JORNADA DE TRABALHO DOS PROFESSORES NO ENSINO SUPERIOR: INFERÊNCIAS DA NOVA REDAÇÃO DO ART. 318 DA CLT

 

 

 

           AILTON BORGES DE SOUZA

Especialista em Direito e Processo do Trabalho, ex-Diretor de Recursos Humanos Grupo Tiradentes e atual Assessor Jurídico do Grupo; Professor de Direito do Trablho. Professor da Pós-Graduação do Grupo.

 

                         ROSENIURA SANTOS

Mestra em Política Social e Cidadania, Especialista em Direito e Processo do Trabalho, Auditora -fiscal do Trabalho, Professora  Adjunta de Direito do Trabalho Faculdade Pio Décimo.

 

 

 

 

SUMÁRIO: 1.INTRODUÇÃO – 2. PECULIARIDADES DO SERVIÇO EDUCACIONAL – 3.CONSIDERAÇÕES FINAIS – REFERÊNCIAS

 

 

 

 

1 . INTRODUÇÃO

 

O presente estudo tem por objeto  a nova redação do art. 318 da CLT dada pela Lei n. 13.415/2017, de 16 de fevereiro de 2017, que afastou o limite diário de quatro aulas consecutivas e de seis, intercaladas para prestar serviços docentes na mesma instituição de ensino. Pretende-se analisar quais mudanças decorrem da nova redação e seus impactos para o sistema de ensino privado.

 

Busca-se dar resposta a três questões essenciais consistentes em saber qual a jornada do professor e qual a extensão da mudança legislativa, bem como identificar os principais parâmetros jurídicos aplicáveis à atividade docente a partir de então. Para tanto, aborda-se as peculiaridades do serviço educacional no plano constitucional e infraconstitucional a fim de contextualizar a problemática examinada.

 

 

2. PECULIARIDADES DO SERVIÇO EDUCACIONAL

 

O estudo das normas infraconstitucionais trabalhistas em sua interpretação e aplicação deve considerar as especificidades da atividade de ensino sem perder de vista a regulação constitucional sistematicamente considerada. Assim cumpre fixar o panorama constitucional do setor educacional, ressaltando que a educação é um direito fundamental de todos que se destina a assegurar a plena cidadania:

 

[...] o direito a educação não se restringe ao ensino fundamental. Alcança, outrossim, o ensino superior. Com efeito, não teria sentido a Constituição reconhecer, como direito fundamental de defesa, a liberdade de ação ou opção profissional (art. 5º, XIII), se não garantisse o direito de acesso ao ensino universitário. Decerto – e ninguém duvida – que o direito à educação superior destina-se a garantir o pleno exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, de tal sorte que, em razão do reconhecimento explícito do direito fundamental à liberdade de profissão, impõe-se reconhecer o direito fundamental originário a prestações relativamente ao ensino superior. (JR. CUNHA, 2014. p. 706)

 

Com objetivo de oportunizar acesso à educação, mediante autorização do Poder Público, abre-se ao setor privado a prestação deste serviço público por força do disposto na Magna Carta:

 

Art. 209. O ensino é livre à iniciativa privada, atendidas as seguintes condições:

I - cumprimento das normas gerais da educação nacional;

II - autorização e avaliação de qualidade pelo Poder Público.

 

 

O art. 209 da CF vigente declara que o ensino é livre à iniciativa privada, atendidas certas condições, mas lhe impõe o cumprimento das normas gerais da educação nacional especialmente dos seguintes princípios:

 

Art. 206. O ensino será ministrado com base nos seguintes princípios:

I - igualdade de condições para o acesso e permanência na escola;

II - liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar o pensamento, a arte e o saber;

III - pluralismo de idéias e de concepções pedagógicas, e coexistência de instituições públicas e privadas de ensino;

IV - gratuidade do ensino público em estabelecimentos oficiais;

V - valorização dos profissionais da educação escolar, garantidos, na forma da lei, planos de carreira, com ingresso exclusivamente por concurso público de provas e títulos, aos das redes públicas;

VI - gestão democrática do ensino público, na forma da lei;

VII - garantia de padrão de qualidade.

VIII - piso salarial profissional nacional para os profissionais da educação escolar pública, nos termos de lei federal.

