DISPENSA COLETIVA E O DIREITO FUNDAMENTAL À GREVE: UM CASE ESPANHOL COMO PARADIGMA AO DIREITO COMPARADO

 

 

 

DENISE PIRES FINCATO

Advogada trabalhista. Doutora em Direito (Burgos-Espanha) e Mestre em Direito (Unisinos). Professora Pesquisadora no PPGD – PUCRS. Coordenadora do Grupo de Pesquisas Novas Tecnologias: Processo e Relações de Trabalho, vinculado ao PPGD da PUCRS e ao CNPq.

 

VINÍCIUS JOSÉ ROCKENBACH PORTELA

Advogado. Mestrando em Direito pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS). Graduado em Direito pela Universidade Federal do Rio Grande (FURG). Pesquisador integrante do grupo de pesquisa Novas Tecnologias: Processo e Relações de Trabalho vinculado ao Programa de Pós-Graduação em Direito (PPGD) da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS) e ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).

 

 

 

 

SUMÀRIO: Introdução. 1 O caso. 2 A sentença da Câmara Social da Audiência Nacional. 3 A decisão da Câmara Social do Tribunal Supremo da Espanha. 4 A análise. Considerações Finais. Referências Bibliográficas.

 

 

Resumo

Em recente e inédita decisão, o Tribunal Supremo da Espanha declarou a nulidade da dispensa coletiva de trabalhadores da Coca Cola Iberian Partners S/A, sob o argumento de que a conduta da empresa, durante o período de negociação coletiva, teria maculado o direito fundamental à greve previsto na Constituição espanhola. O artigo comenta o referido caso, a fim de apurar o acerto ou não do acórdão, mediante a análise dos fatos e dos fundamentos que serviram de base para a tomada da decisão, concluindo que firma o reconhecimento do direito fundamental à greve na ordem jurídica espanhola, devendo servir de paradigma para casos semelhantes no Brasil.

 

 

Palavras chaves: Direito de greve. Dispensa coletiva. Direitos fundamentais. Direitos sociais. Direito do Trabalho.

 

 

 

 

INTRODUÇÃO

Quando se fala em proteção dos direitos dos trabalhadores e sua luta por melhorias nas condições de trabalho, poucas estratégias podem contribuir mais a seu alcance quanto a greve, instituto do direito coletivo do trabalho, reconhecido como direito fundamental na maioria das Constituições promulgadas após a Segunda Grande Guerra Mundial.

 

A greve é, sem sombra de dúvidas, um dos institutos mais estudados por aqueles que se dedicam ao direito coletivo do trabalho, desde os seus primórdios até os dias de hoje, por ser um direito social essencial à ordem jurídica contemporânea.

 

Assim como a greve, outro instituto do direito coletivo do trabalho que tem repercutido no cenário laboral-empresarial com maior frequência nos últimos anos, especialmente em razão da conjuntura socioeconômica atual é a dispensa coletiva; geradora de preocupação para todos aqueles que atuam na área jurídico-trabalhista ou que de alguma forma tem contato com ela, na medida em que as transformações sociais e econômicas decorrentes da globalização e das inovações tecnológicas, têm determinado reestruturações organizacionais que muitas vezes culminam com o deslocamento da mão de obra[1], extinção de setores empresariais ou até o fechamento completo de empresas, tendo por corolário, a consequente dispensa em massa de trabalhadores.

 

O problema ganha contornos de maior complexidade quando conjuga-se o fenômeno da dispensa coletiva com o direito fundamental à greve, em evidente e atual colisão.

 

Quando isso ocorre, há um verdadeiro conflito normativo que determina a compreensão de diversos fatos, regras e valores para que seja possível encontrar uma solução jurídica para o problema em questão.

 

Nesse sentido, em recente decisão, o Tribunal Supremo da Espanha, ao julgar um caso envolvendo a Coca Cola Iberian Partners S/A (CCIP), reconheceu a violação do direito fundamental à greve por parte dessa empresa, anulando a dispensa coletiva de 821 (oitocentos e vinte um) trabalhadores, determinando a imediata reintegração desses, bem como o pagamento dos salários desde a data da dispensa. Obviamente, essa decisão teve grande repercussão na Espanha e chama a atenção para fins de estudo.

 

Por conseguinte, o presente artigo tem como escopo comentar o referido caso, a fim de se apurar acertos ou desajustes no julgado, mediante a análise dos fatos e dos fundamentos que serviram de base para a tomada da decisão.

 

Para alcançar esse objetivo, primeiramente será apresentado o caso com a narrativa dos eventos essenciais que culminaram com a dispensa em massa dos trabalhadores da Coca Cola Iberian Partners S/A.

 

Posteriormente, se fará um breve resumo a respeito das decisões sobre o caso, em primeiro e segundo grau de jurisdição, proferidas, respectivamente, pela “Sala de lo Social de la Audiencia Nacional” e pela “Sala de lo Social del Tribunal Supremo”, expondo-se os fundamentos que levaram a anulação da dispensa coletiva em questão.

 

Em um terceiro momento, pretende-se analisar o caso, a decisão da Audiencia Nacional e, principalmente, a decisão do Tribunal Supremo, tecendo-se considerações a respeito dos dois institutos do direito coletivo do trabalho que permeiam a questão, realizando-se, por fim, considerações finais a respeito do caso, com uma conclusão que aponte acertos ou equívocos na decisão do Tribunal Supremo.

 

 

1 O CASO

 

As sociedades modernas estão em permanente evolução, sofrendo significativas transformações que se perfectibilizam através das alterações sociais e econômicas, bem como por meio das inovações tecnológicas1 que, por sua vez, causam consideráveis impactos no sistema produtivo e no consumo.

 

As transformações vivenciadas nos últimos tempos, aliadas ao fenômeno da globalização econômica, fazem com que as organizações empresariais reajam às mudanças, adaptando-se a elas para sua própria manutenção e sobrevivência.

 

Uma das consequências desses eventos foi a série de reestruturações organizacionais que se desencadearam por todo mundo, atingindo, inclusive, diversas empresas europeias que, ao promoverem suas reorganizações societárias, contribuíram para o fechamento de diversas fábricas na Europa e, por corolário, com a consequente dispensa coletiva de trabalhadores.

 

Empresas europeias de distribuição e engarrafamento de bebidas, situadas em países como a Alemanha e Itália, por exemplo, ao perceberem essas mudanças e o acirramento do mercado, logo promoveram reformulações societárias e revisaram seus métodos produtivos, objetivando a redução dos custos operacionais e administrativos, bem como o aumento do capital.

 

Nessa senda, algumas empresas engarrafadoras da Península Ibérica, buscando se adequar às novas exigências do mercado e do capital, firmaram, em 2012, um contrato de integração, com o objetivo de operar uma fusão societária entre elas, originando uma única empresa engarrafadora ibérica – inicialmente denominada Sociedad Ibérica de Bebidas No Alcohólicas S/A, passando, posteriormente, a chamar-se Coca Cola Iberian Partners S/A (CCIP) – que passou a ter o direito de produzir, engarrafar, distribuir e comercializar, com exclusividade, os produtos das marcas de propriedade de The Coca-Cola Company em Espanha, Portugal e Andorra.

 

Essa operação societária demandou, ao longo do ano de 2013, a reestruturação das empresas envolvidas, a fim de centralizar diversos setores de sua produção, administração e gestão, ocasionando, desse modo, o fechamento de algumas unidades que até então estavam em pleno funcionamento.

 

Para embasar essa conduta, a Coca-Cola Iberian Partners solicitou a uma empresa de consultoria um estudo sobre a situação de sua produção e necessidades de reorganização, cujas conclusões – apresentadas em relatório técnico – apontaram que a dispensa coletiva de trabalhadores ensejaria uma economia de € 26.000.000,00, a qual, somada a outras propostas de restruturação denominadas de “modelo circular”, fundamentariam, posteriormente, uma série de atos que culminariam com a dispensa coletiva de trabalhadores.

 

Nesse contexto, em janeiro de 2014, o diretor de relações trabalhistas da Coca-Cola Iberian Partners, enviou uma carta aos representantes legais dos funcionários e aos delegados sindicais, informando que a empresa iniciaria um processo de despedimento coletivo e mobilidade geográfica, além de modificações substanciais das condições de trabalho.

