ENSAIO SOBRE A REGRA EXCEPTIVA DA EXECUÇÃO MENOS GRAVOSA DO CPC DE 2015 E A EXECUÇÃO TRABALHISTA

 

 

BEN-HUR SILVEIRA CLAUS

Juiz do Trabalho da 4ª Região – RS. Mestre em Direito.

 

 

 

        “ ... prevalece  até  hoje, herdado do processo civil, o princípio da execução menos onerosa: protege-se o devedor, que comprovadamente não tem direito (tanto assim que  foi condenado) em detrimento de quem, reconhecidamente, está amparado por ele.”  

                                                            Wagner D. Giglio

 

 

 

 

Resumo: O presente ensaio fundamenta a proposição teórica de inaplicabilidade subsidiária da regra exceptiva da execução menos gravosa no processo do trabalho.  Trata-se de uma proposta de superação do paradigma teórico civil de que a execução deve ser realizada pelo modo menos oneroso para o executado, condição de possibilidade para a efetividade da execução trabalhista.

 

Palavras-chave:   Efetividade da jurisdição.    Execução trabalhista.  Execução efetiva. Princípio da execução mais eficaz. Execução menos gravosa. Processo de resultados. CPC de 2015.

 

 

SUMÁRIO:   Introdução.    1.  A execução perdeu eficácia quando passou a ser patrimonial.   2. Uma regra sob questionamento no próprio processo civil.  3. Compreendendo a regra exceptiva da execução menos gravosa no âmbito do processo civil. A nova perspectiva do art. 805, parágrafo único, do CPC de 2015.  4. A natureza alimentar do crédito trabalhista como fonte material de direito.  5. É o resultado social negativo que muda o paradigma teórico.  6. A doutrina pela não aplicação da regra exceptiva da execução menos gravosa ao processo do trabalho. Conclusão. Referências.

                

 

 

Introdução

 

Uma das mais nocivas influências do direito processual civil no direito processual do trabalho decorre da aplicação da regra exceptiva da execução menos gravosa no âmbito da execução trabalhista.    

           

A invocação dessa regra tem servido para justificar diversas restrições que costumam ser opostas ao cumprimento das decisões judiciais; como se as decisões judiciais pudessem ter o seu cumprimento adiado por sucessivos argumentos vinculados ao invocado direito a uma execução menos onerosa para o devedor.  Um estudo consequente sobre o déficit de efetividade na execução não pode ser realizado senão mediante o reconhecimento das deformações que a aplicação dessa regra acarretou à cultura jurídica da execução da sentença, em especial no processo civil, mas também no processo do trabalho. 

           

Essa questão estava presente nas cogitações de Wagner D. Giglio quando, em 2003, o autor identificava as causas da falta de efetividade da execução trabalhista.  Depois referir que Luigi de Litala já alertava, no início da década de 1940, que o processo de execução era feito mais para a tutela do devedor do que do credor, o processualista paulista constata que a regra da execução menos onerosa é uma herança do processo civil que compromete a eficácia do processo do trabalho: “... protege-se o devedor, que comprovadamente não tem direito (tanto assim que foi condenado), em detrimento de quem, reconhecidamente, está amparado por ele”.[1] 

           

Na  afirmação de que a  execução trabalhista não se submete à regra da menor gravosidade prevista no art. 620 do CPC de 1973[2] (CPC de 2015, art. 805[3]) está pressuposta uma doutrina comprometida com a efetividade da execução trabalhista,  sob inspiração da garantia constitucional da jurisdição efetiva (CF, art. 5°, XXXV)  e da garantia constitucional da duração razoável do processo do trabalho (CF, art. 5°, LXXVIII), ambas  qualificadas  pelo  conteúdo  ético que o princípio da proteção irradia para o direito material do trabalho numa sociedade marcada por severa desigualdade social.

   

Não se trata de uma postulação teórica original.

           

Mesmo antes do advento do CPC de 2015, diversos doutrinadores sustentavam devesse ser mitigada a regra exceptiva da execução menos onerosa na execução trabalhista. Já outros juristas defendiam a ideia mesma da inaplicabilidade do art. 620 do CPC de 1973 no Processo do Trabalho. Essa última corrente doutrinária está representada, por exemplo, na obra de José Augusto Rodrigues Pinto.[4] Ao lado do erudito jurista baiano, estão outros juristas de expressão:   Antônio Álvares da Silva, Sérgio Pinto Martins, Carlos Henrique Bezerra Leite, Cláudio Armando Couce de Menezes e José Carlos Külzer, entre outros.     

                    

O presente artigo constitui um modesto aporte teórico para que façamos  a execução trabalhista de forma mais eficaz.  Essa preocupação sempre motivou a obra de Wagner D. Giglio: “Uma reforma ideal do processo trabalhista abandonaria o dogma da igualdade das partes e adotaria, na execução, o princípio da execução mais eficaz, em substituição ao da execução menos onerosa”.[5]

           

A preocupação de Wagner D. Giglio seja a nossa inspiração. 

 

 

 

1 A execução perdeu eficácia quando passou a ser patrimonial

 

A execução humanizou-se quando deixou de ser corporal e passou a ser patrimonial.  A legislação viria a consagrar a exigência da nova consciência jurídica que se formara sob a inspiração do cristianismo:  já não era mais possível admitir a crueldade da execução corporal do executado, que permitia ao credor escravizar o executado, repartir seu corpo e até exigir a morte do devedor. A Lex Poetelia[6] é um símbolo dessa viragem hermenêutica humanizadora da legislação executiva.

           

Contudo, é inegável que a eficácia da execução diminuiu com o advento de seu novo perfil, de natureza patrimonial.  Isso porque o êxito da execução passou a depender da existência de patrimônio do executado.  Porém, não só da existência de patrimônio, mas também do registro desse patrimônio em nome do executado e da própria localização dos respectivos bens.  Se era difícil a ocultação da pessoa do executado à época da execução corporal, bem mais fácil tornar-se-ia a ocultação de patrimônio com o advento da execução patrimonial, dando ensejo a simulações e fraudes, que ainda hoje caracterizam a execução, sobretudo nos países de sistema jurídico de civil law.  Aliás, quando se trata de efetividade da jurisdição, é inevitável dirigir o olhar à experiência dos países do sistema jurídico de commom law  no que respeita à eficácia superior lá alcançada no cumprimento das decisões judiciais.[7]

           

É fácil perceber que determinada perda de eficácia seria inevitável com o advento da execução de natureza patrimonial.  As execuções mais eficazes sempre foram aquelas que autorizam a prisão civil do executado, como é o caso clássico da execução de obrigação de prestar alimentos devidos em face do direito de família.  A cultura que se criou na sociedade é a de que não se pode dever tais alimentos.  É por isto que o executado dá um jeito de pagar: para evitar a persuasiva sanção da prisão civil.

           

É a natureza corporal da sanção que confere eficácia à execução de alimentos. Nesses casos, a iminência da prisão civil do obrigado opera como fator de eficaz persuasão. O mesmo ocorria no caso de depositário infiel até o advento da Súmula Vinculante nº 25 do STF.[8]  A referida súmula fragilizou a autoridade jurisdicional na relação com o depositário que desrespeita o encargo de direito público que, para permanecer na posse do bem penhorado, assume perante o Poder Judiciário ao ser nomeado depositário.[9] Se faltava argumento para remover de imediato o bem penhorado ao depósito do leiloeiro judicial, a Súmula Vinculante n° 25 do STF tornou induvidosa a necessidade  da remoção do bem penhorado, sob pena de placitar-se a conduta ilícita do depositário infiel que depois não apresenta o bem penhorado quanto instado pelo juízo a fazê-lo.  