 

Foram postos em relevo, os princípios diretamente vinculados ao direito laboral pertinentes à valorização dos professores, especialmente através de planos de carreiras que deverão assegurar estímulos à qualificação e desenvolvimento docente. Destaca-se este aspecto constitucional por ser fundamental perceber que as instituições de ensino privado estão sujeitas a um regime jurídico diferenciado, tendo que ao mesmo tempo cumprir a legislação educacional e trabalhista no que tange à gestão dos docentes cujo desempenho é condição essencial para assegurar a qualidade do ensino.

 

É fundamental também não perder de vista a peculiaridade estampada no  art. 207 da CF/1988 decorrente ao princípio de indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão, que delimita a essência conceitual da docência no ensino superior. Contudo, historicamente a legislação educacional e a legislação trabalhista caminharam em vias opostas e deste modo chocaram com o sistema constitucional, levando as instituições de ensino privado superior a uma verdadeira encruzilhada jurídica, pois, ao cumprirem a legislação educacional determinada pela Lei de Diretrizes e Base da Educação (LDB) e o Decreto 5773/2006 que dispõe sobre a regulação, supervisão e avaliação de instituições de educação superior e cursos superiores de graduação e sequenciais no sistema federal de ensino no que tange ao regime de trabalho do professor, frequentemente, ficaram expostas a passivos trabalhistas. O mesmo ocorrendo, em via diversa, ao cumprir a legislação trabalhista em detrimento das normas educacionais, expondo-se a riscos de prejuízos nas avaliações do Ministério da Educação(SANTOS e BORGES, 2009).

 

A priori, visualiza-se que a mudança legislativa sob exame potencialmente equaliza os parâmetros educacionais e trabalhistas referentes à jornada de trabalho. A solução das questões suscitadas, porém passa pelo estudo sistemático dos preceitos constitucionais relativos ao direito educacional que interagem com o Direito do trabalho como se demonstrará no tópico seguinte. A solução não é simples e não pode ser guiada exclusivamente pela normatização juslaboral. Na hipótese, não incidirá o princípio da norma mais favorável dada a heterogeneidade de regimes normativos uma vez que não se trata, evidentemente, de conflito de normas homogêneas de cunho trabalhista de modo a eleger a mais benéfica para o trabalhador.

 

 

2.1. O REGIME DE TRABALHO DOCENTE E NOVA REDAÇÃO DO ART. 318 DA CLT: UMA NECESSÁRIA SISTEMATIZAÇÃO DAS NORMAS TRABALHISTAS E EDUCACIONAIS

 

A redação atual do artigo 318 da CLT estabelece que:

 

Art. 318 O professor poderá lecionar em um mesmo estabelecimento por mais de um turno, desde que não ultrapasse a jornada de trabalho semanal estabelecida legalmente, assegurado e não computado o intervalo para refeição.

 

Para responder às questões formuladas, primeiramente, investiga-se qual a jornada semanal legalmente estabelecida, o que perpassa também pelo exame da legislação educacional (SANTOS e BORGES, 2009). No que se refere à valorização do professor e a promoção de qualidade educacional, no exercício de sua competência regulatória, exige-se das instituições de ensino superior manter quadro de professores em regime de tempo integral e com titulação de mestres e doutores (um terço), conforme Lei de Diretrizes e Bases:

 

Art. 52º. As universidades são instituições pluridisciplinares de formação dos quadros profissionais de nível superior, de pesquisa, de extensão e de domínio e cultivo do saber humano, que se caracterizam por:

[...]

II - um terço do corpo docente, pelo menos, com titulação acadêmica de mestrado ou doutorado;

III - um terço do corpo docente em regime de tempo integral.

 

Também no que diz respeito ao critério utilizado pelo MEC para definição do regime de trabalho dos professores, estabelece o parágrafo único do Art. 69 do Decreto 5.773/2006, abaixo transcrito:

 

Art. 69 O exercício de atividade docente na educação superior não se sujeita à inscrição do professor em órgão de regulamentação profissional.

Parágrafo único. O regime de trabalho docente em tempo integral compreende a prestação de quarenta horas semanais de trabalho na mesma instituição, nele reservado o tempo de pelo menos vinte horas semanais para estudos, pesquisa, trabalhos de extensão, planejamento e avaliação.