 

Por conta disso, os sindicatos dos trabalhadores tiveram de formar as comissões de negociação para o chamado “período de consultas”, a fim de se discutir as causas ensejadoras da decisão empresarial e as possíveis medidas que pudessem reduzir os efeitos e atenuassem as consequências para os trabalhadores afetados, nos termos do artigo 41.4 da Lei do Estatuto dos Trabalhadores da Espanha2.

 

No mesmo mês, iniciou-se o período de consultas a repeito da dispensa coletiva, com a convocação da primeira reunião, quando houve a comunicação pela Coca Cola Iberian Partners - CCIP de que os motivos das dispensas seriam as reestruturações organizacionais e produtivas que estavam sendo implementadas, bem como que poderiam ser dispensados 1.253 (mil, duzentos e cinquenta e três)3 trabalhadores até o final do ano de 2014.

 

Entre os meses de janeiro e fevereiro desse mesmo ano, ocorreram as reuniões relativas ao período de consulta, nas quais os sindicatos se opuseram às dispensas coletivas, alegando, em síntese, a desproporcionalidade do ato, a ausência de justificativas para as dispensas em massa e, também, a irregularidade nas contas apresentadas pela CCIP, já que haviam indícios de que uma das unidades fechadas possuía boa situação no mercado e rentabilidade. Sustentou-se, ainda, por parte dos reapresentantes dos trabalhadores, que a dispensa coletiva não podia se dar em nível de grupo empresarial, mas sim – e tão somente – por unidade empresarial individualizada.

 

Paralelo ao período de consultas, a CCIP deu início ao encerramento das atividades nas fábricas de Fuenlabrada, Astúrias, Alicante e Palma de Maiorca, cujos trabalhadores entraram em greve protestando contra a dispensa coletiva e o fechamento das fábricas.

 

A greve dos trabalhadores da fábrica de Fuenlabrada iniciou em 31 de janeiro de 2014 e se estendeu por todo o período de consultas e de dispensas coletivas, o que acarretou a diminuição da produção e, por consequência, a falta de abastecimento de produtos nos mercados daquele município, fazendo com que a CCIP substituísse a produção que deveria ser realizada na fábrica de Fuenlabrada – e que só não estava ocorrendo por conta do movimento paredista – pela produção de outras unidades engarrafadoras do Grupo, a fim de suprir o abastecimento do comércio local.

 

Essa conduta foi investigada pelas autoridades administrativas do trabalho da Espanha, que a consideraram contrária ao direito fundamental de greve, constituindo infração administrativa, pelo que foram lavradas autuações e aplicadas sanções administrativas à CCIP.

 

No dia 21 de fevereiro de 2014 foi realizada a sexta e última reunião, em que os sindicatos mantiveram as suas contrariedades ao fechamento das fábricas, razão pela qual restou impossibilitada a autocomposição, encerrando-se o período de consultas sem que houvesse um acordo entre as partes.

 

Finalizado esse período, a CCIP comunicou no dia 27 de fevereiro de 2014 à Direção-Geral do Ministério do Emprego e da Seguridade Social espanhol, por meio do Expediente de regulación de empleo (ERE)5, que realizaria a dispensa coletiva de 1.190 (mil cento e noventa) trabalhadores, pelas mesmas causas de reorganização estrutural e produtiva que haviam sido expostas no início do período de consultas.

 

Teve início, então, o período das demissões voluntárias, quando foram procedidas 262 (duzentas e sessenta e duas) rescisões indenizadas, 323 (trezentas e vinte e três) aposentadorias antecipadas e 327 (trezentas e vinte e sete) transferências de trabalhadores.

 

Encerrado esse período, as empresas do Grupo selecionaram6 236 (duzentos e trinta e seis) trabalhadores das unidades de Fuenlabrada, Asturias, Alicante e Palma de Mallorca, que não haviam se voluntariado anteriormente a pedir demissão, enviando as cartas de dispensa diretamente a cada empregado e também a seus representantes sindicais.

 

Entre os empregados despedidos estavam 10 (dez) membros do comitê de negociação e 1 (um) delegado sindical, os quais não concordavam com as despedidas. Além disso, a execução de demissões levou ao encerramento das atividades nas fábricas de Fuenlabrada, Astúrias, Alicante e Palma de Maiorca.

 

Inconformada com todo o ocorrido, no dia 25 de março de 2014, a Federacion de Industria y Trabajadores Agrarios de la Unión General de Trabajadores (UGT), ingressou em juízo, perante a Audiencia Nacional7, contra a Coca Cola Iberian Partners e as empresas integrantes desse grupo econômico.

 

No mesmo dia, a Federación Agroalimentaria de Comisiones Obreras (CCOO) também ajuizou ação contra as mesmas demandadas, postulando a nulidade da dispensa coletiva.

 

No dia 27 de março foi a vez da Central Sindical Independiente y de Funcionarios (CSIF) apresentar demanda contra as mesmas empresas, impugnando a mesma despedida coletiva.

 

Em síntese, nessas ações os sindicatos postulavam a declaração de nulidade da dispensa coletiva, sob diversos argumentos, dentre os quais se destaca a ofensa a direitos de ordem constitucional, como, por exemplo, o direito fundamental à greve.

 

Em 1º de abril de 2014, foi determinado o processamento em conjunto dessas três demandas, bem como foi designada audiência de conciliação, instrução e julgamento.

 

No dia e hora marcados, atestou-se impossível a conciliação, sendo produzidas as provas necessárias e, posteriormente, foi proferido o julgamento pela Sala de lo Social de la Audiencia Nacional, acerca do qual tecem-se comentários a seguir.

 

 

2 A SENTENÇA DA CÂMARA SOCIAL DA AUDIÊNCIA NACIONAL

 

A Câmara Social da Audiência Nacional, ao julgar os processos movidos pelas entidades sindicais contra a Coca Cola Iberian Partners e as empresas integrantes desse grupo econômico, decidiu – julgando parcialmente procedente as ações – declarar a nulidade da dispensa coletiva e determinar a reintegração dos trabalhadores irregularmente dispensados a seus postos de trabalho, condenando solidariamente as empresas demandadas à imediata readmissão de seus respectivos trabalhadores despedidos, com o pagamento dos salários desde a data da dispensa.

 

A decisão unânime teve como fundamento três motivos distintos (dos onze motivos levantados pelas entidades sindicais nas petições iniciais):

 

1. A empresa não agiu com boa fé na negociação das dispensas coletivas;

 

2. A empresa não entregou aos trabalhadores um plano detalhado sobre a reestruturação produtiva, indispensável para o processo de negociação e para que se pudesse evitar a dispensa coletiva; e

 

3. A empresa praticou, durante o período de consultas, a substituição da produção dos trabalhadores que estavam em greve, o que é vedado pelo ordenamento jurídico espanhol, por afrontar o direito fundamental à greve.

 

O primeiro, na ordem estabelecida pela própria sentença, afasta a reorganização e a criação do grupo econômico como motivo suficiente a iniciar as despedidas coletivas. Para o Tribunal, a formação do grupo econômico é apenas uma causa virtual para a dispensa coletiva, na medida em que os trabalhadores foram dispensados pelas suas empregadoras originais e não pela CCIP, bem como porque eles sequer sabiam que seu empregador havia mudado e que agora faziam parte de uma empresa de maior porte. A ausência de informação aos trabalhadores durante o período de consultas, no entendimento do Tribunal, foi de má-fé e suficiente para afastar a reorganização estrutural e produtiva como motivo hábil a justificar a dispensa coletiva dos trabalhadores.

 

O segundo fundamento diz respeito ao descumprimento da obrigação, por parte da empresa, de informar os trabalhadores e seus representantes legais, sobre as alterações societárias promovidas, principalmente porque quando o período de consultas se iniciou, as informações e documentos a respeito estavam incompletos. Para os julgadores, esse fato repercutiu diretamente na dispensa coletiva, porque prejudicou a negociação a respeito da reestruturação que havia sido planejada pela empresa e que foi o fundamento principal para a dispensa coletiva.