           

A crueldade com a qual o credor podia tratar o devedor não encontra qualquer possibilidade de repristinação diante da consagração dos direitos fundamentais.  Contudo, uma reflexão consequente acerca da baixa efetividade da execução passa pelo reconhecimento de que o potencial de coerção na execução aumenta quando se combina a execução de natureza patrimonial, com aquela de natureza pessoal, em determinadas situações, caracterizadas quando o crédito goza de privilégio jurídico especial (CTN, art. 186), como é o caso da pensão de alimentícia do direito de família e como parece deva ser também o caso do crédito trabalhista, cuja natureza alimentícia é reconhecida na Constituição Federal de forma expressa (CF, art. 100, § 1º).[10]

           

Neste particular, a sempre corajosa doutrina de Ovídio A. Baptista da Silva deve ser trazida à colação.  Ao criticar a monetarização das sentenças mandamentais através da multa como único instrumento de persuasão para induzir o obrigado ao cumprimento de sua obrigação, o processualista propõe o resgate da categoria dos deveres como forma de recuperação da autoridade de nosso sistema judiciário, identificando na ameaça de prisão do obrigado um meio próprio para exigir o cumprimento da obrigação mandamental: “A sociedade humana em que a ameaça de prisão perde a condição de meio coercitivo, capaz de induzir ao cumprimento da ordem contida na sentença, obrigando a que se recorra à multa, como único instrumento capaz de dobrar a resistência de obrigado, é uma comunidade humana individualista e mercantilizada que perdeu o respeito pelos valores mais fundamentais da convivência social, como o autorrespeito e a dignidade pessoal, transformada, afinal na ‘grande sociedade’, em que o único dispositivo capaz de assegurar a observância das regras jurídicas é a sua monetarização.  Submeter-se à prisão poderá, quem sabe, ser até um fato jornalístico que acabará glorificando o gesto de heroísmo e rebeldia”.[11]

           

Nada obstante o tema do presente ensaio seja a inaplicabilidade da regra exceptiva da execução menos gravosa ao Processo do Trabalho, a reflexão agora proposta serve de aporte crítico para o debate que se propõe, porquanto a aplicação da regra da execução menos onerosa ao processo do trabalho tem contribuído para o enfraquecimento da execução trabalhista, quando o resgate da efetividade da execução reclama crescente poder de coerção jurisdicional na exigência do cumprimento das decisões judiciais, para o que pode contribuir, significativamente, a criativa aplicação do preceito do art. 139, IV, do CPC de 2015 à execução trabalhista.[12]

           

É importante observar que os preceitos dos arts. 139, IV e 297[13] do CPC de 2015 operam como alento hermenêutico capaz de fazer desvelar a norma de sobredireito do sistema jurídico laboral brasileiro que habita na morada do art. 765 da CLT.[14] Nesse particular, cumpre referir que a tendência à adoção da atipicidade dos meios executivos, que já se fazia sentir nas minirreformas introduzidas no CPC de 1973 e que vinha sendo desenvolvida pela mais avançada doutrina do Direito Processual Civil[15], ganhou novo impulso com o advento do Código de Processo Civil de 2015.  É ilustrativa dessa tendência doutrinária a afirmação de Edilton Meireles, no sentido de que a abertura da norma do art. 139, IV, do CPC impõe ao magistrado um rico exercício de imaginação destinado à escolha das medidas necessárias à efetividade da execução em cada caso concreto. 

           

O criterioso estudo desenvolvido pelo ilustre processualista acerca do alcance do art. 139, IV, do CPC, encoraja a magistratura a extrair do novo diploma legal toda sua potencialidade para a efetivação da execução: “O legislador, todavia, não limita as medidas coercitivas aquelas mencionadas no Código de Processo Civil. Logo, outras podem ser adotadas, a critério da imaginação do juiz. Por exemplo, podemos mencionar a adoção de medidas restritivas de direito. E, enquanto medidas restritivas de direito, podem ser citadas

 

a)    a proibição do devedor pessoa física poder exercer determinadas funções em sociedades empresariais, em outras pessoas jurídicas ou na Administração Pública;

b)    proibição de efetuar comprar com uso de cartão de crédito;

c)    suspensão de benefício fiscal;

d)    suspensão dos contratos, ainda que privados, de acesso aos serviços de telefonia, Internet, televisão a cabo etc., desde que não essenciais à sobrevivência (tais como os de fornecimento de energia e água);

e)    proibição de frequentar determinados locais ou estabelecimentos;

f)     apreensão de passaporte (se pode prender em caso de prestações alimentares, pode o menos, isto é, restringir parte do direito de ir e vir);

g)    apreensão temporária, com desapossamento, de bens de uso (exemplo: veículos), desde que não essenciais (exemplo: roupas ou equipamentos profissionais);

h)   suspensão da habilitação para dirigir veículos;

i)     bloqueio da conta corrente bancária, com proibição de sua movimentação;

j)      embargo da obra;

k)    fechamento do estabelecimento;

l)     restrição ao horário de funcionamento da empresa etc.”.[16]

 

 

Feito o registro necessário, é hora de retomar o tema do presente ensaio.

 

 

 

2 Uma regra sob questionamento no próprio processo civil

           

A regra exceptiva da execução menos gravosa encontra-se sob interrogação no próprio processo civil, tamanhos são os prejuízos que causa à efetividade da execução civil.  Neste particular, a eloquente crítica que Cândido Rangel Dinamarco dirige às distorções que a aplicação do art. 620 do CPC de 1973 provocou na execução civil faz lembrar a afirmação do magistrado trabalhista Marcos Neves Fava, no sentido de que o art. 620 do CPC de 1973 não pode ser lido como uma carta aberta de alforria do devedor.[17] Não pode, mas foi lido assim na prática judiciária, especialmente no processo civil, mas muitas vezes também no processo do trabalho.[18]

           

O ilustre processualista civil, escrevendo após mais de trinta anos de vigência do CPC Buzaid, reconhece os prejuízos que a distorcida aplicação da norma do art. 620 do CPC de 1973 causou à efetividade da execução civil, postulando a revisão da forma abusiva com que se tem invocado, compreendido e aplicado a regra exceptiva da execução menos gravosa no processo civil:  “... as generosidades em face do executado não devem mascarar um descaso em relação ao dever de oferecer tutela jurisdicional a quem tiver um direito insatisfeito, sob pena de afrouxamento do sistema executivo.  É preciso distinguir entre o devedor infeliz e de boa-fé, que vai ao desastre patrimonial em razão de involuntárias circunstâncias da vida ou dos negócios  (Rubens Requião), e o caloteiro chicanista, que se vale das formas do processo executivo e da benevolência dos juízes como instrumento a serviço de suas falcatruas.  Infelizmente, essas práticas são cada vez mais freqüentes nos dias de hoje, quando raramente se vê uma execução civil chegar ao fim, com a satisfação do credor.” [19]

           

Dinamarco é enfático quanto à necessidade de alterar a cultura de descumprimento das decisões judiciais no processo civil, propondo que se utilize o método mais eficaz para realizar a execução. Isso sob pena de inviabilizar-se o próprio sistema judiciário e de frustrar o compromisso constitucional de acesso à jurisdição efetiva – porquanto jurisdição efetiva pressupõe execução efetiva.[20] Adverte o jurista: “Quando não houver meios mais amenos para o executado, capazes de conduzir à satisfação do credor, que se apliquem os mais severos.”[21] Depois de sublinhar que a regra do art. 620 não pode ser manipulada como um escudo a serviço dos maus pagadores nem como um modo de renunciar o Estado-juiz a cumprir seu dever de oferecer tutelas jurisdicionais adequadas e integrais sempre que possível, o processualista retoma sua prédica: “A triste realidade da execução burocrática e condescendente, que ao longo dos tempos se apresenta como um verdadeiro paraíso dos maus pagadores, impõe que o disposto no art. 620 do Código de Processo Civil seja interpretado à luz da garantia do acesso à justiça, sob pena de fadar o sistema à ineficiência e por em risco a efetividade dessa solene promessa constitucional (CF, art. 5º, inciso XXXV).”[22]

           