 

O mesmo decreto confere competência regulatória para Conselho Nacional de Educação – CNE nos termo de seu art. 6º, inciso IV:

 

Art. 6º No que diz respeito à matéria objeto deste Decreto, compete ao CNE:

[...]

IV - deliberar sobre as diretrizes propostas pelas Secretarias para a elaboração, pelo INEP, dos instrumentos de avaliação para credenciamento de instituições;

 

Através da Portaria n.º 1.081 de 29 de agosto 2008, o CNE definiu parâmetros e aprovou a estrutura do Instrumento de Avaliação de Cursos de Graduação do Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior – SINAES, determinando três dimensões tendo em vista a qualidade do ensino e indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão conforme estabelecido em seu anexo:

 

 

Dimensões de Avaliação

Pesos

1- Organização didático-pedagógica

40

2 - Corpo Docente, Discente e          Técnico-administrativo

35

3 - Instalações físicas

30

TOTAL

100

 

 

Observe-se que a segunda dimensão está intrinsecamente vinculada à legislação trabalhista o que fica bem evidente na descrição dos critérios a serem avaliados como determinado no anexo da mencionada portaria e, reiteradamente, ratificados nos instrumentos de avaliação do ensino superior:

 

2. Corpo Docente, Discente e Técnico-administrativo

 

2.1.Formação acadêmica, experiência e dedicação do coordenador à administração e à condução do curso.

 

2.2.Caracterização (tempo de dedicação e de permanência sem interrupção), composição e titulação do Núcleo Docente Estruturante (NDE*).

 

2.3.Titulação e experiência do corpo docente e efetiva dedicação ao curso.

 

2.4.Produção de material didático ou científico do corpo docente.

 

2.5.Adequação da formação e experiência profissional do corpo técnico e administrativo.

 

2.6.Adequação, formação e experiência dos docentes em relação à modalidade de EAD (indicador exclusivo para EAD).

 

2.7.Adequação, formação e experiência dos tutores (indicador exclusivo para EAD).

 

2.8. Caracterização (tempo de dedicação e de permanência sem interrupção) do corpo de tutores (indicador exclusivo para EAD

 

 

O segundo ponto pertinente à jornada de trabalho do docente é a peculiaridade da categoria dos professores do ensino de ter sua remuneração fixadas em horas aulas que ministram em um estabelecimento de ensino. Esta é a disposição do preceito do  artigo 320 da CLT, in verbis: “A remuneração dos professores será fixada pelo número de aulas semanais, na conformidade dos horários”.

 

Todavia as regras antes referidas permitem a fixação contratual individual ou coletivamente de três regimes de trabalho: horista , parcial  e integral. Sendo que no primeiro o professor fica adstrito, no regime de trabalho horista, exclusivamente para ministrar aulas.

 

Já o regime parcial  refere ao sistema de jornada de doze ou mais horas semanais de trabalho na mesma instituição, desde que reservado pelo menos 25% do tempo para estudos, planejamento, avaliação e orientação de estudantes.  Enquanto o regime de trabalho em tempo integral compreende a prestação de 40 horas semanais de trabalho, na mesma instituição, nele computado o tempo de, pelo menos, 20 horas semanais para estudos, pesquisa, trabalhos de extensão, planejamento e avaliação, em conformidade com o anexo da aludida Portaria Normativa 40/2010

 

Deste modo, o MEC utiliza, dentre os vários critérios para avaliar a qualidade dos cursos, as características do corpo docente e o seu regime de trabalho, sendo que à medida que o MEC estabelece requisitos de titulação e regime de trabalho dos professores como pontos fundamentais, estimula-se fortemente as instituições não só a contratar pessoal mais qualificado como ter planos de carreira que estimulem a presença do profissional qualificado em regime de trabalho compatível, conforme o disposto na Lei de Diretrizes e Bases. Não se podem olvidar tais estes aspectos na interpretação e aplicação das regras celetistas aos professores. Neste sentido, dispõe a LDB:

 

Art. 52º. As universidades são instituições pluridisciplinares de formação dos quadros profissionais de nível superior, de pesquisa, de extensão e de domínio e cultivo do saber humano, que se caracterizam por:

[...]