 

O terceiro e último fundamento para o acolhimento do pedido de nulidade  da dispensa coletiva foi a violação do direito de greve, tendo em vista o comportamento da CCIP que, a fim de diminuir os impactos da greve dos trabalhadores do centro de Fuenlabrada, modificou as rotas de distribuição dos produtos fabricados em várias outras fábricas para fornecer produtos para a plataforma de Fuenlabrada, permitindo a cobertura do abastecimento do mercado de varejo daquela região, o que neutralizava os efeitos maléficos da greve para a empresa. Tal comportamento foi considerado ilícito.

 

Inconformada com a sentença proferida, a Coca Cola Iberian Partners interpôs recurso de cassação perante o pleno da Câmara Social do Tribunal Supremo da Espanha, a qual se relatará em sequência.

 

 

3 A DECISÃO DA CÂMARA SOCIAL DO TRIBUNAL SUPREMO DA ESPANHA

 

No dia 15 de abril de 2015, o Pleno de la Sala de lo Social del Tribunal Supremo, analisando o recurso de cassação interposto contra a sentença proferida pela Sala de lo Social de la Audiencia Nacional, decidiu, por unanimidade, confirmar a nulidade da dispensa coletiva do Grupo Coca-Cola, por restar constatada vulneração ao direito de greve, pelo que entendeu também não se fazer necessária a análise das demais questões suscitadas.

 

O Tribunal entendeu, em síntese, que durante a greve convocada contra as dispensas ocorridas por parte do encerramento da fábrica de Fuenlabrada, a empresa agiu ilicitamente ao substituir a produção dessa unidade pela de outros engarrafadores do Grupo, prejudicando, assim, o bom desenrolar da negociação coletiva durante o período de consultas.

 

Por essa razão, foi julgado improcedente o recurso de cassação interposto, tendo a decisão eficácia executiva imediata.

 

 

4 DA ANÁLISE

 

No caso em apreço há dois importantes institutos conhecidos da seara laboral postos como pilares na decisão em comento: 1. Dispensa coletiva; 2. Direito fundamental à greve.

 

A dispensa coletiva se caracteriza pela rescisão simultânea de uma pluralidade de contratos de trabalho em uma determinada empresa, sem que haja a substituição dos empregados dispensados9. Suas principais causas são calcadas em reorganizações estruturais, na economia e na revolução tecnológica ora vivenciadas, o que de certo modo contribui para o aumento das ocorrências nos últimos anos. Ou seja, a causa da dispensa coletiva não é única e exclusiva, mas sim comum a todos os trabalhadores dispensados, “não se prendendo ao comportamento de nenhum deles, mas a uma necessidade da empresa”10.

 

Os impactos das dispensas coletivas na sociedade e na economia são, por óbvio, superiores àqueles decorrentes das dispensas individuais. Enquanto nesse tipo de dispensa os efeitos se limitam normalmente apenas ao indivíduo, naquele, o ato potestativo do empregador repercute em uma coletividade, seja ela uma pequena comunidade, seja ela uma grande sociedade.

 

Isso porque

 

[…] o desemprego não interessa à sociedade como um todo. Causa o desemprego impacto negativo de múltiplas dimensões (econômicas, sociais, psicológicas, etc.) sobre a pessoa do trabalhador atingido; porém, contamina, na mesma profundidade, o âmbito comunitário que cerca o desempregado, em especial a sua família. Tratando-se de desemprego maciço, o impacto atinge toda a sociedade, com a desestruturação do sistema de convivência interindividual e comunitária e o agravamento das demandas sobre o sistema estatal de seguridade e previdência sociais. A par disso, o desemprego acentua a diferenciação social, alargando a chaga da exclusão de pessoas e grupos sociais, que tanto conspira contra a Democracia. Mais ainda, esse fenômeno acaba por colocar todo o sistema econômico em perigosa antítese ao papel social que a ordem jurídica determina seja exercitada pela propriedade11.

 

 

É importantíssimo, portanto, estabelecer as diferenças entre os dois tipos de dispensas, uma vez que as causas e os danos decorrentes são completamente distintos, de modo que cada caso demanda uma regulamentação jurídica específica, dadas as suas características próprias.

 

Nesse sentido, as disposições constitucionais que determinam o respeito à dignidade do ser humano, a valorização do trabalho e a intervenção sindical nas questões coletivas trabalhistas, impõem “que se reconheça a distinção normativa entre as dispensas meramente tópicas e individuais e as dispensas massivas12, coletivas, as quais são social, econômica, familiar e comunitariamente impactantes”13.

 

Entende-se que a dispensa individual pode ser, em suma, indireta, sem justa causa, arbitrária ou com justa causa, enquanto a dispensa coletiva pode ter natureza “arbitrária ou não, dependendo da existência comprovada de fato objetivo relacionado à empresa, causado por motivo de ordem econômico-conjuntural ou técnico-estrutural”14. O alvo da dispensa individual é um trabalhador determinado, enquanto na dispensa coletiva o empregador não visa pessoas concretas, mas, sim, um grupo de trabalhadores identificáveis apenas por traços não pessoais15.

 

A finalidade do empregador ao cometer a dispensa coletiva não é abrir vagas ou diminuir, por certo tempo, o número dos empregados. Seu desígnio é, ao contrário, reduzir definitivamente o quadro de pessoal. Os empregados dispensados não são substituídos, ou porque se tornaram desnecessários ou porque não tem a empresa condições de conservá-los16.

 

 

Desse modo, é inegável que as dispensas coletivas devem ter um tratamento diferenciado pelo ordenamento jurídico, inclusive pelo brasileiro em que há essa lacuna a ser preenchida17, ante a ausência de regulamentação legal da dispensa coletiva em nosso país18.

 

Na Espanha, a dispensa coletiva está expressamente regulada no artigo 51 da Lei do Estatuto dos Trabalhadores, sendo reconhecida como causa de extinção do contrato de trabalho (art. 49.9 do mesmo Estatuto). Não só: há previsão legal de que as empresas que visam proceder a dispensa coletiva devem negociar antes, em conjunto com as entidades sindicais dos trabalhadores, uma série de medidas que possam reduzir os efeitos e atenuar as consequências para os trabalhadores afetados (art. 41.4 do Estatuto de los Trabajadores).

 

Isto é, o ordenamento jurídico espanhol – diferentemente do brasileiro – protege os trabalhadores contra atos arbitrários do empregador que levem a dispensa de uma coletividade de empregados.

 

Isso não quer dizer que na Espanha não ocorram despedidas em massa. Elas continuam ocorrendo, até porque a lei espanhola não proíbe a dispensa coletiva, mas, sim, defende a negociação coletiva prévia e estabelece: primeiro, a implementação de medidas que possam reduzir o número de empregados dispensados; segundo, uma série de requisitos a serem cumpridos para que se possa auferir legitimidade à dispensa coletiva. E se não fosse suficiente, dispõe, ainda, sobre mecanismos que visem atenuar os impactos da rescisão na vida do empregado, como, por exemplo, indenizações pecuniárias diversas das atribuídas as dispensas individuais comuns (mesmo que plúrimas).

 

Regramento semelhante encontra-se no ordenamento jurídico de Portugal, país que é abrangido pela Coca Cola Iberian Partners e que também regulamenta a dispensa coletiva nos artigos 359 a 366 do seu Código do Trabalho. Lá a dispensa coletiva é considerada como

 

[…] a cessação de contratos de trabalho promovida pelo empregador e operada simultânea ou sucessivamente no período de três meses, abrangendo, pelo menos, dois ou cinco trabalhadores, conforme se trate, respectivamente, de microempresa ou de pequena empresa, por um lado, ou de média ou grande empresa, por outro, sempre que aquela ocorrência se fundamente em encerramento de uma ou várias secções ou estrutura equivalente ou redução do número de trabalhadores determinada por motivos de mercado, estruturais ou tecnológicos19.