Por outro lado, é preciso compreender que a ineficácia da execução é herdeira da congênita baixa eficácia a que o sistema jurídico nacional relegara a sentença condenatória.  A pesquisa de Paulo Henrique Conti  tem a virtude de trazer luz a essa questão, permitindo identificar um antecedente histórico fundamental para a compreensão desse problema central do sistema jurídico brasileiro: “A resistência do devedor tornou-se regra, e não exceção!  Na prática forense, a presunção que prevalece não é a de que a sentença deve ser cumprida pronta e imediatamente após proferida, em toda sua extensão, mas sim de que as obrigações nela contidas devem ser satisfeitas apenas após sua ‘lapidação’ pelas vias de resistência do devedor, incidentais à execução ou endoexecutivas, típicas ou atípicas.”[23] 

           

O autor identifica no CPC de 1973 uma das fontes do enfraquecimento da autoridade da sentença.   É que o CPC de 1973,  a pretexto de conferir tratamento uniforme às execuções – tanto àquelas fundadas em sentença quanto àquelas fundadas em títulos extrajudiciais –, acabou retirando eficácia da sentença condenatória, rebaixando o grau de certeza do título executivo judicial ao nível inferior de certeza reconhecido aos títulos extrajudiciais. Esse quadro de desprestígio à sentença condenatória no processo civil é confirmado pela decisiva circunstância de que a regra no processo civil brasileiro é conferir efeito suspensivo ao recurso de apelação (CPC de 1973, art. 520, caput, primeira parte), regra mantida no CPC de 2015 (art. 1.012). Neste contexto, o dever de colaboração das partes na execução tem sido uma quimera, sobretudo no que diz respeito ao executado, que costuma resistir por todos os meios ao cumprimento da decisão judicial.[24]

                             

As distorções que a aplicação do art. 620 do CPC de 1973 causaram ao direito processual do trabalho foram objeto da reflexão científica de um dos juristas que mais tem se notabilizado pela preocupação com a efetividade da jurisdição trabalhista.  Antônio Álvares da Silva pondera que “... o art. 620 do CPC não pode ser uma porta aberta à fraude e à ineficácia do comando sentencial.  A lei fala que, na hipótese de existência de ‘vários modos’ pelos quais o credor possa executar a sentença, o juiz escolherá o menos gravoso.  Mas é necessário que existam estes  ‘vários modos’  e que eles não importem na diminuição de nenhuma medida prevista em lei para a entrega da prestação jurisdicional.  Por exemplo, se a penhora tem uma ordem preferencial, e o credor deseja a penhora em dinheiro cuja existência ficou comprovada, não se há de romper com a preferência legal, porque o executado alega prejuízo pessoal, comercial ou de qualquer espécie.”[25]

                             

O jurista sintetiza com precisão a relação de subordinação que a regra exceptiva da execução menos gravosa deve à regral geral da execução mais eficaz, na seguinte passagem: “Ao aplicar a regra do art. 620, há que se considerar o que dispõe a regra do art. 612, de que ‘a execução se realiza no interesse do credor.’   Este é que é o verdadeiro norte da execução e vale como orientação geral dos atos que nela se devam praticar.  Quem ganhou deve executar com êxito.” [26]

           

Ao lado de Antônio Álvares da Silva, alinha-se a doutrina de Francisco Antonio de Oliveira.  Para o jurista paulista, a reflexão que se impõe é pensar sobre os efeitos deletérios que o art. 620 do CPC de 1973 produziu no âmbito do processo civil:  “O processo civil extrapolou em cuidados, exigindo que a execução seja feita da forma menos gravosa, quando a execução puder ser feita por vários meios (art. 620, CPC), princípio que vem sendo deturpado por interpretações incoerentes, desmerecendo o credor.”[27]  

 

 

 

3 Compreendendo a regra exceptiva da execução menos gravosa no âmbito do processo civil. A nova perspectiva do art. 805, parágrafo único, do CPC de 2015

 

Quando se examina o tema da execução menos gravosa para o executado no âmbito do processo civil, a primeira  questão  que  se  impõe  examinar  diz  respeito à hierarquia dos princípios reitores da execução.

 

Para o objetivo do presente estudo, trata-se de cotejar o princípio da execução mais eficaz com o assim mal denominado princípio da execução menos gravosa; na verdade, regra exceptiva da execução menos gravosa.  Neste particular, é preciso resgatar a consideração básica de que o princípio da execução mais eficaz prevalece sobre a regra da execução menos gravosa.  Essa consideração decorre tanto de fundamento lógico quanto de fundamento axiológico.  O fundamento lógico radica na circunstância de que a execução forçada impõe-se como sucedâneo do não-cumprimento espontâneo da sentença:  a execução forçada somente se faz necessária porque o executado não cumpre a obrigação espontaneamente; citado para pagar, o executado omite-se. O fundamento axiológico radica no fato de que o equilíbrio da ordem jurídica somente se restaura com a reparação do direito violado mediante o cumprimento da obrigação estabelecida na sentença; cumprimento coercitivo, regra geral.

 

Nesse particular, vem à memória a clássica observação feita por Alfredo Buzaid na Exposição de Motivos do Código de Processo Civil de 1973. Sob a inspiração das lições de Enrico Tullio Liebman, o processualista assentou:  “Na execução, ao contrário, há desigualdade entre o exequente e o executado. O exequente tem posição de preeminência; o executado, estado de sujeição. Graças a essa situação de primado que a lei atribui ao exequente, realizam-se atos de execução forçada contra o devedor, que não pode impedi-los, nem subtrair-se a seus efeitos. A execução se presta, contudo, a manobras protelatórias, que arrastam os processos por anos, sem que o Poder Judiciário possa adimplir a prestação jurisdicional.”[28]

  

A superioridade hierárquica do princípio da execução mais eficaz sobre a regra exceptiva da execução menos gravosa, além de decorrer de fundamento lógico e axiológico, encontra confirmação na dimensão tópico-sistemática do ordenamento jurídico, porquanto as fontes normativas desses preceitos estão localizadas em dispositivos legais hierarquizados em uma determinada estrutura normativo-sistemática, típica das codificações. Nessa estrutura normativo-sistemática, a regra geral precede a exceção. Examinemos esse aspecto tópico-sistemático.  A  regra  geral  vem  antes  e traz a premissa básica; depois, vem a hipótese de exceção. Examinemos esse aspecto tópico-sistemático.

  

Enquanto o princípio da execução mais eficaz está implícito no preceito do art. 797 do CPC de 2015,  que  fixa   a  diretriz básica de que   realiza-se a execução no interesse do exequente, a regra exceptiva da execução menos onerosa está prevista no art. 805 do CPC de 2015.  Ambos os preceitos estão localizados no capítulo que trata das disposições gerais sobre a execução.  Porém, o art. 797  precede  ao art. 805.  Essa precedência tópica expressa a preeminência que o sistema normativo outorga ao credor na fase de cumprimento da sentença, ao estabelecer a diretriz básica de que  “(...) realiza-se a execução no interesse do exequente” (CPC, art. 797).  Além disso, o art. 797 abre o respectivo capítulo do CPC de 2015, fixando a regra geral da execução: a execução realiza-se no interesse do credor.[29]  Já o art. 805 do CPC encerra o capítulo, estabelecendo uma exceção àquela regra geral:  a execução será feita pelo modo menos gravoso para o devedor, quando por vários meios o credor puder promover a execução de modo igualmente eficaz. Daí a conclusão de que parece mais correto identificar a execução menos gravosa como regra exceptiva, o que implica recusar-lhe a condição de princípio com a qual é identificada algumas vezes na doutrina.

  

A natureza excepcional da regra do art. 805 do CPC torna-se ainda mais evidente quando se atenta à diretriz hermenêutica de que o preceito exceptivo deve ser compreendido à luz da regra geral. Em segundo lugar, o emprego do advérbio de tempo  quando – “Quando por vários meios o credor puder promover a execução...” – indica que a regra de exceção terá cabimento somente em determinada situação específica (e sempre no caso concreto), o que exige exame casuístico para se aferir a configuração da hipótese exceptiva. Faz-se necessário que seja possível, no caso concreto, realizar a execução por vários modos igualmente eficazes.[30] E isso constitui exceção na prática, pois geralmente a execução não pode ser realizada por vários modos, com a mesma eficácia. Mas também é necessário que a execução seja igualmente eficaz pelos diversos modos viáveis para a sua realização, a fim de que tenha incidência o preceito excepcional do art. 805 do CPC.[31] E isso também constitui exceção na prática; é que a adoção de um determinado modo de execução costuma tornar a execução mais eficaz, conforme revela a observação da experiência ordinária de que trata o art. 375 do CPC.