II - um terço do corpo docente, pelo menos, com titulação acadêmica de mestrado ou doutorado;

III - um terço do corpo docente em regime de tempo integral;

 

No exercício de sua competência regulamentadora, o MEC fixou como  parâmetros do Instrumento de Avaliação de Cursos de Graduação presencial e a distância/2015 no que refere regime de trabalho docente

 

Conceito 1 Quando o percentual do corpo docente previsto/efetivo com regime de trabalho de tempo parcial ou integral é menor que 20%.

Conceito 2 - Quando o percentual do corpo docente previsto/efetivo com regime de trabalho de tempo parcial ou integral é maior ou igual a 20% e menor que 33%

Conceito 3 - Quando o percentual do corpo docente previsto/efetivo com regime de trabalho de tempo parcial ou integral é maior ou igual a 33% e menor que 60%.

Conceito 4 - Quando o percentual do corpo docente previsto/efetivo com regime de trabalho de tempo parcial ou integral é maior ou igual a 60% e menor que 80%.

Conceito 5 - Quando o percentual do corpo docente previsto/efetivo com regime de trabalho de tempo parcial ou integral é maior ou igual a 80%.

 

Fica evidenciado, portanto, que se a instituição de ensino não adotar mecanismos de aumentar a jornada de trabalho de professor no curso que será objeto de avaliação, o resultado será que a sua avaliação poderá ser muito baixa, alvo de não reconhecimento de sua instituição e de seus cursos. Daí serem tais aspectos fundamentais para a adequada solução do objeto principal deste estudo para bem delimitar o sentido e o alcance da nova regra celetista.

 

 

2.2.     INFERÊNCIAS DA NOVA REGRA DO ART. 318 DA CLT

 

Analisando a nova disposição celetista, Martins (2017) conclui que a jornada do professor será de 44 horas semanais. Assim  conclui:

 

Faz referência o artigo 318 da CLT à jornada de trabalho semanal. Não existe jornada semanal. A redação do dispositivo é ruim. Jornada é o que ocorre diariamente. Vem de journée, do francês. Em italiano, se fala em giornata. Para a semana, fala-se em módulo semanal.

Módulo semanal estabelecido legalmente é o de 44 horas, que, na verdade, nem é legal, mas constitucional (artigo 7º, XIII, da Constituição). A telefonista, por exemplo, trabalha 36 horas por semana (artigo 227); o mineiro, 36 horas (artigo 293 da CLT), mas não existe outro módulo semanal diferenciado para o professor, salvo se a norma coletiva estabelecer outro limite semanal.Entretanto, o artigo 318 da CLT só faz referência ao que exceder o módulo semanal legal, que é de 44 horas. São extras, portanto, as horas que excederem 44 semanais. Não há referência ao trabalho que exceder oito horas diárias. Pela redação do artigo, se o empregado trabalhar mais de 8 horas diárias em mais de um turno, não terá direito a horas extras, o que é absurdo. O trabalho realizado além de oito horas diárias é considerado extenuante, inclusive para o professor. (MARTINS, 2017, p. 4-5).

 

Discorda-se do ilustre doutrinador, pois como já sustentado, cabe fazer interpretação sistemática das normas educacionais e trabalhistas.  O primeiro aspecto a ser considerado é a competência constitucional  regulatória do Ministério da Educação em tudo que diga respeito a diretrizes para promover e avaliar a qualidade do ensino. Ocorre a regulação do serviço educacional envolve dimensões conexas com a legislação trabalhista. Devendo, em regra, ter primazia a regulação educacional, salvo choque com princípios e regras constitucionais.

 

Assim ponderado, em oposição à tendência doutrinária trabalhista referenciada, constata-se a jornada do professor o ensino superior é especial e, em que pese a norma celetista não disponha expressamente, não há uma vazio normativo uma vez que a legislação educacional fixa regras delimitadoras da jornada do professo que não é de 44 horas semanais necessariamente uma vez que o regime de tempo integral legalmente estabelecido é de 40 horas (parágrafo único do Art. 69 do Decreto 5.773/2006).