 

 

Na Espanha a dispensa coletiva é conceituada como a extinção dos contratos de trabalho fundada em causas econômicas, técnicas, organizativas ou de produção, quando, em um período de 90 (noventa) dias, a extensão afete ao menos: a) 10 (dez) trabalhadores nas empresas que possuam menos de 100 (cem) trabalhadores; b) 10% (dez por cento) do número de trabalhadores das empresas que possuam entre 100 (cem) e 300 (trezentos) empregados; e c) 30 (trinta) trabalhadores nas empresas que possuam mais de 300 (trezentos) empregados (art. 51 do Estatuto dos Trabalhadores).

 

Essas definições demonstram o comprometimento do legislador juslaboral espanhol com a identificação do problema e a proteção do trabalhador, de modo a reduzir significativamente a incidência de casos de dispensa coletiva, sem no entanto impedi-la por completo (eis que, por vezes, efetivamente necessária), especialmente se comparados com países em que não há lei que regule esse fenômeno, como, por exemplo, o já mencionado caso do Brasil.

 

Posto isso, pode-se dizer que o direito de greve, por sua vez, é o segundo instituto de suma importância que é tratado na decisão em análise.

 

Naturalmente, não existe uma definição legal para greve20. Pelo contrário, vastos são os conceitos elaborados pela doutrina, sendo que a greve é concebida por alguns como a “cesacíon colectiva y concertada del trabajo, por parte de los trabajadores, con el objeto de obtener determinadas condiciones de sus patronos o ejercer presión sobre los mismos21. Ou

 

É a principal forma de conflito, choque ou luta entre os dois elementos ou forças essenciais à produção: trabalho e capital. Entre aqueles que possuem força-trabalho – quase sempre, somente – e os que, possuindo capital, daquela necessitam para dinamizá-lo e multiplicá-lo22.

 

 

É movimento de massa. Um instrumento coletivo23 de pressão utilizado para o alcance de melhorias nas condições de trabalho e de defesa dos interesses dos trabalhadores, em geral, de natureza econômico profissional ou contratual trabalhista24.

 

Para Ernesto Krotoschin, a greve pode ser definida como

 

[…] la interrupción colectiva y concertada del trabajo por un grupo de trabajadores, con el fin inmediato de paralizar o perturbar el normal funcionamiento de una o varias empresas, ejerciendo así presión sobre la parte patronal o sobre terceros25.

 

É, sem dúvida, um movimento de luta por excelência, que se caracteriza pelo abandono do posto de trabalho por uma pluralidade de trabalhadores que possuem um determinado objetivo em face de seu empregador ou do Estado26.

 

A greve, em outras palavras, é uma

 

[…] paralisação coletiva provisória, parcial ou total, das atividades dos trabalhadores, em face de seus empregadores ou tomadores de serviços, com objetivo de exerce-lhes pressão, visando a defesa ou conquista de interesses coletivos, com objetivos sociais mais amplos27.

 

Sua origem tem espeque na incapacidade do Estado de compor os conflitos entre capital e trabalho28. As péssimas condições a que eram submetidos os trabalhadores nos primórdios das organizações industriais – fim do século XVIII e início do século XIX – clamavam por um controle que não vinha do Estado, o qual permanecia inerte ante a crescente e incontrolável exploração do trabalho humano29.

 

O aumento das injustiças sociais decorrentes das degradantes condições de trabalho, como, por exemplo, as longas jornadas e os ínfimos salários, resultou na eclosão das forças da classe trabalhadora, como uma ímpeta reação das massas operárias30 contra a utilização sem limites do trabalho humano31. Era a hora de lutar por melhores condições de trabalho e de impor limites a situação de extrema inferioridade econômica e de abandono a riscos desmedidos que estavam submetidos os trabalhadores, naquela época.

 

Não tendo, porém, a ordem jurídica criado processos adequados para proporcionar soluções a situações de desequilíbrio e desigualdade econômico-sociais, os grupos, em golpe e contra-golpe, forjaram armas próprias de auto-defesa, nos conflitos que, com inaudita veemência, precederam à formação do direito do trabalho: nasceram a greve e o lock-out32.

 

 

Esses fatos sociais impulsionaram o movimento dos trabalhadores na reivindicação de melhores condições de trabalho. Se as leis se negavam a reconhecer a liberdade de associação, os operários se coligavam para lutar pelo seu reconhecimento, “o que foi obtido através de luta de classe, que tinha na greve o elemento de maior valia”33.

 

A greve nasceu, então, como todo o direito coletivo do trabalho, isto é, em razão da ausência de uma regulamentação justa nas relações entre capital e trabalho. Sua razão de ser e sua finalidade são, pois, a busca de uma ordem jurídica justa34.

 

Na sua origem, a greve era apenas um fato social ainda não inserido na ordem jurídica, sendo a sua incompatibilidade sustentada por diversos juristas, como os italianos da era fascista, que defendiam a antijuridicidade da greve, sob o argumento de que a ninguém é dado fazer justiça com as próprias mãos e sob o amparo do princípio da soberania do Estado35.

 

No entanto, o próprio Estado tinha dificuldades de impor freios a esse fenômeno e de conciliar “o seu uso com as necessidades indeclináveis da economia nacional e a paz social”36. A impotência do Estado era tamanha que o fez conferir aos indivíduos meios suficientes para que, na falta de sua autoridade, pudessem por si mesmos repelir as injustiças sofridas37.

 

Esse contexto demandava, portanto, “um novo estatuto jurídico da produção e do trabalho, bem como a necessidade de colocar a greve no campo do direito”38.

 

Mas antes de ser reconhecida como um verdadeiro direito, a greve era tida como um delito. Nesse sentido, o Código Penal espanhol de 1848 proibia expressamente a greve.

 

Com o avanço social e econômico, a greve deixou de ser, no plano penal, um delito39 e, no campo civil, um descumprimento contratual, para adquirir condição de direito40, resolvendo o problema a respeito de sua licitude41.

 

Essa evolução se deu ao longo do século XIX, quando os movimentos dos trabalhadores foram ganhando cada vez mais força, passando a lutar por melhores condições de trabalho e reivindicar novos direitos, superando as injustiças existentes nas sociedades industriais avançadas42.

 

A greve passou a ser, assim, um dos instrumentos mais eficazes – se não o mais eficiente – na luta pela defesa dos interesses dos trabalhadores43, razão pela qual se tornou o instrumento de pressão mais importante e mais utilizado por estes nos conflitos coletivos de trabalho44.

 

A greve se apresentou, então, como uma ferramenta de democratização da empresa, pois mediante a suspensão do labor, quedavam-se iguais as forças para fixar as condições gerais de trabalho45.

 

Assim, a greve, como um dos instrumentos de luta que servem para os trabalhadores exporem suas reivindicações e defenderem seus interesses46 – removendo ou diminuindo as desigualdades – foi reconhecida como um direito47, o que se justifica diante da situação de inferioridade em que historicamente (e de forma genérica) se acham48.

 

O reconhecimento desse direito supõe a admissão pelo Estado da sua incapacidade49 para empreender por si a tarefa de transformação social e da consecução de uma democracia real e não só formal, conferindo aos trabalhadores um meio de autotutela numa estrutura política pluralista50.

 

 

Nada obstante, a greve (na maioria dos países democráticos) não foi reconhecida como um mero direito, mas como um direito fundamental. Isto é, como um direito da pessoa, reconhecido e positivado na esfera do direito constitucional positivo51.

 

O reconhecimento do direito de greve como um direito constitucional foi praticamente unânime nas Constituições posteriores à Segunda Guerra Mundial52. E na Espanha, assim como no Brasil, o caminho seguido foi o de nível constitucional53, sendo o direito de greve elevado a um direito social fundamental54, indispensável à luta pelos direitos dos trabalhadores.

 

Na Espanha, houve um longo caminho percorrido para que o direito de greve alcançasse o estágio de direito fundamental conferido pela Constitución española de 1978. A greve como um delito transformou-se primeiramente na greve como uma liberdade, e “a partir de 1975, tornou-se greve-direito, com as normas jurídicas que a formalizaram, inclusive na Constituição, como um direito fundamental e liberdade pública, ao lado de outros direitos básicos”55. A greve passou, dessa maneira, de “fato social contrário a uma ordem estabelecida a instituto jurídico verticalmente consagrado”56.