 

O preceito do art. 797 do CPC induz a que o juiz já opte pelo meio mais eficaz de concretizar a execução, pois somente assim a execução será realmente realizada no interesse do exequente. Essa interpretação do art. 797 do CPC conforme à Constituição se impõe tanto em face da garantia fundamental da efetividade da jurisdição (CF, art. 5º, XXXV) quanto em face da garantia fundamental da razoável duração do processo (CF, art. 5º, LXXVIII). No âmbito do processo do trabalho, a referida interpretação tem alento hermenêutico na norma que atribui ao juiz a incumbência de velar pela rápida solução da causa (CLT, art. 765[32]). Portanto, somente em situações excepcionais caracterizar-se-á o suporte fático do art. 805 do CPC, porquanto a regra é já se adotar o modo mais eficaz para realizar a execução no âmbito da jurisdição trabalhista, o que implica descartar os modos menos eficazes de realizar a execução.

  

A possibilidade de incidência da regra excepcional do art. 805 do CPC tem por pressuposto já haver sido garantida a prévia observância do comando normativo que estabelece deva ser respeitada, no cumprimento da decisão judicial, a regra geral da execução mais eficaz. Não se trata, portanto, de uma norma para neutralizar a regra geral da execução mais eficaz:  a exceção confirma a regra, não podendo sobrepujá-la.[33]  Trata-se de uma regra exceptiva que permite, desde que esteja assegurada a realização mais eficaz da execução, que a execução seja feita por modo menos gravoso para o executado em determinado caso concreto.  De acordo com a doutrina de Francisco Antonio de Oliveira, é necessário compreender que a execução trabalhista deve ser realizada no interesse do credor e não no interesse do devedor.  O jurista paulista explica: “Menos gravoso não significa que, se houver duas possibilidades de cumprimento da obrigação que satisfaçam da mesma forma o credor, escolher-se-á aquela mais benéfica ao devedor.  Se existirem duas formas de cumprimento, mas uma delas prejudica o credor, escolher-se-á aquela que beneficia o credor.”[34] 

  

Se houver vários modos de promover a execução e todos forem eficazes na mesma medida,  então  – e somente então –  a execução deve ser realizada pelo modo menos gravoso para o executado. Contudo, se a execução for mais eficaz quando realizada pelo modo mais gravoso para o executado, tem aplicação a regra geral do art. 797 do CPC: adota-se a execução desse modo, não por ser o modo mais gravoso, mas por ser o modo mais eficaz no caso concreto.  Da mesma forma, adota-se o modo menos gravoso quando for ele o modo mais eficaz para a execução, não por ser o modo menos gravoso, mas por ser o modo mais eficaz no caso concreto. 

           

Não se poderia encerrar este capítulo do presente ensaio sem fazer o registro de que o legislador do CPC de 2015 resgatou o melhor conceito de execução mais eficaz, de forma pragmática, como convém à efetividade da execução.  Ao introduzir o parágrafo único no art. 805 do CPC, o legislador de 2015 equacionou de forma acertada a relação hierárquica existente entre execução mais eficaz e execução menos onerosa.  A ausência de tal preceito no CPC de 1973 gerou as distorções hermenêuticas denunciadas por Cândido Rangel Dinamarco, distorções que poderão ser superadas diante da pragmática regra do parágrafo único do art. 805 do CPC, assim redigido:  “Ao executado que alegar ser a medida executiva mais gravosa incumbe indicar outros meios mais eficazes e menos onerosos, sob pena de manutenção dos atos executivos já determinados.”[35]

           

Note-se que o preceito exige que o executado indique um meio mais eficaz para a execução do que o meio adotado pelo juízo.[36] Não basta que o executado indique um meio menos oneroso para a realização da execução. Ao executado incumbe indicar um meio que seja menos oneroso e, ao mesmo tempo, mais eficaz do que aquele adotado pelo juízo da execução.[37]  Na vigência do CPC de 1973, certa incompreensão acerca da relação hierárquica existente entre execução mais eficaz e execução menos onerosa acarretava a distorção de interpretar-se que ao executado incumbia indicar apenas um meio menos oneroso para realizar-se a execução, ainda que tal meio implicasse numa execução menos eficaz. Na prática, essa interpretação acarretava uma subversão dos valores na fase de execução de sentença: a regra exceptiva anulava a regra geral.  

           

Ao invés de prevalecer a regra geral da execução mais eficaz, acabava prevalecendo a regra exceptiva da execução menos gravosa para o devedor, o que gerava a inversão de valores denunciada também por Francisco Antonio de Oliveira. O preceito do parágrafo único do CPC de 2015 tem o claro propósito de corrigir tal distorção. Ao atribuir ao executado o ônus de indicar meio executivo mais eficaz, o legislador visou esvaziar conhecidas alegações infundadas de que a execução realiza-se de modo mais gravoso. O ônus da argumentação restou explicitamente atribuído ao executado que alegar execução mais onerosa:  “Se o executado não se desincumbir desse encargo processual, a consequência será a manutenção dos atos executivos já determinados pelo juiz”, conforme preleciona Manoel Antonio Teixeira Filho na interpretação do preceito em estudo.[38]  Como é de fácil intuição, será muito difícil para o executado desincumbir-se do encargo processual de indicar um modo mais eficaz para realizar-se a execução do que o modo de execução determinado pelo juízo.

 

 

 

4 A natureza alimentar do crédito trabalhista como fonte material de direito

  

A baixa eficácia da execução atenta contra a garantia constitucional da jurisdição efetiva (CF, art. 5º, XXXV).  Daí a doutrina ter evoluído para postular uma nova interpretação para a regra exceptiva da execução menos gravosa.  Isso porque a aplicação do art. 620 do CPC de 1973 dificultava o êxito das execuções, quadro que colocava em questão a própria eficiência do Poder Judiciário.[39]

  

No processo civil, a execução tem o executado em situação de inferioridade econômica em relação ao exequente, ao passo que, no processo do trabalho, é o exequente a parte que se encontra em situação de hipossuficiência econômica em relação ao executado.  A situação inverte-se. E a hermenêutica impõe ao juiz atender aos fins sociais na aplicação da lei (LINDB, art. 5º). A parte hipossuficiente não tem condições econômicas para resistir à demora processual.  Vai se tornando cada vez mais vulnerável a acordos prejudiciais.

  

Sendo o executado a parte hipossuficiente no processo civil, compreende-se que a regra exceptiva da menor onerosidade possa socorrer-lhe eventualmente.  Porém, mesmo no processo civil esse socorro somente se faz viável depois de assegurado que a execução vai de fato ser realizada no interesse do credor (CPC, art. 797). Vale dizer, esse socorro está condicionado à prevalência da eficácia da execução. Nesse particular, a execução civil será realizada da forma menos gravosa somente depois de garantida a maior eficácia para sua consumação. Em outras palavras, mesmo no processo civil, sobretudo depois das referidas minirreformas legislativas realizadas no CPC de 1973, a execução deve ser realizada pelo modo mais eficaz, independentemente de ser o modo mais ou menos gravoso. 

 

Não é a maior ou a menor gravosidade que define o modo pelo qual a execução civil realizar-se-á.  A execução civil realizar-se-á pelo modo mais eficaz. Essa é a interpretação que se impunha à leitura do art. 620 do CPC de 1973 após as minirreformas legislativas realizadas no processo civil.   Isso porque as minirreformas legislativas reforçaram o compromisso do sistema processual civil com a efetividade da execução, o que realça a idéia de que o preceito exceptivo do art. 620 do CPC de 1973 subordinava-se à regra geral do art. 612 do CPC de 1973.  A execução civil realiza-se no interesse do credor.  Esse princípio preside a execução. De modo que, para a consecução da execução, o magistrado orientar-se-á pela maior eficácia do procedimento executivo. Essa interpretação, que se impõe na execução civil, é ainda mais imperiosa na execução trabalhista.