 

Martins (2017) a alteração legislativa é inconstitucional, entendendo que a nova regra ao fixar a jornada em “mais de um turno” afronta o limite constitucional de oito horas diárias e quarenta e quatro horas semanais, afirmando:

 

Nesse ponto, a meu ver, o artigo 318 da CLT é inconstitucional, pois fere literalmente o inciso XIII do artigo 7º da Constituição, que faz referência à duração de trabalho do empregado de oito horas diárias e 44 semanais. A Constituição emprega a conjunção aditiva e, e não alternativa ou. Não é, portanto, uma coisa ou outra, mas o que exceder oito horas diárias e 44 semanais ao mesmo tempo. (MARTINS, 2017, p. 6).

 

Pelo exposto anteriormente, pode-se inferir no ensino superior a jornada legal, em regra, é de até 40 horas aulas semanais calculadas não necessariamente a cada 60 minutos o que por si mesmo já não implica atingir às 44 horas, não havendo inconstitucionalidade da norma do art. 31, consoante entendimento doutrinário do referido autor. Além disso, podem o professor e instituição de ensino superior fixar regime de trabalho em tempo parcial ou integral  com uma carga horária de trabalho mais benéfica. Primeiro porque fará com que o professor se sinta bem mais motivado em trabalhar naquele estabelecimento, o que favorecerá numa melhor qualidade da sua aula. E segundo porque o estabelecimento de ensino que mantiver professores com uma maior dedicação na instituição tendem a ser mais bem avaliado, refletindo de forma direta nos resultados dos seus cursos e avaliação institucional.

 

A supracitada norma celetista esculpida no art. 320 da CLT estabeleceu que a definição da duração da hora-aula. Aula é período de tempo da principal atividade de docência dispendido em sala de aula quer presencial à distância. A supracitada norma estabeleceu que a definição da duração da hora-aula é do campo da autonomia da instituição de ensino, abrindo espaço para ajustes através de contrato individual de trabalho, bem como acordo ou convenção coletiva de trabalho.

 

Quanto ao tema, o  Conselho Nacional de Educação publicou  a Resolução n.º 3,  de 2 Julho de 2007 que dispõe sobre procedimentos a serem observados quanto ao conceito de hora-aula, buscando estabelecer uma divisão conceitual da duração da hora-aula do professor em sala de aula e a duração da hora das atividades acadêmicas voltadas aos alunos, conforme abaixo transcrito:

 

Art. 1º A hora-aula decorre de necessidades de organização acadêmica das Instituições de Educação Superior.

§ 1º Além do que determina o caput, a hora-aula está referenciada às questões de natureza trabalhista.

§ 2º A definição quantitativa em minutos do que consiste a hora-aula é uma atribuição das Instituições de Educação Superior, desde que feita sem prejuízo ao cumprimento das respectivas cargas horárias totais dos cursos.

Art. 2º Cabe às Instituições de Educação Superior, respeitado o mínimo dos duzentos dias letivos de trabalho acadêmico efetivo, a definição da duração da atividade acadêmica ou do trabalho discente efetivo que compreenderá:

I – preleções e aulas expositivas;

II – atividades práticas supervisionadas, tais como laboratórios, atividades em biblioteca, iniciação científica, trabalhos individuais e em grupo, práticas de ensino e outras atividades no caso das licenciaturas.

 

Assim a carga horária do professor não necessariamente será computada em horas de 60 minutos, podendo ser fixado outro parâmetro quantitativo validamente quer sob ponto de vista educacional, quer no campo trabalhista uma vez que figura condição mais benéfica ao professor. Frequentemente as são fixadas pelas instituições de ensino horas aula de 45 ou 50 minutos para contemplar a denominada hora-atividade relativas a atividades docentes extraclasse tais como estudo, planejamento pedagógico, preparação de avaliação. Fixa-se assim legalmente uma jornada especial do tipo aberto a ser colmatado pelo ajuste individual ou coletivo.

 

Delineadas estas peculiaridades essenciais, cabe ainda examinar como a jornada poderá ser estruturada uma vez que a nova regra do art. 318 estabelece  que o  professor poderá lecionar em um mesmo estabelecimento por mais de um turno, desde que não ultrapasse a jornada de trabalho semanal estabelecida legalmente.