 

No Brasil, do mesmo modo, a “evolução da greve do ponto de vista jurídico pode ser sintetizada em uma fase ligando dois extremos: do delito ao direito constitucional”57. E para que se chegasse ao nível atual,

 

[…] uma longa evolução legislativa se observou. A distinção acolhida pela legislação em vigor não é invenção cerebrina daqueles que redigiram o texto vigente. E esta evolução se deu por força da pressão dos fatos históricos e das mudanças políticas que o Brasil experimenta, desde 1937 a esta parte58.

 

 

À vista disso, o fenômeno social da greve em ambos os países teve, historicamente, uma penosa trajetória para ser reconhecido como um direito59 social fundamental, como é atualmente.

 

A demonstração de força e de capacidade de luta dos trabalhadores transmitidas através da greve, consolidam um sentimento de solidariedade coletiva como superação dos interesses individuais e conveniências particulares60 em prol de um bem jurídico maior e de toda a coletividade61. “Essa entrega total de cada trabalhador, em função de um interesse abstrato do grupo, tendo em vista a consecução de um fim comum e coletivo, independentemente dos riscos que dela decorrem, ‘justifica o fundamento social da greve’”62.

 

Logo, os fundamentos do fenômeno grevista “conferem ao direito paredista status de essencialidade nas ordens jurídicas contemporâneas. Por essas razões, a greve é, efetivamente, um direito fundamental nas democracias”63, o que nos faz pensar, em um primeiro instante, que é indiscutível o acerto da decisão em comento na promoção do direito fundamental à greve.

 

No entanto, é preciso a análise dos elementos de fundo que levaram os julgadores espanhóis a concluírem pela nulidade da dispensa coletiva e se essa, de fato, afrontou o direito fundamental em questão.

 

A sentença da Câmara Social da Audiência Nacional Espanhola foi tomada basicamente sob três fundamentos.

·        

O primeiro foi de que – embora não tenha se verificado nenhuma violação ao direito de negociação coletiva – a conduta da empresa durante o período de consultas teria afetado ilegalmente o poder de barganha dos trabalhadores que estavam em greve, o que seria determinante para a nulidade do despedimento coletivo.

O segundo foi de que a dispensa coletiva dos trabalhadores da Coca Cola Iberian Partners é nula, em razão de que a empresa não cumpriu com as suas obrigações de notificação e informação, pois o relatório técnico apresentado como fundamento das dispensas coletivas não fornecia dados precisos a respeito das causas organizacionais alegadas, sendo impossível verificar a veracidade das mesmas. Para a tomada da decisão, levou-se em consideração, também, o fato de que mesmo após as reivindicações realizadas pelas entidades sindicais para que essas informações fossem disponibilizadas, a empresa não as apresentou, o que foi decisivo para a declaração de nulidade do despedimento coletivo.

O terceiro fundamento foi o de que a formação do grupo econômico foi apenas uma causa virtual para as dispensas coletivas, na medida em que os trabalhadores sequer sabiam que seu empregador havia mudado e que agora faziam parte do corpo de empregados de uma empresa de maior porte, o que foi, no entendimento do Tribunal, suficiente para afastar a reorganização estrutural como motivo hábil a justificar a dispensa coletiva dos trabalhadores.

 

Do estudado, conclui-se que nada impede que os despedimentos coletivos ocorram na sequência de uma mudança de estrutura do empregador, desde que hajam razões objetivas para isso e que o procedimento seja iniciado somente após a conclusão formal da sucessão empresarial, inclusive com a devida informação aos trabalhadores e seus representantes. A tendência interpretativa é no sentido de que se isso não ocorrer, a validade da despedida subsequente será posta cheque64.

 

A decisão da Câmara Social do Tribunal Supremo da Espanha, por sua vez, manteve a decisão de nulidade da dispensa coletiva do Grupo Coca-Cola, por ter sido constatada vulneração ao direito de greve, na medida em que, durante o movimento paredista, a empresa substituiu os trabalhadores grevistas por engarrafadores de outras unidades que não aderiram ao movimento, o que, no entendimento do Tribunal, teria prejudicado o bom desenrolar da negociação coletiva durante o período de consultas.

 

Pode-se, então, extrair dois fatos essenciais para o julgamento do caso:

 

1. Durante o período de consultas, os trabalhadores das fábricas de Fuenlabrada, Astúrias, Alicante e Palma de Maiorca, entraram em greve, protestando contra a dispensa coletiva e o fechamento das fábricas em que trabalhavam.

 

2. A greve parou completamente a produção na fábrica de Fuenlabrada, o que prejudicou o abastecimento dos produtos aos clientes da empresa e fez com que a CCIP substituísse a produção da fábrica de Fuenlabrada pela produção de outras empresas engarrafadoras do Grupo, a fim de suprir o abastecimento do comércio local.

 

Desses dois fatos emergem a questão chave para a análise do acerto ou não da decisão: representariam, ou não, uma violação ao direito de greve previsto no artigo 28.2 da Constituição espanhola, e/ou interferiram no processo de negociação dos termos do despedimento coletivo durante o período de consultas previsto nos artigos 41.4 e 51.2 do Estatuto dos Trabalhadores?

 

Esse é o grande problema jurídico a ser resolvido.

 

A substituição de trabalhadores grevistas por outros que não aderiram ao movimento é chamada na Espanha de esquirolaje65 e sua prática é vedada pelo artigo 6.5 do Real Decreto-ley 17/1977, que estabelece que enquanto perdurar a greve, o empregador não poderá substituir os grevistas por trabalhadores que não estiverem vinculados a mesma empresa no momento do anúncio da greve, salvo quando se tratar de serviços necessários para a segurança das pessoas e das coisas (art. 6.7 do Real Decreto-ley 17/1977)66.

 

O disposto nesse artigo é respaldado pelo entendimento do Tribunal Constitucional espanhol, que no julgamento de precedente, asseverou que:

 

[...] la “sustitución interna” de huelguistas durante la medida de conflicto constituye un ejercicio abusivo del ius variandi empresarial, derecho que, con los límites legalmente previstos, corresponde al empresario en otras situaciones. Pero en un contexto de huelga legítima el referido ius variandi no puede alcanzar a la sustitución del trabajo que debían haber desempeñado los huelguistas por parte de quien en situaciones ordinarias no tiene asignadas tales funciones; ya que, en tal caso, quedaría anulada o aminorada la presión ejercida legítimamente por los huelguistas a través de la paralización del trabajo.

Por ello, ni el empresario puede imponer a los trabajadores no huelguistas la realización de las tareas que corresponden a los que secundaron la convocatoria, ni los trabajadores que libremente decidieron no secundarla pueden sustituir el trabajo de sus compañeros67.

 

 

Assim, é legítimo o poder diretivo do empregador e a lei protege o seu exercício. Porém, esse poder não pode ser utilizado para substituir os trabalhadores em greve, sob pena de se enfraquecer o movimento coletivo.

 

Logo, a proibição da substituição de trabalhadores em greve corresponde à necessidade de se garantir a eficácia do direito fundamental em jogo. Ora, a livre substituição dos grevistas obstaculiza o exercício do direito reconhecido, tornando ineficaz até mesmo a sua previsão constitucional68.

 

In casu, não se cogita que a dispensa coletiva tenha sido uma reação empresarial em contrapartida da greve. Não é esse o argumento utilizado para se dizer que a dispensa coletiva feriu o direito fundamental invocado, até porque a greve foi deflagrada em momento posterior ao anúncio da despedida coletiva. A dispensa em massa violou indiretamente o direito fundamental à greve no momento em que a empresa utilizou mão de obra de terceiros para cobrir a falta de produção na engarrafadora de Fuenlabrada, já que essa conduta tinha como pressuposto eliminar, minimizar ou mitigar os efeitos da greve que tinha como foco a reação à dispensa coletiva, o que é – como referido no acórdão – uma violação desse direito constitucional.

