementada e seguida à risca.

           

Como fonte de respostas das principais dúvidas acerca do tema, utilizou-se aqui, através de pesquisa bibliográfica, noções principais e gerais do Programa de Compliance, a Lei 12.846/2013 (Lei Anticorrupção) e o Decreto que a regulamenta.

           

A adoção do Programa por uma empresa é uma forma de prevenção que irá reduzir prejuízos futuros, o que é um ponto positivo para a própria companhia. Por oferecer diversas ferramentas, como relatórios, avaliações de desempenho e gestão de pessoas, regimentos internos e códigos de éticas, aplicação das leis e outras, o Compliance proporciona uma forma harmônica de trabalhar e de se relacionar, mantendo o equilíbrio entre os componentes ali inseridos e contribuindo para o êxito financeiro de uma organização.

           

Por fim, enfatiza-se aqui o reconhecimento por parte das organizações de implementar programas de Compliance que visa a manutenção da saúde da empresa, por demonstrar o favorecimento em diversos âmbitos para todos os funcionários independentemente do cargo exercido.

 

REFERÊNCIAS:

 

ANDRADE, Flávio Carvalho Monteiro de; FERREIRA, Isadora Costa. Compliance trabalhista: Compreendendo a Prevenção de Risco trabalhista por Meio de Programa de Integridade. Revista Síntese Trabalhista e Previdenciária, nº 331, janeiro, 2017.

 

BRASIL. Lei 12.846/2013. Dispõe sobre a responsabilização administrativa e civil de pessoas jurídicas pela prática de atos contra a administração pública, nacional ou estrangeira, e dá outras providências. ≤http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2013/Lei/l12846. htm≥, acesso em 2 jan. 2020

 

BRASIL. Decreto 8.420/2015. Regulamenta a Lei no 12.846, de 1o de agosto de 2013, que dispõe sobre a responsabilização administrativa de pessoas jurídicas pela prática de atos contra a administração pública, nacional ou estrangeira e dá outras providências. ≤http://www.planalto. gov.br/ccivil_03/_Ato2015-2018/2015/Decreto/D8420.htm≥, acesso em 2 jan. 2020.

 

BRASIL. Controladoria Geral da União. Programa de Integridade – Diretrizes para empresas privadas. ≤http://www.cgu.gov.br/Publicacoes/etica-e-integridade/arquivos/programa-de-integridade-diretrizes-para-empresas-privadas.pdf≥

 

COIMBRA, M.A; MANZI, V.A. Manual de Compliance. São Paulo: Atlas, 2010

 

COLARES, Wilde Cunha. Ética e compliance nas empresas de outsourcing. Insper Instituto de Ensino e Pesquisa: São Paulo, 2014.

 

LIRA, Michael. O que é Compliance e como o profissional da área deve atuar? 2014. https://michaellira.jusbrasil.com.br/

artigos/112396364/o-que-ecompliance-e-como-o-profissional-da-area-deve-atuar. 

 

NARESI, Luíza. A aplicabilidade do Compliance nas esferas contratuais: adequação dos programas de Compliance no cumprimento dasnormas legais. 2019. https://www.migalhas.com.br/dePeso/16,

MI310203,11049- A+aplicabilidade+do+compliance+

nas+esferas+contratuais.

 

RIBEIRO, Carlos Augusto. Lei Anticorrupção e Compliance. 2015. https://ribeirocarlosdv.jusbrasil.com.br

/artigos/183853425/lei-anticorrupcao-ecompliance. 

 

RIBEIRO, Marcia Carla Pereira; DINIZ, Patrícia Dittrich Ferreira. Compliance e Lei Anticorrupçãonas

Empresas. 2015. https://www12.senado.leg.br/ril/

edicoes/52/205/ril_v52_n205_p87.pdf. 

 

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2020