FÉRIAS: ANÁLISE DAS ALTERAÇÕES  DO ART. 134, § 1º A 3º DA CLT

 

 

 

ELINAY MELLO

Juíza do Trabalho

 

 

 

 

                    ANTES

 

                              DEPOIS

Art. 134. As férias serão concedidas por ato do empregador, em um só período, nos 12 (doze) meses subsequentes à data em que o empregado tiver adquirido o direito.

Art. 134. As férias serão concedidas por ato do empregador, em um só período, nos 12 (doze) meses subsequentes à data em que o empregado tiver adquirido o direito.

§ 1º Somente em casos excepcionais serão as férias concedidas em 2 (dois) períodos, um dos quais não poderá ser inferior a 10 (dez) dias corridos.

§ 1º Desde que haja concordância do empregado, as férias poderão ser usufruídas em até três períodos, sendo que um deles não poderá ser inferior a quatorze dias corridos e os demais não poderão ser inferiores a cinco dias corridos, cada um.

§ 2º Aos menores de 18 (dezoito) anos e aos maiores de 50 (cinquenta) anos de idade, as férias serão sempre concedidas de uma só vez.

§ 2º (Revogado).

Sem correspondente

§ 3º É vedado o início das férias no período de dois dias que antecede feriado ou dia de repouso semanal remunerado.” (NR)

 

 

O regime de férias anuais, previsto no Capítulo IV da CLT, foi incluído, em sua maioria, pelo Decreto-Lei 1.535/1977 e pertence ao Título II, que trata das Normas Gerais de Tutela do Trabalho. Assim, partindo da interpretação sistemática, depreende-se que, as férias anuais (Delgado, 2013) compõem com os intervalos intrajornada, interjornada e descanso semanal remunerado e feriados o conjunto de descansos trabalhistas, previstos na legislação trabalhista, pois atendem a todos os objetivos justificadores dos demais intervalos e descansos trabalhistas, quais sejam: metas de saúde e segurança laborativas e de reinserção familiar, comunitária de política do trabalhador.

 

O instituto se insere entre as normas que tratam da limitação do tempo de trabalho e foram instituídas levando-se em conta critérios de natureza biológica, social e econômicos (Süssekind, 2000), a saber: a) de natureza biológica, eis que visa a combater os problemas psicofisiológicos oriundos da fadiga e da excessiva racionalização do serviço; b) de caráter social, por isto que possibilita ao trabalhador viver, como ser humano, na coletividade a que pertence, gozando os prazeres materiais e espirituais criados pela civilização, entregando-se à prática de atividades recreativas, culturais ou físicas, aprimorando seus conhecimentos e convivendo, enfim, com sua família; c) de índole econômica, porquanto restringe o desemprego e acarreta, pelo combate à fadiga, um rendimento superior na execução do trabalho.

 

Por isso, dentre todas as formas de descanso obrigatório do trabalhador, ditadas por motivos de higiene social, o direito às férias anuais remuneradas é inegavelmente o que melhor permite a reestruturação do equilíbrio orgânico, porque possuem múltipla finalidade: resguardar a saúde e produtividade do trabalhador e promover o progresso étnico, social e econômico da sociedade.

 

Indispensável esta breve exposição sobre o instituto das férias para discutirmos as mudanças promovidas pela Lei 13.467/2017 ao art. 134 da CLT, que trata da concessão e da época de férias (Seção II).

 

As novas regras jurídicas ratificam que a vontade do legislador (mens legislatoris), alicerçada na suposta necessidade de modernização da legislação trabalhista para fazer frente às novas relações de trabalho criadas pela sociedade capitalista contemporânea, está em total dissonância com o munus social em que se forjou e sedimentou o direito do trabalho, cujo vetor principal desse ramo especializado do direito é o princípio protetor. Ou seja, a propagada modernização das leis trabalhistas, entre as quais, a forma de concessão das férias não se coadunam com o arcabouço jurídico de proteção ao trabalhador, em especial o meio ambiente do trabalho, hoje garantia constitucional, prevista no art. 7º, XXII, que exige do empregador a “redução dos riscos inerentes ao trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e segurança.”

 

A retirada da prioridade do gozo de férias do menor em um única parcela, igualando aos demais trabalhadores, somente exemplifica o desacerto dessa reforma que trata mulheres, crianças e adolescentes em descompasso com a atuação contemporânea dos organismos internacionais de proteção a minorias e vulneráveis. Causando estranheza que um país que se comprometeu em erradicar toda as formas de trabalho infantil até 2020, atualize sua legislação para precarizar as condições de trabalho do menor, no que se refere às férias anuais, cujo descanso, como se viu, é indispensável à restauração física e psíquica do trabalhador, ainda mais se tratando de menor, que se encontra em processo de formação biológica e emocional.

 

Por derradeiro, ressalto que nem a retirada da prioridade aos maiores de 50 anos não pode ser encarada como observância ao princípio da igualdade, sob o argumento de que o detentor da referida idade não pode mais ser considerado, conforme expectativa de vida atual, uma pessoa idosa passível de proteção.

 

Mais um argumento frágil, na medida em que, as normas ora promulgadas, de um modo geral, não se preocuparam com os trabalhadores, enquanto sujeitos de direitos, pois visaram diminuir e precarizar as condições de trabalho existentes, o que também aconteceu com menores e mulheres, não sendo diferente com os idosos. Afinal, se é certo que o trabalhador de 50 anos não é o mesmo da década de 70, também o é porque sua saúde não é idêntica a dos trabalhadores mais jovens, o que justificaria a manutenção da hipótese excetiva.

 

Ou, quando muito, aumentasse a idade de 50 para 60 anos, mas não a retirada de direitos de fruição de férias para menores de 18 anos e idosos, como promovido pela reforma, propalando que assim o fez em respeito ao princípio da igualdade, em total desrespeito ao princípio protetivo e as normas de proteção a um ambiente do trabalho hígido e saudável.

 

A ruptura com esse projeto conservador se dará, por óbvio, pelo uso transgressor do Direito do Trabalho[1], a arma necessária para fazer valer as garantias dos trabalhadores, espalhadas por todo o texto constitucional. Fontes, princípios, regras e garantias que não mudaram de perspectiva após o advento dessa lei.

 


[1] SEVERO, Valdete Souto. Elementos para o uso transgressor do Direito do Trabalho. São Paulo: LTr, 2016.

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Novembro/2017