 

A postulação pela não aplicação da regra exceptiva da  execução menos gravosa no processo do trabalho decorre de um fundamento sócio-econômico específico à relação jurídica de direito material do trabalho. Trata-se da natureza alimentar do crédito trabalhista, que opera como fonte material de direito.  Esse elemento sociológico é decisivo, pois se cuida da tutela jurídica da própria subsistência da pessoa do trabalhador.[40]  Não se precisa sequer recordar que o interesse econômico do empregador subordina-se ao interesse de sobrevivência digna do trabalhador.  Basta pensar que a execução trabalhista visa recompor, e “a posteriori”, o equilíbrio decorrente do descumprimento da legislação do trabalho já ocorrida há muito tempo. Se no processo civil, o executado costuma ostentar situação econômica de inferioridade em relação ao exeqüente, no processo do trabalho a situação é oposta – o exeqüente é a parte hipossuficiente.  Daí a necessidade de tutela jurídica efetiva, sem demora. 

 

 

 

5 É o resultado social negativo que muda o paradigma teórico

  

Os modelos teóricos não costumam progredir por força de insights dos cientistas. Se a aplicação de determinado modelo teórico produz resultado social negativo, aí então o paradigma ingressa num ambiente de questionamento teórico, com vistas à produção de um novo resultado social aceitável.  Em outras palavras, é o resultado social alcançado pelo modelo teórico adotado que interroga o paradigma científico.  Boaventura de Sousa Santos sintetiza assim a influência decisiva que o resultado social tem na ruptura do paradigma científico:  “Só a concepção pragmática da ciência permite romper a circularidade da teoria.”[41]

           

A aplicação da regra exceptiva da execução menos onerosa para o devedor é uma das causas do entrave da execução trabalhista. Vale dizer, o resultado social da aplicação desta regra exceptiva tem sido manifestamente negativo para a efetividade da execução na Justiça do Trabalho.  Isso porque a referida regra tem sido invocada para justificar as principais medidas de resistência à execução trabalhista e tem sido muitas vezes acolhida em detrimento ao princípio da execução mais eficaz, numa verdadeira inversão de valores.  O prejuízo à efetividade da jurisdição trabalhista é evidente. Como lembra  Hermann de Araújo Hackradt,  “nenhum dano se torna maior do que o próprio desvirtuamento do conceito de Justiça Social através de um procedimento ineficaz e demorado, principalmente quando se tem em contraposição uma correlação de forças absolutamente desigual.”[42]

           

Esse aspecto não escapou à percepção de Leonardo Dias Borges.  Examinando os efeitos nocivos decorrentes da aplicação da regra da  execução  menos  gravosa no âmbito da execução trabalhista, o jurista identifica no art. 620 do CPC de 1973 uma das causas da ineficácia da jurisdição trabalhista e pondera: “Procrastinar desnecessariamente o processo, sob o falacioso argumento da ampla defesa e dos demais institutos que norteiam a execução civil, por vezes incompatíveis, em sua totalidade, com a execução trabalhista,  é desumanizar o direito,  bem como desconhecer-lhe a origem e a finalidade”.[43] 

           

Também Carlos Eduardo Oliveira Dias e Ana Paula Alvarenga Martins perceberam os concretos efeitos deletérios que a aplicação do art. 620 do CPC de 1973 no processo do trabalho tem causado à efetividade da execução trabalhista, conforme revela esta realista observação:  “...o objetivo principal da execução é a satisfação do crédito, não podendo ser invocado o art. 620 do CPC como forma de suprimir a verdadeira efetividade do processo, transformando a execução, que seria um direito do credor, em um verdadeiro suplício.”[44]  A cultura jurídica criada a partir da distorcida interpretação do art. 620 do CPC de 1973 tem deturpado a idéia de respeito às decisões judiciais, justificando infundados atos de resistência ao cumprimento das sentenças, de modo que resistir ao cumprimento da sentença tem se tornado um procedimento contumaz, capaz de ensejar inúmeros incidentes – a maioria, protelatórios – destinados a eternizar as demandas.

           

O executado tem o dever jurídico de pagar; mas na prática parece deter um direito fundamental de não pagar, tamanha é a resistência que opõe, muitas vezes sob a alegação de que a execução deve ser realizada de forma menos gravosa.  Francisco Antonio de Oliveira,  sempre atento às consequências práticas da aplicação da legislação, observa que, na vigência do art. 620 do CPC 1973,  “em vez de honrar a obrigação, a empresa procrastina a execução com o uso de inúmeros expedientes processuais e aplica o dinheiro em seu capital de giro, cujo rendimento servirá para saldar a execução de forma vantajosa.  Isso quando não vence o exequente pela demora e acaba por fazer um acordo vantajoso, com o pagamento de valor irrisório, depois de ganhar a ação e esperar vários anos.” [45]

           

Assim compreendida a questão, a não aplicação da regra da execução menos gravosa no processo do trabalho é condição para a realização das garantias constitucionais da efetividade da jurisdição e da duração razoável do processo.  Essa conclusão se torna ainda mais consistente diante da teoria jurídica contemporânea, que extrai da ordem constitucional a existência de uma garantia fundamental à tutela executiva efetiva. Explicitando sua adesão a essa concepção doutrinária, o CPC de 2015 preceitua que “as partes têm direito de obter em prazo razoável a solução integral do mérito, incluída a atividade satisfativa.”  Essa norma está positivada no art. 4º do novo CPC. Inserida no capítulo que trata das normas fundamentais do processo civil, o preceito do art. 4º do CPC explicita estar a satisfação do julgado compreendida no direito das partes a uma solução integral da causa, o que revela que o novo CPC assimila a concepção contemporânea de que existe uma garantia fundamental à tutela executiva efetiva.

  

Mas haveria fundamento para acolher tal conclusão?  Diversos juristas vem afirmando que sim.

 

 

 

6 A doutrina pela não aplicação da regra exceptiva da execução menos gravosa ao processo do trabalho       

  

Se alguns juristas limitam-se a mitigar a aplicação da regra exceptiva da execução menos gravosa no processo do trabalho, outros juristas são categóricos em sustentar a inaplicabilidade dessa regra na execução trabalhista.

           

Enquanto Francisco Meton Marques de Lima pondera que a execução  “deve ser econômica, da forma menos gravosa para o executado, desde que satisfaça, de maneira mais efetiva possível, o direito do exequente”, [46] Carlos Henrique Bezerra Leite faz um resgate autêntico da autonomia do direito processual do trabalho e propõe “inverter a regra do art. 620 do  CPC [de 1973] para construir uma nova base própria e específica do processo laboral: a execução deve ser processada de maneira menos gravosa ao credor.”[47] 

  

A posição de Cláudio Armando Couce de Menezes é semelhante àquela defendida por Carlos Henrique Bezerra Leite.  Depois de fundamentar seu posicionamento na condição de inferioridade econômica do trabalhador, Couce de Menezes sustenta que  “... não cabe perquirir se a execução pode ser feita de forma menos onerosa ao empregador executado.  Mas, sim, como fazê-lo de maneira a torná-la mais rápida, célere e efetiva, evitando manobras do devedor destinadas a impedir ou protelar a satisfação do crédito obreiro.”[48]

  

Para José Augusto Rodrigues Pinto a aplicação da regra da execução menos gravosa ao processo do trabalho não passa pelo crivo do art. 769 da CLT.  Entende o erudito jurista baiano que não se faz presente no caso o requisito da compatibilidade do art. 620 do CPC de 1973 com os princípios do Direito Processual do Trabalho. 