 

Turno de trabalho pode ser definido como períodos de divisão trabalho matutino, vespertino, noturno e/ou misto. Octavio Bueno Magano também definiu a expressão:

 

[...] quando a instituição alude a trabalho realizado em turnos, quer dizer grupo de trabalhadores que se sucedem na utilização do mesmo equipamento. Quando menciona revezamento, significa trabalhadores escalados para períodos diferentes de trabalho, ora diurno, ora noturno, ora misto. E quando se refere à interruptividade, tem em vista o trabalho executado sem intervalo para repouso e alimentação (2015, p. 645).

 

Pode concluir que com a nova redação será possível distribuir as horas-aulas entre os diversos turnos sem as restrições antes fixadas de horas consecutivas ou intercaladas desde que seja observado o limite diário de 8 horas aula em aplicação da regra jornada normal constitucionalmente fixadas com as ressalvas antes delimitadas referentes à hora aula.

 

Diante do quaro delineado, pode-se concluir ainda que para definir se há ou não configuração de jornada extraordinária cabe primeiro verificar qual o regime de trabalho ajustado entre as partes individualmente ou em acordo ou convenção coletiva uma vez que pode ser ajustado regime de compensação de horas ( circunstancia excludente do direito à hora extra, nos termos da orientação sumulada pelo TST no enunciados n. 85 e 444.

 

SUM. n. 85 - COMPENSAÇÃO DE JORNADA (inserido o item VI) - Res. 209/2016, DEJT divulgado em 01, 02 e 03.06.2016

I. A compensação de jornada de trabalho deve ser ajustada por acordo individual escrito, acordo coletivo ou convenção coletiva. (ex-Súmula nº 85 - primeira parte - alterada pela Res. 121/2003, DJ 21.11.2003)  

II. O acordo individual para compensação de horas é válido, salvo se houver norma coletiva em sentido contrário. (ex-OJ nº 182 da SBDI-1  - inserida em 08.11.2000)  

III. O mero não atendimento das exigências legais para a compensação de jornada, inclusive quando encetada mediante acordo tácito, não implica a repetição do pagamento das horas excedentes à jornada normal diária, se não dilatada a jornada máxima semanal, sendo devido apenas o respectivo adicional. (ex-Súmula nº 85 - segunda parte - alterada pela Res. 121/2003, DJ 21.11.2003)  

IV. A prestação de horas extras habituais descaracteriza o acordo de compensação de jornada. Nesta hipótese, as horas que ultrapassarem a jornada semanal normal deverão ser pagas como horas extraordinárias e, quanto àquelas destinadas à compensação, deverá ser pago a mais apenas o adicional por trabalho extraordinário. (ex-OJ nº 220 da SBDI-1 - inserida em 20.06.2001)  

V. As disposições contidas nesta súmula não se aplicam ao regime compensatório na modalidade “banco de horas”, que somente pode ser instituído por negociação coletiva.

VI - Não é válido acordo de compensação de jornada em atividade insalubre, ainda que estipulado em norma coletiva, sem a necessária inspeção prévia e permissão da autoridade competente, na forma do art. 60 da CLT.

 

SUM. n. 444. JORNADA DE TRABALHO. NORMA COLETIVA. LEI. ESCALA DE 12 POR 36. VALIDADE. - Res. 185/2012, DEJT divulgado em 25, 26 e 27.09.2012  - republicada em decorrência do despacho proferido no processo TST-PA-504.280/2012.2 - DEJT divulgado em 26.11.2012

 É valida, em caráter excepcional, a jornada de doze horas de trabalho por trinta e seis de descanso, prevista em lei ou ajustada exclusivamente mediante acordo coletivo de trabalho ou convenção coletiva de trabalho, assegurada a remuneração em dobro dos feriados trabalhados. O empregado não tem direito ao pagamento de adicional referente ao labor prestado na décima primeira e décima segunda horas.

 

Aqui se ressalte, especialmente, nas atividades práticas, não há óbice para fixar regime de compensação de 12x36, observando-se, especialmente, a necessidade inspeção prévia e permissão da autoridade competente, na forma do art. 60 da CLT  quando configurada a insalubridade do meio ambiente de trabalho, como, por exemplo, em cursos da área de saúde.  