 

A substituição dos trabalhadores grevistas por outros (do mesmo grupo econômico) que não aderiram ao movimento feriu o direito à greve, na medida em que anulou os efeitos nocivos que o desabastecimento dos produtos deveria causar à empresa, eliminando o poder de barganha dos representantes dos trabalhadores durante o período de consultas que estava sendo realizado justamente para analisar as possibilidades de redução das dispensas dos trabalhadores. Isso tudo, especialmente, porque a empresa não havia dado ciência inequívoca e pretérita aos trabalhadores de que formavam um novo e grandioso grupo econômico. A tese do grupo econômico, então, não servia quer como fundamento ao rearranjo empresarial, quer como fundamento à substituição da atividade atingida pelo movimento grevista.

 

Em outras palavras, a conduta da empresa neutralizou os efeitos da greve que estava diretamente relacionada com as reivindicações dos representantes dos trabalhadores no sentido de evitar ou minorar os efeitos da dispensa coletiva. Isso influiu diretamente na negociação coletiva que acabou por fracassar em alguns dos seus tópicos, como foi, por exemplo, com o fechamento das quatro unidades da empresa (Fuenlabrada, Astúrias, Alicante e Palma de Maiorca).

 

Isso fez com que a conduta da empresa fosse considerada pelo Tribunal como uma ofensa ao direito de greve, perfectibilizada por meio do despedimento coletivo, ainda que esse não tenha sido uma reação diretamente ligada ao exercício da greve, repise-se.

 

Explica-se. A greve era utilizada como um instrumento de força em favor dos interesses dos obreiros na negociação coletiva. Se a empresa, por meio da substituição dos grevistas, neutraliza os efeitos da greve, acaba por prejudicar a negociação, já que retira o único poder de barganha que os trabalhadores tinham em seu favor. Os prejuízos à negociação são tão nefastos que o resultado da negociação é o mesmo que seria caso ela não tivesse ocorrido. E se a negociação coletiva não ocorre, há a violação do dispositivo legal que a estabelece como requisito prévio ao despedimento em massa69, motivo pelo qual parece fundamentada, no contexto espanhol, a decisão do Tribunal Supremo espanhol ao declarar a nulidade da dispensa coletiva efetuada pela Coca Cola Iberian Partners.

 

Essa decisão – não há como negar – remete ao leading case do Tribunal Constitucional da Espanha, considerado um marco a respeito do direito de greve, por qualificá-lo como um direito constitucional subjetivo de caráter fundamental. Nessa ocasião o Tribunal Constitucional espanhol asseverou que

 

[…] el sistema que nace del art. 28 de la Constitución es un sistema de «derecho de huelga». Esto quiere decir que determinadas medidas de presión de los trabajadores frente a los empresarios son un derecho de aquéllos. Es derecho de los trabajadores colocar el contrato de trabajo en una fase de suspensión y de ese modo limitar la libertad del empresario, a quien se le veda contratar otros trabajadores y llevar a cabo arbitrariamente el cierre de la empresa […].

[…]

Para comprenderlo debidamente no debe perderse de vista que en el ordenamiento jurídico español actual la huelga es un derecho subjetivo, lo cual significa […] sin embargo, más cosas, como son que el empresario no puede sustituir a los huelguistas por otros trabajadores […]70.

 

 

Em sentido contrário, o Tribunal da Relação de Lisboa, relativizando a proibição da substituição dos grevistas, já admitiu a contratação de outros trabalhadores para esse fim em um determinado caso específico ocorrido com os Correios de Portugal71.

 

Apesar disso, cumpre destacar, por fim, que o direito de greve e seus limites em relação ao instituto da dispensa coletiva, havia sido analisado pelo Tribunal Supremo da Espanha em outras três oportunidades anteriores72, todas elas distintas do caso em apreço, de modo que até então não havia um precedente direto na jurisprudência que tratasse da questão da maneira como foi realizada no feito ora analisado, o que o torna um precedente e paradigma a ser observado em casos futuros, no cenário das relações coletivas de trabalho espanholas e um modelo importante de estudo para o direito comparado.

 

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

 

No caso em apreço, a análise da legalidade da dispensa coletiva foi além dos requisitos procedimentais previstos em lei.

 

As movimentações empresariais (tais como fusões, incorporações e outras alterações societárias), apesar de envolverem reserva e sigilo em razão das cifras e condições de negociação, precisam ser notificadas aos trabalhadores assim que possível e nos limites necessários à plena compreensão por estes e por seus representantes da nova estrutura em que inseridos. A reestruturação empresarial derivada de uma fusão, por exemplo, que leve a despedidas (especialmente coletivas) deve ser precedida da plena ciência, em primeiro, da fusão e do novo perfil do empregador e, em segundo, dos ajustes necessários à continuidade da empresa em seu novo modelo. O diálogo entre as forças de capital e trabalho deve anteceder aos momentos de extremo tensionamento, como os analisados na decisão em comento nesse artigo.

 

No caso (sui generis inclusive no cenário espanhol), para o reconhecimento de sua nulidade, a despedida foi posta em rota de colisão com o direito fundamental à greve, na medida que a conduta empresarial de substituição dos trabalhadores grevistas da unidade de Fuenlabrada, durante o período de consultas, minimizou a força das entidades sindicais que atuaram na negociação coletiva, pois essas se valiam da greve como um meio de pressão considerado lícito frente ao comunicado da empresa de que seria procedida a dispensa em massa.

 

A conduta da empresa, portanto, além de interferir no processo de negociação da dispensa coletiva dos trabalhadores, feriu o direito de greve previsto no artigo 28.2 da Constituição espanhola, razão pela qual o resultado da ação não poderia ser outro senão o de nulidade da dispensa coletiva por vulneração ao direito fundamental à greve.

 

Destaca-se que a garantia constitucional do direito de greve não se limita ao seu exercício em sentido estrito, mas se estende também a todos os atos empresariais que visem minimizar os seus efeitos.

 

A decisão do Tribunal Supremo da Espanha aparece, por conseguinte, como o momento mais elevado de reconhecimento do direito fundamental à greve na ordem jurídica espanhola, podendo servir de paradigma para casos semelhantes ocorridos ou a ocorrerem no Brasil e, por isso, revela-se necessário seu estudo, especialmente no que toca à sequência e cadência dos atos anteriores à judiciarização do conflito.

 

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

 

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[1] Por vezes, transnacionalmente, com o apoio das ferramentas tecnológicas (teletrabalho). É bastante comum o deslocamento de serviços de call center, por exemplo, para países indianos ou africanos.

 

1     HOFFMANN-RIEM, Wolfgang. Direito, tecnologia e inovação. In: MENDES, Gilmar Ferreira; SARLET, Ingo Wolfgang; COELHO, Alexandre Zavaglia Pereira (coords.). Direito, inovação e tecnologia. São Paulo: Saraiva, 2015. p. 11.

 

2      In verbis: “Sin perjuicio de los procedimientos específicos que puedan establecerse en la negociación colectiva, la decisión de modificación sustancial de condiciones de trabajo de carácter colectivo deberá ir precedida de un período de consultas con los representantes legales de los trabajadores, de duración no superior a quince días, que versará sobre las causas motivadoras de la decisión empresarial y la posibilidad de evitar o reducir sus efectos, así como sobre las medidas necesarias para atenuar sus consecuencias para los trabajadores afectados. La consulta se llevará a cabo en una única comisión negociadora, si bien, de existir varios centros de trabajo, quedará circunscrita a los centros afectados por el procedimiento. La comisión negociadora estará integrada por un máximo de trece miembros en representación de cada una de las partes”.

 

3      Naquela época, o número total de trabalhadores da Companhia era de 4.276 (quatro mil, duzentos e setenta e seis), sendo destes 4.118 (quatro mil, cento e dezoito) fixos e 158 (cento e cinquenta e oito) temporários.

 

5      Expediente de regulamentação do emprego, conhecido popularmente como ERE. Trata-se de expediente pelo qual uma determinada empresa busca a autorização da autoridade laboral competente para despedir ou suspender tralhadores, mediante contraprestações pecuniárias.

 

6      A seleção dos trabalhadores a serem despedidos obedecia o seguinte critério: a) empregados que trabalhavam nas unidades que foram fechadas; b) empregados que trabalhavam nas unidades em que as atividades foram reduzidas; c) empregados cujas funções foram extintas ou reduzidas, em decorrência do processo de centralização. Nos casos b e c, os critérios de seleção entre os trabalhadores eram: a) a inadequação dos postos de trabalho existentes no perfil profissional do trabalhador; b) a falta de versatilidade profissional; e c) a falta de capacidade ou aptidão para o desempenho das funções necessárias.