  

A consistência da fundamentação justifica a reprodução integral do argumento. Pondera o jurista: “Reflita-se imediatamente sobre o pressuposto da compatiblidade, fixado no art. 769 da CLT para autorizar a aplicação supletiva da norma de processo comum ao sistema processual trabalhista.  O art. 620 do CPC é, evidentemente, tutelar do interesse do devedor, exposto à violência da constrição.  A tutela é bastante compreensível dentro de um sistema processual que navega em águas de interesse processuais caracteristicamente privados, porque oriundos de relação de direito material subordinada à idéia da igualdade jurídica e da autonomia da vontade. O sistema processual trabalhista flutua num universo dominado pela prevalência da tutela do hipossuficiente econômico, que se apresenta como credor da execução trabalhista. Em face da evidente oposição de pressupostos, sustentamos que, em princípio, o art. 620 do CPC não pode suprir a omissão legal trabalhista, por ser incompatível com a filosofia tutelar do economicamente fraco, que lhe dá caráter. Sua aplicação coloca em confronto a proteção do interesse econômico do devedor (a empresa) e o direito alimentar do credor (o empregado), a cujo respeito não pode haver hesitação de posicionamento do juiz do trabalho ao lado do empregado.”[49]

           

A incompatibilidade do art. 620 do CPC de 1973 com o direito processual do trabalho também é afirmada por José Carlos Külzer.  Para o autor, o princípio da proteção deve ser aplicado também na fase de execução, “... não podendo assim ser transposta para o Processo do Trabalho, pura e simplesmente, a recomendação do art. 620 do Código de Processo Civil de que a execução se processe pelo modo menos gravoso ao devedor, sem ser considerado que tal regra tem como pressuposto a igualdade das partes na fase de conhecimento, o que não acontece, no entanto, no Direito do Trabalho.”[50]

           

O aperfeiçoamento do processo do trabalho postulado por Wagner D. Giglio tem em Sérgio Pinto Martins um de seus mais lúcidos defensores: “Na execução trabalhista deveria ser abandonado o princípio da execução menos onerosa para o devedor (art. 620 do CPC), para a mais eficiente e rápida, mas sempre prestigiando o contraditório e a ampla defesa.”[51]

           

A orientação indicada pelo jurista paulista recebeu um importante reforço com o advento do novo CPC, cujo art. 805, parágrafo único, atribui ao executado o ônus de indicar meio mais eficaz para realizar a execução, quando alegar a gravosidade do meio de execução adotado pelo juízo. Como observa Cassio Scarpinella Bueno, o objetivo do preceito é evitar requerimentos inidôneos do executado que reclama de execução gravosa,[52] exigindo do executado o cumprimento do dever de colaboração no requerimento em que postule execução menos gravosa.

           

O parágrafo único do art. 805 do CPC de 2015, conforme assinalado anteriormente, tem o mérito de resgatar a devida posição de preeminência do exequente na execução, ao atribuir ao executado, que se encontra em estado de sujeição, o encargo de indicar meios mais eficazes para realizar-se a execução, sempre que alegar ser a medida executiva adotada pelo juízo mais gravosa. Já não basta ao executado indicar meio de execução menos gravoso, como se costumava tolerar na vigência do CPC de 1973. Além de indicar meio executivo menos gravoso, o meio de execução indicado pelo executado deverá ser, também, mais eficaz do que o meio de execução empregado, sob pena de manutenção dos meios executivos adotados pelo juízo da execução.

                       

 

 

Conclusão

 

Se uma certa tradição moderna logrou persuadir os operadores jurídicos de que a fase de conhecimento é a mais importante, aos jurisdicionados sempre foi intuitiva a percepção de que a fase mais importante do processo é a fase de execução.  É natural que assim seja: a parte quer ver seu direito realizado, e não apenas declarado. Essa tradição moderna conduziria os operadores jurídicos a acreditar que o charme está na intelecção; o glamour está na cognição. E já não poderíamos mais escapar da consequente distorção: à sobrevalorização da fase de cognição corresponderá velado menoscabo à fase de execução.  Trata-se do “mito da cognição” de que fala Luciano Athayde Chaves[53], uma estranha espécie de gás paralisante da execução, com deletérios efeitos colaterais; entre eles, o torpor cultural da execução menos gravosa, para o qual ainda procuramos antídoto.

 

O fato é que não temos cumprido a solene promessa constitucional de prestar jurisdição efetiva. A eloquente advertência de Cândido Rangel Dinamarco nos interroga sobre a própria funcionalidade do Estado.

 

Renunciar a uma herança nunca é fácil. Tratando-se de uma herança cultural, essa renúncia torna-se ainda mais difícil. Não sabemos se seremos capazes de abandonar esse legado. Mas é preciso fazê-lo: dar à execução a primazia significa pensar o direito para os jurisdicionados. São eles os destinatários da Jurisdição.    

 

Uma adequada hermenêutica para a execução trabalhista tem como primeira fonte de direito a Constituição Federal.  Mais precisamente, o ponto de partida está na garantia constitucional da inafastabilidade da jurisdição (CF, art. 5º, XXXV), aqui compreendida como a concreta garantia de alcançar o pagamento do crédito trabalhista previsto na sentença.  Além disso, tal pagamento deve ser realizado em prazo breve (CF, art. 5º, LXXVIII). A imperatividade desses comandos constitucionais ganha ainda maior densidade sob o influxo do princípio jurídico da proteção, que inspira o direito material do trabalho, mas também se comunica ao direito processual do trabalho, porquanto se trata de execução de crédito de natureza alimentar (CF, art. 100, § 1º) a que a ordem legal confere privilégio diante de créditos de outra natureza jurídica (CTN, art. 186); mais do que isso, se trata de crédito representativo de direito fundamental social (CF, art. 7º, caput),  qualificado  na  jurisprudência  cível como  crédito necessarium vitae.             

  

No esforço hermenêutico desenvolvido para dotar a jurisdição trabalhista de maior efetividade, a jurisprudência evoluiu para afirmar que a existência de previsão legal de que a arrematação realizar-se-á pelo maior lanço (CLT, art. 888, § 1º) é fundamento jurídico suficiente para afastar a aplicação subsidiária do conceito de preço vil previsto no art. 692 do CPC de 1973 (CPC de 2015, art. 891) na execução trabalhista, por inexistência de omissão do processo do trabalho nessa matéria (CLT, arts. 769 e 889).

           

Assim como a execução trabalhista ganhou efetividade ao rejeitar a aplicação subsidiária do art. 692 do CPC de 1973, é chegado o momento de evoluir para, agora por incompatibilidade (CLT, arts. 769 e 889), rejeitar a aplicação da regra exceptiva da execução menos gravosa na execução trabalhista, para promover o resgate da vocação do Processo do Trabalho como processo de resultados.  

           

A propósito de efetividade da execução, é interessante recordar a consideração com a qual Wagner D. Giglio inicia o texto - histórico - que fornece a epígrafe do presente artigo:  “Um hipotético observador, nos últimos anos deste século, provavelmente consideraria nosso atual processo, em geral, e o trabalhista, em particular, com o espanto e a incredulidade que, hoje, nos despertam os  ‘juízos de Deus’  e a Justiça Medieval.  E perguntaria a si mesmo como teriam os jurisdicionados de nossos dias suportado o suplício de aguardar a solução de sua demanda por anos e anos, sem desespero ou revolta.”[54]

           

No referido artigo, publicado em 2003, Wagner D. Giglio afirmou: “Uma reforma ideal do processo trabalhista abandonaria o dogma da igualdade das partes e adotaria, na execução, o princípio da execução mais eficaz, em substituição ao da execução menos onerosa”.[55]  Desde então passaram quinze anos.  Nesse período, sobreveio a Emenda Constitucional nº 45/2004, que elevou a duração razoável do processo à condição de garantia fundamental do cidadão, e o novo CPC fez clara opção pela efetividade da execução (CPC, arts. 139, IV e 297), instituindo no art. 805, parágrafo único, saneadora norma para execução, norma pela qual se resgata a devida posição de preeminência do exequente na execução, ao atribuir ao executado, que se encontra em estado de sujeição, o encargo de indicar meio mais eficaz para realizar-se a execução, sempre que alegar ser, a medida executiva adotada pelo juízo, mais gravosa.

                       

 

 

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[1] GIGLIO, Wagner D. Efetividade da execução trabalhista.  Revista Síntese Trabalhista, Porto Alegre, n. 172, p. 146, out. 2003.   