 

Frise-se que, não havendo sistema de compensação, fará o professor a horas quando exceder a jornada fixada em contrato ou negociação coletiva o que implica em perda do objeto Orientação Jurisprudencial 206 da SBDI-1 do TST pela superveniência da alteração legislativa que assim versa:  “Professor. Horas extras. Adicional de 50%. Excedida a jornada máxima (art. 318 da CLT), as horas excedentes devem ser remuneradas com o adicional de, no mínimo, 50% (art. 7º, XVI, CF/1988)”.

 

Finalmente, a nova regra do art. 318 da CLT impõe de modo expresso a observância do intervalo intrajornada que deverá observar o art. 71 da CLT conforme a o regime de trabalho adotado e carga horaria ajustada. Assim não será obrigatório intervalo intrajornada para carga horaria diária de até quatro horas aula, sendo porém devido intervalo de 15 minutos quando exceder seis horas o trabalho desde que ultrapasse quatro horas. E cabe conceder intervalo de no mínimo de uma hora a no máximo duas, para jornada superior  a seis horas, cabe aplicação do caput do art. 71 quanto a possibilidade de ampliação do limite máximo mediante negociação coletiva. Assim como é possível a redução do limite mínimo de uma hora mediante autorização e inspeção prévia  do Ministro do Trabalho e desde que o estabelecimento atenda às exigências concernentes à organização dos refeitórios, e quando os respectivos empregados não estiverem sob regime de trabalho prorrogado a horas suplementares (art. 71, § 3º da CLT).

 

Por fim, infere-se que, apesar da norma não expressamente, fazer menção deve-se observar o intervalo interjornada de onde horas no mínimo de descanso entre uma jornada e outra de trabalho, conforme dispõe o artigo 66 da CLT: “Art. 66 - Entre 2 (duas) jornadas de trabalho haverá um período mínimo de 11 (onze) horas consecutivas para descanso”. Agora com cumprimento facilitado pela nova regra de organização da jornada de trabalho em turnos.

 

 

3.  CONSIDERAÇÕES FINAIS

 

Considerando a nova redação dada ao art. 318 da CLT, cabe mediante interpretação sistemática das legislações educacional e trabalhista e com especial atenção ao arcabouço constitucional. A definição da jornada legal do professor no ensino superior é delimitada pelos parâmetros da LDB e regulação educacional com vistas à valorização e qualificação do professor como referência de qualidade do ensino superior brasileiro.

 

Consoante os fundamentos expostos, infere-se que a regra do art. 318 da CLT não afronta a Constituição Federal, pois a jornada do professor nos termos da legislação educacional é do tipo aberta, tendo como regra geral a jornada máxima de quarenta horas, em regime de tempo integral, com distribuição das horas para as atividades de ensino, pesquisa e extensão, tendo em visa ainda que a hora aula pode ter cômputo em período menor que os sessenta minutos tradicionais. Conclui-se também que a nova regra não afasta a aplicação das regras de intervalos intrajornada e interjornada, bem como demais limites fixados na legislação trabalhista.

 

 

 

 REFERÊNCIAS

 

 

SANTOS, Roseniura; SOUZA, Ailton Borges. Professores: Um Estudo sobre a Relativização do Intervalo Interjornada dos Professores nos Estabelecimentos de Ensino Particular. Trabalho em Revista (Impresso), v. 150, p. 5157-5192, 2009.

DELGADO, Maurício Godinho. Curso de Direito do Trabalho. São Paulo: LTR, 2014.

JR CUNHA, Dirley. Curso de Direito Constitucional. Editora Podivm: 2010

MAGANO, Otavio Bueno, Suplemento Trabalhista LTR v. 51, n. 131, LTR, 2015

MARTINS, Sérgio Pinto. Supremo precisa examinar a jornada de trabalho dos professores. Disponível em: http://www.conjur.com.br/2017-mar-18/sergio-martins-stf-examinar-jornada-professores. Acesso em 31 abril de 2017.

MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO. Legislação e Normas. Disponível em: http://portal.mec.gov.br/conaes-comissao-nacional-de-avaliacao-da-educacao-superior/legislacao-e-normas. Acesso em 31 abril de 2017.

 

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