 

7      A Audiencia Nacional é um tribunal espanhol com sede em Madrid e que tem jurisdição em todo o território nacional, com competência para julgar processos envolvendo matérias de ordem penal, administrativa e trabalhista.

 

9      ORLANDO, GOMES. Dispensa coletiva na reestruturação da empresa: aspectos jurídicos do desemprego tecnológico. In: Revista LTr: Legislação do Trabalho. ano 38, jan/1974. São Paulo: LTr, 1974. p. 575. A dispensa coletiva difere-se da dispensa plúrima que é “quando numa empresa se verifica uma série de despedidas singulares ou individuais, ao mesmo tempo, por motivo relativo à conduta de cada empregado dispensado” (ORLANDO, GOMES. Op. cit. p. 576).

 

10     ORLANDO, GOMES. Op. cit. p. 575.

11     DELGADO, Mauricio Godinho. Curso de direito do trabalho. 10. ed. São Paulo: LTr, 2011. p. 1048.

 

12     Para Amauri Mascaro Nascimento, o principal traço jurídico distintivo entre as dispensas coletivas e individuais, “está na natureza de ato instantâneo desta e de ato sucessivo naquela” (NASCIMENTO, Amauri Mascaro. Crise econômica, despedimentos e alternativas para a manutenção dos empregos. In: Revista LTr: legislação do trabalho. ano 73, n. 1, jan/2009. São Paulo: LTr, 2009. p. 9).

 

13     BRASIL. TST, SEDC, ARE nº. 30900-12.2009.5.15.0000, Min. Rel. Mauricio Godinho Delgado, data de publicação: 04/09/2009.

 

14     ALMEIDA, Renato Rua de. O regime geral do direito do trabalho contemporâneo sobre a proteção da relação de emprego contra a despedida individual sem justa causa – estudo comparado entre a legislação brasileira e as legislações portuguesa, espanhola e francesa. In: Revista LTr: Legislação do Trabalho. ano 71, n. 3, mar/2007. São Paulo: LTr, 2007. p. 338.

 

15     ORLANDO, GOMES. Op. cit. p. 575.

 

16     ORLANDO, GOMES. Op. cit. p. 575.

 

17     Nesse sentido, há três Projetos de Lei que foram desarquivados este ano e que estão em tramitação: PL nº. 6356/2005, PL nº. 5.232/2009 e PL nº. 5.353/2009 (esses últimos atualmente apensados ao primeiro) que visam regulamentar a dispensa coletiva de trabalhadores no Brasil, definindo-a, bem como fixando procedimentos e sanções, além de dispor sobre a negociação coletiva prévia entre as empresas e os sindicatos profissionais nesses casos.

 

18     A Convenção nº. 158 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), que versa sobre dispensa coletiva, foi aprovada pelo Congresso Nacional através do Decreto nº. 68/1992 e ratificada pelo Decreto nº. 1.855/96. Pouco tempo depois, a constitucionalidade da Convenção nº. 158 foi questionada no Supremo Tribunal Federal, por meio da ADI nº. 1.480. Em 1997, o Pleno do Supremo Tribunal Federal entendeu, em decisão liminar, que a Convenção nº. 158 era inconstitucional. Não obstante, passados apenas sete meses da ratificação e antes que o STF julgasse o mérito da questão, o então Presidente Fernando Henrique Cardoso, por meio do Decreto nº. 2.100/96, formalizou denúncia à OIT e tornou público que a Convenção deixaria de ser cumprida no Brasil a partir de 20 de novembro de 1997. A Convenção nº. 158 da OIT foi, assim, excluída de nosso ordenamento jurídico interno, motivo pelo qual o STF arquivou a ADI nº. 1.480, por perda do objeto da ação. Atualmente, está tramitando no STF a ADI nº. 1.625 que visa a declaração da inconstitucionalidade da denunciação da Convenção nº. 158 feita à OIT.

 

19     PORTUGAL. Código do Trabalho, Lei nº. 7 de 12 de fevereiro de 2009, artigo 359.1. Disponível em . Acesso em 15/05/2015.

 

20     A expressão greve tem origem no termo francês grève, oriundo da Place de Grève, praça localizada em Paris, às margens do Rio Sena. Nessa praça “os trabalhadores se encontravam, debatiam e deliberavam sobre as medidas a serem tomadas para interesse do grupo” (BOMFIM, Vólia. Direito do trabalho. 7. ed. rev. e atual. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2012. p. 1269). A etimologia da palavra huelga – greve em espanhol – advém do termo huelgo, espaço de tempo em que uma pessoa fica sem trabalhar (CABANELLAS, Guillermo. Tratado de derecho laboral. tomo III. Derecho colectivo laboral. Buenos Aires: El Grafico, 1949. p. 560).

 

21     CABANELLAS, Guillermo. Op. cit. p. 560.

 

22     CATHARINO, José Martins. Tratado elementar de direito sindical: doutrina, legislação. São Paulo: LTr, 1977. p. 251. Prossegue o mesmo autor dizendo que a “greve é, acima de tudo, um fenômeno social e humano, por causas materiais e com efeitos da mesma natureza. Forma de luta de pessoas trabalhadoras contra pressão e opressão econômicas, desumanas e desumanizantes” (CATHARINO, José Martins. Op. cit. p. 251).

 

23     BARROS, Alice Monteiro de. Curso de direito do trabalho. 2. ed. São Paulo: LTr, 2006. p. 1258.

 

24     DELGADO, Mauricio Godinho. Op. cit. p. 1344.

 

25     KROTOSCHIN, Ernesto. Instituciones de derecho del trabajo. 2. ed. Buenos Aires: Depalma, 1968. p. 675.

 

26     A greve não é apenas um instrumento utilizado para conseguir melhorias salariais ou melhores condições de trabalho em face do empregador. A greve pode ser utilizada, inclusive, como meio de pressão dos poderes públicos, para que esses legislem ou tomem outras medidas políticas em favor dos trabalhadores (MARTÍNEZ, M. Olga Sanchez. La huelga ante el derecho: conflictos, valores y normas. Madrid: Dykinson, 1997. p. 171).

 

27     DELGADO, Mauricio Godinho. Op. cit. p. 1341.

 

28     GOTTSCHALK, Egon Felix. Greve e lock-out. São Paulo: Maxlimonad, 1963. p. 12.

 

29     BOMFIM, Vólia. Op. cit. p. 12.

 

30     GOTTSCHALK, Egon Felix. Op. cit. p. 11.

 

31     BOMFIM, Vólia. Op. cit. p. 12.

 

32     GOTTSCHALK, Egon Felix. Op. cit. 11-12.

 

33     GARCIA, Paulo. Direito de greve. Rio de Janeiro: Edições Trabalhistas, 1961. p. 19.

 

34     CUEVA, Mario de la. Derecho mexicano del trabajo. tomo II. 10. ed. reimp. México: Porrua, 1970. p. 770. Nesse sentido, Guillermo Cabanellas assevera que “las huelgas se producen como consecuencia del nascimiento de la gran industria, ante el enorme desarrollo económico que ponía grandes riquezas em pocas manos, por el proceso de concentración del industrialismo moderno, a causa de la necessidad de mejores medios de vida para los trabajadores, por efecto del espíritu de asociación y de las nuevas ideas que impusieron una distinta concepción del Derecho y una más amplia liberdad de trabajo” (CABANELLAS, Guillermo. Op. cit. p. 563-564).

 

35     NASCIMENTO, Amauri. Mascaro. Direito sindical. São Paulo: Saraiva, 1989. p. 408.

 

36     GOTTSCHALK, Egon Felix. Op. cit. p. 18.

 

37     CABANELLAS, Guillermo. Op. cit. p. p. 566.

 

38     GOTTSCHALK, Egon Felix. Op. cit. p. 18.

 

39     O artigo 556 do Código Penal espanhol de 1848, que proibia a greve, foi revogado pela Ley de huelgas y coligaciones de 27 de abril de 1909.