 

[2] CPC de 1973: “Art. 620. Quando por vários meios o credor puder promover a execução, o juiz mandará que se faça pelo modo menos gravoso para o devedor.”

 

[3] CPC de 2015: “Art.805. Quando por vários meios o exequente puder promover a execução, o juiz mandará que se faça pelo modo menos gravoso para o executado.”

 

[4]   PINTO, José Augusto Rodrigues. Execução trabalhista. 11. ed. São Paulo: LTr, 2006, p. 213.

 

[5]  GIGLIO, op. cit. , p. 147.   

 

[6] Antes da Lex Poetelia (século V), a Lei das XII Tábuas autorizava o credor a escravizar e até matar o devedor.

 

[7] “Convém salientar a extraordinária e temível eficácia das decisões da justiça inglesa que não podem ser ridicularizadas, não havendo nenhuma exceção a esse princípio.  Os tribunais recorrem para a execução das suas decisões a verdadeiras ordens que, se não são respeitadas, são passíveis de sanções muito severas (contempt of Court), podendo chegar até a prisão.”  (Roland Séroussi. Introdução ao Direito inglês e norte-americano. São Paulo: Landy, 2006, p. 24, grifo nosso).

 

[8] Súmula Vinculante nº 25 do STF:  “É ILÍCITA A PRISÃO CIVIL DE DEPOSITÁRIO INFIEL, QUALQUER QUE SEJA A MODALIDADE DO DEPÓSITO.”

 

[9] Entre os enunciados propositivos da Jornada Nacional sobre Execução na Justiça do Trabalho realizada pela Associação Nacional dos Magistrados do Trabalho – Anamatra, em novembro de 2010, em Cuiabá – MT está a proposta de revisão parcial da Súmula Vinculante nº 25 do STF, nos seguintes termos:  “PRISÃO POR ‘CONTEMPT OF COURT’ NO PROCESSO DO TRABALHO.  PRISÃO DO DEPOSITÁRIO JUDICIAL INFIEL ECONOMICAMENTE CAPAZ. POSSIBILIDADE JURÍDICA. NECESSIDADE DE REVISÃO PARCIAL DA SÚMULA VINCULANTE Nº 25 DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (STF).  A prisão civil do depositário judicial economicamente capaz, por estar autorizada pela norma do art. 5º, LXVI, parte final, da Constituição Federal, não se resume à mera ‘prisão civil por dívidas’.  Tem natureza bifronte, consubstanciando também medida de defesa da autoridade pública e da dignidade do Poder Judiciário, à maneira de ‘contempt of court’, o que não está vedado pelo Pacto de San José da Costa Rica.”

 

[10] BRASIL. Constituição (1988): “Art. 100.  Os pagamentos devidos pelas Fazendas Públicas Federal, Estaduais, Distrital e Municipais, em virtude de sentença judiciária, far-se-ão exclusivamente na ordem cronológica de apresentação dos precatórios e à conta dos créditos respectivos, proibida a designação de casos ou de pessoas nas dotações orçamentárias e nos créditos adicionais abertos para este fim.

§ 1º.  Os débitos de natureza alimentícia compreendem aqueles decorrentes de salários, vencimentos, proventos, pensões e suas complementações, benefícios previdenciários e indenizações por morte ou por invalidez, fundadas em responsabilidade civil, em virtude de sentença judicial transitada em julgado, e serão pagos com preferência sobre todos os demais débitos, exceto aqueles referidos no § 2º deste artigo.”

 

[11] BAPTISTA DA SILVA, Ovídio A. Processo e ideologia: o paradigma racionalista. Rio de Janeiro:  Forense, 2004, p. 200.

 

[12]  CPC de 2015: “Art. 139. O juiz dirigirá o processo conforme as disposições deste Código, incumbindo-lhe:

IV – determinar todas as medidas indutivas, coercitivas, mandamentais ou sub-rogatórias necessárias para assegurar o cumprimento de ordem judicial, inclusive nas ações que tenham por objeto prestação pecuniária.”

 

[13] CPC de 2015: “Art. 297. O juiz poderá determinar as medidas que considerar adequadas para a efetivação da tutela provisória.”

 

[14] O desenvolvimento da compreensão do art. 765 da CLT enquanto norma de sobredireito aguarda pelos pesquisadores mais ousados da Ciência Processual Trabalhista.

 

[15] MARINONI, Luiz Guilherme e ARENHART, Sérgio Cruz. Curso de Processo Civil – Execução. v. 3. 6 ed. São Paulo: RT, 2014. p. 51. Ao comentar os arts. 461 e 461-A do CPC de 1973, os autores assentam que “... o juiz está autorizado a determinar a modalidade de execução adequada a cada caso concreto.”  Na avaliação do alcance da norma do § 5º do  art. 461 do CPC de 1973, os autores observam que “... o juiz pode determinar a ‘medida necessária’, exemplificando com a busca e apreensão de pessoas e coisas, o desfazimento de obras e o impedimento de atividade nociva”. E concluem que “estas normas evidenciam a superação do princípio da tipicidade, deixando claro que, para o processo tutelar de forma efetiva as várias situações de direito substancial é indispensável não apenas procedimentos e sentenças diferenciados, mas também que o autor e o juiz tenham amplo poder para requerer e determinar a modalidade executiva adequada ao caso concreto” (p. 51).

 

[16] Medidas sub-rogatórias, coercitivas, mandamentais e indutivas no Código de Processo Civil de 2015. Revista de Processo. vol. 247. Ano 40. pp. 231-246. São Paulo: RT, set. 2015. p. 237

 

[17]  FAVA, Marcos Neves. Execução trabalhista efetiva. São Paulo: LTr, 2009, p. 156.

 

[18] Daniel Amorim Assumpção Neves pondera que “(...) o processo não passa de mera enganação” quando o princípio da menor onerosidade não é interpretado à luz do princípio da efetividade da tutela executiva (Novo CPC comentado artigo por artigo. Salvador: Juspodivm, 2016. p. 1276).

 

[19]  DINAMARCO, Cândido Rangel. Instituições de direito processual civil. 3. ed. São Paulo: Malheiros, 2009, v. 4, p. 63.

 

[20] O CPC de 2015 cuidou de explicitar que a satisfação do credor integra o direito fundamental da parte à prestação jurisdicional. É o que se recolhe da previsão do art. 4º do novo CPC: “Art. 4º. As partem têm o direito de obter em prazo razoável a solução integral do mérito, incluída a atividade satisfativa.”  Sublinhamos.

 

[21] DINAMARCO, op. cit., p. 63.

 

[22] DINAMARCO, op. cit., p. 63.

 

[23]  CONTI, Paulo Henrique.  A nova sentença condenatória: uma abordagem ideológica. In: SANTOS, José Aparecido dos (Coord.).  Execução TrabalhistaAmatra X. 2. ed. São Paulo: LTr, p. 77.

 

[24]  FAVA, Marcos Neves. Execução trabalhista efetiva. São Paulo: LTr, 2009, p. 156.  Pondera o autor: “No plano da principiologia, mais comum do que os deveres de cooperação do executado, faz-se presente a evocação do art. 620 do Código de Processo Civil, que dá ao devedor o direito de ter contra si a execução menos gravosa.  Ora, o advérbio de comparação – menos – tem por pressuposto a existência de dois modos igualmente suficientes e eficazes para a realização concreta do título executivo.”

 

[25] SILVA, Antônio Álvares da.  Execução provisória trabalhista depois da Reforma do CPC. São Paulo: LTr, 2007, p. 65-66.

 

[26]  SILVA, Antônio Álvares da.  Execução provisória trabalhista depois da Reforma do CPC. São Paulo: LTr, 2007, p. 65-66.

 

[27]  OLIVEIRA, Francisco Antonio de.  Execução na Justiça do Trabalho. 6. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007, p. 40.

 

[28] BUZAID, Alfredo. Exposição de Motivos do Código de Processo Civil de 1973, item 18.

 

[29] É intuitivo que a regra geral de que a execução realiza-se no interesse do exequente deve ganhar maior densidade em se tratando de execução de título executivo judicial.

 

[30] A lição de Luiz Guilherme Marinoni, Sérgio Cruz Arenhart e Daniel Mitidiero é neste sentido:  “Observe-se que a aplicação do art. 805, CPC, pressupõe a existência de várias técnicas processuais igualmente idôneas para a realização do direito do exequente. Obviamente, o juiz não pode preferir técnica processual inidônea, ou menos idônea que outra também disponível, para a realização do direito, a pretexto de aplicar o art. 805. A execução realiza-se no interesse do exequente, que tem direito à tutela jurisdicional adequada e efetiva (arts. 5º, XXXV, CF, e 797, CPC)” (Novo Código de Processo Civil comentado. 2 ed. São Paulo: RT, 2016. p. 877).

 

[31] Luiz Guilherme Marinoni, Sérgio Cruz Arenhart e Daniel Mitidiero advertem: “Todavia, o art. 805, CPC, não se aplica na concorrência de técnicas processuais idôneas e inidôneas. A aplicação do art. 805, CPC, neste último contexto, violaria os arts. 5º, XXXV, CF, e 797, CPC” (Novo Código de Processo Civil comentado. 2 ed. São Paulo: RT, 2016. p. 877).

 

[32] CLT: “Art. 765. Os juízos e Tribunais do Trabalho terão ampla liberdade na direção do processo e velarão pelo andamento rápido das causas, podendo determinar qualquer diligência necessária ao esclarecimento delas.”

 

[33] Não há contradição entre as normas dos arts. 797 e 805 do CPC.  Isso porque, conforme pondera Manoel Antonio Teixeira Filho, “a preeminência axiológica é do art. 797; ao redigir o art. 805, o legislador não teve a intenção de neutralizar o art. 797, senão que impor uma espécie de regra de temperamento em sua aplicação prática. Destarte, sem que a execução deixe de processar-se no interesse do credor, em algumas situações ela deverá ser realizada pelo modo menos gravoso ao devedor.” (Comentários ao novo Código de Processo Civil sob a perspectiva do Processo do Trabalho. 2 ed. São Paulo: LTr, 2016. p. 892)

 

[34] OLIVEIRA, op. cit., p. 93.

 

[35] Para Cristiano Imhof e Bertha Stecker Rezende, “Este inédito parágrafo único determina de forma expressa que é ônus e incumbência do executado que alegar ser a medida executiva mais gravosa, indicar outros meios mais eficazes e menos onerosos, sob pena de manutenção dos atos executivos já determinados” (Comentários às alterações do novo CPC. São Paulo: RT, 2015. p. 836).

 

[36] Luiz Guilherme Marinoni, Sérgio Cruz Arenhart e Daniel Mitidiero afirmam que a alegação pode ser rejeitada se o executado não se desincumbir do encargo processual de indicar outros meios tão eficazes quanto o meio executivo adotado pelo juízo: “Não havendo essa demonstração, o juiz pode rejeitar de plano a alegação” (Novo Código de Processo Civil comentado. 2 ed. São Paulo: RT, 2016. p. 877).

 

[37]  Leonardo de Faria Beraldo critica a redação do preceito. Pondera que o legislador deveria ter utilizado o vocábulo “tão” eficazes ou invés do vocábulo “mais” eficazes, ao atribuir ao executado o encargo processual de “indicar outros meios mais eficazes” quando alegar que a execução realiza-se de modo mais gravoso para o executado (Comentários às inovações do Código de Processo Civil. Belo Horizonte: Del Rey, 2015. p. 309).  Parece, entretanto, que o legislador objetivou estreitar a possibilidade de invocação do argumento da execução menos onerosa em face da histórica experiência de ineficácia da execução judicial, experiência essa construída sob alegações artificiosas de execução mais gravosa.  Parece mais consentânea a consideração doutrinária de Guilherme Rizzo Amaral:  “O atual CPC dá uma guinada importante ao afirmar a prevalência da efetividade da execução sobre o princípio da menor onerosidade. Reflexo disso é a total superação da referida Súmula [417 do STJ], com a instituição da prioridade da penhora em dinheiro (art. 835, I e § 1º), da qual não pode abdicar em favor da penhora sobre outro bem, e também o parágrafo único do art. 805, segundo o qual passa a ser ônus do executado, ao ventilar a aplicação do princípio da menor onerosidade, demonstrar existirem outros meios mais eficazes e menos onerosos para a satisfação do crédito do exequente” (Comentários às alterações do novo CPC. São Paulo: RT, 2015. p. 836).

 

[38] Comentários ao novo Código de Processo Civil sob a perspectiva do Processo do Trabalho. 2 ed. São Paulo: LTr, 2016. p. 893.

 

[39]  BRASIL. Constituição (1988):  “Art. 37.  A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal   e  dos   Municípios  obedecerá  aos princípios  da  legalidade,  impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência...”.

 

[40] Detentor de privilégio legal na ordem jurídica brasileira (CTN, art. 186), o crédito trabalhista tem sido identificado na jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça como crédito necessarium vitae (STJ STJ. 1ª Turma. Recurso Especial nº 442.325. Relator Min. Luiz Fux. DJU 25.11.2002, p. 207).

 

[41]  SANTOS, Boaventura de Sousa.  Introdução a uma ciência pós-moderna. 2. ed. Porto: Afrontamento, 1990, p. 170:  “A concepção pragmática da ciência e, portanto, da verdade do conhecimento científico parte da prática científica enquanto processo intersubjectivo que tem eficácia específica de se justificar teórica e sociologicamente pelas consequências  que produz na comunidade científica e na sociedade em geral.  Por isso, existe uma pertença mútua estrutural entre a verdade epistemológica e a verdade sociológica da ciência e as duas não podem ser obtidas, ou sequer pensadas, em separado.  Porque só são aferíveis pela sua eficácia produtiva, são indiretas e prospectivas.  Só a concepção pragmática da ciência permite romper com a circularidade da teoria.”

 

[42] HACKRADT, Hermann de Araújo. Princípios da execução e o art. 620 do CPC. In: Castro, Maria do Perpétuo Socorrro Wanderley de. Processo de execução: homenagem ao Ministro Francisco Fausto. São Paulo: LTr, 2002, p. 24.

 

[43]  BORGES, Leonardo Dias. O moderno processo do trabalho. São Paulo: LTr, 1997, p. 80.

 

[44]  DIAS, Carlos Eduardo Oliveira; MARTINS, Ana Paula Alvarenga.  Os abusos do devedor na execução trabalhista: estudos de processo de execução. São Paulo: LTr,  2001, p. 182.

 

[45]  OLIVEIRA, op. cit., p. 133.

 

[46]  LIMA, Francisco Meton Marques de.  Manual sintético de processo e execução do trabalho. São Paulo: LTr, 2004, p. 142.

 

[47]  LEITE, Carlos Henrique Bezerra. Curso de direito processual do trabalho. 8. ed. São Paulo: LTr, 2010, p. 977.

 

[48]  MENEZES, Cláudio Armando Couce de. Teoria geral do processo e a execução trabalhista. São Paulo: LTr, 2003, p. 171.

 

[49]  PINTO, op. cit., p. 213.

 

[50]  KÜLZER, José Carlos. A contribuição dos princípios para a efetividade do processo de execução na Justiça do Trabalho no Brasil. São Paulo: LTr, 2008, p. 39-40.

 

[51]  MARTINS, Sergio Pinto. Novos rumos do processo do trabalho. Justiça do Trabalho, Porto Alegre, n. 325, p. 74, jan. 2011.

 

[52] BUENO, Cassio Scarpinella. Projetos de Novo Código de Processo Civil Comparados e Anotados. São Paulo: Saraiva, 2014. p. 384.

 

[53] Os desafios da Execução na Justiça do Trabalho. In: Revista do Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região. nº 36. 2010. p. 65.

 

[54]  GIGLIO, op. cit., p. 146.

 

[55]  GIGLIO, op. cit., p. 147.

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2017