 

40     MARTÍNEZ, M. Olga Sanchez. Op. cit. p. 163.

 

41     BARASSI, Ludovico. Tratado de derecho del trabajo. Versión castellana del Miguel Sussini. Prólogo y notas de derecho argentino del Mario L. Deveali. tomo III. Buenos Aires: Editorial Alfa, 1953. p. 531.

 

42     MARTÍNEZ, M. Olga Sanchez. Op. cit. p. 164.

 

43     MARTÍNEZ, M. Olga Sanchez. Op. cit. p. 171.

 

44     KROTOSCHIN, Ernesto. Tratado práctico de derecho del trabajo. v. II. 2. ed. rev. y atual. Buenos Aires: Depalma, 1962. p. 803.

 

45     CUEVA, Mario de la. Op. cit. p. 764.

 

46     MARTÍNEZ, M. Olga Sanchez. Op. cit. p. 164.

 

47     “La huelga, en consecuencia, transformó el sentido de las relaciones interobreras, al dar preferencia al derecho de las mayorías y concluyó com el reinado arbitrario del patrono dentro dela empresa. Pasó entonces a integrar el derecho colectivo del trabajo como una de sus instituiciones” (CUEVA, Mario de la. Op. cit. p. 764).

 

48     NASCIMENTO, Amauri. Mascaro. Op. cit. p. 374.

 

49     Nesse sentido, Mozart Russomano refere que só “se compreende o reconhecimento da greve como direito na medida em que o próprio Estado confessa sua incapacidade para resolver a totalidade dos conflitos coletivos de trabalho” (RUSSOMANO, Mozart Victor. Curso de direito do trabalho. Rio de Janeiro: José Konfino Editor, 1974. p. 557).

 

50     NASCIMENTO, Amauri. Mascaro. Op. cit. p. 374.

 

51     SARLET, Ingo Wolfgang. A eficácia dos direitos fundamentais: uma teoria geral dos direitos fundamentais na perspectiva constitucional. 11. ed. rev. atual. Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora, 2012. p. 27-35.

 

52     MARTÍNEZ, M. Olga Sanchez. Op. cit. p. 171.

 

53     NASCIMENTO, Amauri. Mascaro. Op. cit. p. 369.

 

54     Diz o artigo 28.2 da Constituição Espanhola, in verbis: “Se reconoce el derecho a la huelga de los trabajadores para la defensa de sus intereses. La ley que regule el ejercicio de este derecho establecerá las garantías precisas para asegurar el mantenimiento de los servicios esenciales de la comunidad”.

 

55     NASCIMENTO, Amauri. Mascaro. Op. cit. p. 372.

 

56     CATHARINO, José Martins. Op. cit. p. 256.

 

57     CATHARINO, José Martins. Op. cit. p. 256.

 

58     ROMITA, Arion Sayão. Greve no setor privado. In: CANOTILHO, José Joaquim Gomes; MENDES, Gilmar Ferreira; SARLET, Ingo Wolfgang; STRECK, Lenio Luiz (coords.). Comentários à Constituição do Brasil. São Paulo: Saraiva/Almedina, 2013. p. 639.

 

59     BARROS, Alice Monteiro de. Op. cit. p. 1256.

 

60     BARROS, Alice Monteiro de. Op. cit. p. 1256.

 

61     Nesse sentido, Evaristo de Moraes Filho refere que o “direito de greve não é simples direito individual, é um verdadeiro direito social, coletivo, novo, pertencente à coletividade ou à pessoa jurídica do sindicato – responsável perante o Estado e o patrono –, do que propriamente aos trabalhadores individual e isoladamente considerados. É uma instituição típica do direto do trabalho, tendo por sujeito, de modo indeterminado e abstrato, alguma coisa que transcende ao simples interesse pessoal de cada trabalhador (MORAES FILHO, Evaristo de. Do delito ao direito de greve: um quarto de século na vida italiana. Rio de Janeiro. Tip. Nap Ltda, 1956. p. 60-61).

 

62     BARROS, Alice Monteiro de. Op. cit. p. 1256.

 

63     DELGADO, Mauricio Godinho. Op. cit. p. 1364.

 

64     MAZZUCCONI, Carolina San Martín. Despidos colectivos en grupos de empresas (caso Coca-Cola Iberian Partners, SAN 12-6-14, Proc. 79/2014). In: ANÁLISIS GA&P. Madrid: GA&P, 2014. Disponível em: . Acesso em: 15/05/2015. p. 2.

 

65     Termo específico de origens históricas utilizado na Espanha. Esquirol é aquele trabalhador que aceita trabalhar nos postos de trabalhadores mobilizados em uma greve. A expressão correspondente utilizada para se referir a esse tipo de trabalhador no Brasil é conhecida como fura-greve e nos Estados Unidos como strikerbreaker.

 

66     No Brasil, o dispositivo em questão encontra correspondente no parágrafo único do art. 7º da Lei de Greve (Lei nº. 7.783/89), que diz que é “vedada a rescisão de contrato de trabalho durante a greve, bem como a contratação de trabalhadores substitutos, exceto na ocorrência das hipóteses previstas nos arts. 9º e 14” da mesma lei.

 

67     ESPANHA. Tribunal Constitucional, Sala Primeira, Recurso de Amparo n. 6171-2004, Sentença n. 33/2011, Rel. Adela Asua Batarrita, Data de publicação: 28/04/2011.

 

68     PÉREZ DEL CASTILHO, Santiago. O direito de greve. trad. Maria Stella Penteado G. De Abreu. São Paulo: LTr, 1994. p. 239.

 

69     No Brasil, ainda que não haja lei regulamentando a matéria, o Tribunal Superior do Trabalho já se manifestou no sentido de que a dispensa em massa há de ser precedida obrigatoriamente de negociação coletiva (BRASIL. TST, SEDC, ARE nº. 30900-12.2009.5.15.0000, Min. Rel. Mauricio Godinho Delgado, data de publicação: 04/09/2009). No mesmo sentido: BRASIL. TRT-2, SDC, DC nº. 20281200800002001, Acórdão nº. 00002/2009-0, Des. Rel. Ivani Contini Bramante, data do julgamento: 22/12/2008; BRASIL. TRT-15, SDC, DC nº. 0030900-12.2009.5.15.0000, Des. Rel. José Antonio Pancotti, data de publicação: 30/03/2009. Todavia, esse entendimento não é unânime, encontrando dissidência no próprio TST, como se observa do entendimento exposto pelo Ministro  Milton De Moura França em decisão monocrática proferida nos autos do processo n. 2076606-98.2009.5.00.0000 (BRASIL. TST, AG nº. 207660/2009-000-00-00.7, Min. Milton De Moura França, data de publicação: 14/04/2009). Atualmente, a questão ganhou repercussão geral conferida pela maioria do Supremo Tribunal Federal, vencido o Ministro Luiz Fuz (BRASIL. STF, Pleno, ARE nº. 647651, Min. Rel. Marco Aurélio, data de publicação: 02/05/2013), estando pendente de julgamento até o presente momento.

 

70     ESPANHA. Tribunal Constitucional, Pleno, Sentencia nº. 11/1981, Rel. Luis Díez-Picazo y Ponce de León, data de publicação: 25/04/1981.

 

71     PORTUGAL. Tribunal da Relação de Lisboa, Processo nº. 7896/2007-4, Rel. Duro Mateus Cardoso, data do julgamento: 12/07/2007.

 

72     ESPANHA. Tribunal Supremo, Sala de lo Social, Sentença nº. 5414/2013, Recurso nº. 11/2013, Rel. Antonio Martin Valverde, Data do julgamento: 20/09/2013; ESPANHA. Tribunal Supremo, Sala de lo Social, Sentença nº. 1455/2015, Recurso nº. 255/2013, Rel. Jose Luis Gilolmo Lopez, data do julgamento: 23/02/2015; ESPANHA. Tribunal Supremo, Sala de lo Social, Sentença nº. 1439/2015, Recurso nº. 124/2014, Rel. Jose Manuel Lopez Garcia De La Serrana, data do julgamento: 24/02/2015.

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2016